O cooperativismo gaúcho marcará presença na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que acontece em Belém (PA) entre os dias 10 e 21 de novembro. Com projetos alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), algumas cooperativas foram selecionadas pelo Sistema OCB para participarem de painéis temáticos promovidos durante a conferência, além de atividades paralelas nos pavilhões do governo brasileiro, coordenados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), e em espaços de parceiros institucionais.
Os cases selecionados terão duas formas de participação: com apresentação presencial, em painéis e debates nos espaços do cooperativismo na COP30; e com exposição digital, com conteúdo exibido nos totens do evento e no portal Coop na COP30, além de campanhas e materiais de divulgação institucional.
Os projetos envolvem ações no campo, como rotação de culturas, manejo sustentável do solo para aumentar a fertilidade e mitigar impactos da seca, além de estratégias para minimizar os impactos das mudanças climáticas em vitiviniculturas. Também, projetos de investimentos envolvendo produção agropecuária de baixo carbono, energia renovável e eficiência energética, finanças verdes, bioeconomia e recuperação de áreas degradadas.
A seleção ocorreu por meio de chamada pública, lançada em agosto, que visou identificar e selecionar experiências concretas de cooperativas nos ramos que contribuem para o enfrentamento das mudanças climáticas. A seleção começou por meio de uma imersão nas cooperativas, em parceria com o Sistema Ocergs, em julho deste ano, com integrantes da ONU e do governo federal, em ação promovida pela Organização Nacional das Cooperativas. Apenas dois estados foram contemplados: Rio Grande do Sul e Rondônia.
"O impacto foi muito positivo nos projetos. Eles ficaram muito impressionados com esse trabalho, que além dessa visão econômica do desenvolvimento, de geração de riqueza, o cooperativismo também tem essa visão da integração social, do desenvolvimento, da sustentabilidade, do ESG, para que nós possamos manter o meio ambiente com toda sua resiliência e capacidade de poder resistir a essa nova fase do nosso clima", diz Darci Hartmann, presidente do Sistema Ocergs.
Ele também ressaltou que a nova realidade climática exige preparação para os impactos que continuarão acontecendo. “Para nós, é uma importante forma de mostrar ao mundo o papel do cooperativismo dentro dessa agenda climática global, e esse reconhecimento do cooperativismo como uma verdadeira agente de transformação”, afirma.
Confira, abaixo, o projeto de cada cooperativa gaúcha:
Cooperativas que participarão presencialmente
- Creral: biopolímeros sustentáveis e produção de energia sustentável
O case apresentado pela cooperativa Creral volta-se ao processo de transformação de resíduos agrícolas, como a casca e a cinza da casca de arroz, em um produto natural para aplicação nas indústrias de plásticos, que utilizam derivados de petróleo e nas indústrias de concreto em substituição a cinza de carvão mineral. O projeto está em desenvolvimento no complexo energético São Sepé, onde a cooperativa conta com usinas solares e térmica de biomassa .A cooperativa de energia tem sede em Erechim, com cerca de oito mil associados.
A casca do arroz é o resíduo da produção das mais de 10 arrozeiras. Em um ano, são cerca de 70 mil toneladas de casca de arroz e 15 mil toneladas de cinza. A usina tem 8 MW de potência, com capacidade de geração de 56 mil MW/h ao ano. A energia produzida está sendo transferida para várias distribuidoras de energia elétrica pelo Brasil, afirma o presidente da cooperativa, João Alderi do Prado.
A casca nicronizada e a cinza podem, a partir de um aditivo vegetal, transformar-se em insumos para produção de plásticos. “A partir desse produto que a gente desenvolve, esse insumo pode ir para um fabricante de plástico de qualquer componente, de garrafa PET, de produtos para agricultura, como bebedouros, eletrificador de cesta, todo aquele componente plástico pode ser fabricado a partir da cinza e da casca do arroz que a gente produz ali”, afirma.
“É muito surpreendente poder estar nesse evento. Nossa experiência está sendo colocada lá, e a gente tem muita satisfação em ver que aquilo que a gente vem desenvolvendo aqui na cooperativa pode ser a demonstração de uma experiência capaz de ajudar na descarbonização da nossa atmosfera”, diz.
- Sicredi Confederação: financiamento do empreendedorismo feminino e transição energética
A confederação do Sicredi de Porto Alegre levará à Conferência os cases voltados aos projetos de financiamento de empreendedorismo feminino e transição energética. A instituição tem direcionado esforços estratégicos para, principalmente, promover a inclusão de mulheres empreendedoras para impulsionar a transição energética no campo, e tem o objetivo de conectar sustentabilidade, inovação e impacto social.
O Sicredi informou, em nota, que foram captados cerca de R$ 9,6 bilhões, desde 2019, para direcionar o crédito sustentável, via empréstimos verdes/sociais e emissões de títulos. Das principais linhas financiadas, 62% dos recursos foram alocados em energia renovável e 19% para mulheres empreendedoras. Também foram mais de R$ 9,9 bilhões captados em carteira de crédito destinados a empresas lideradas por mulheres, e R$ 4,5 bilhões para energia renovável, totalizando R$ 61,4 bilhões da carteira de economia verde.
A confederação apresentará o foco voltado à ações de expansão da energia limpa para a redução das emissões de gases de efeito estufa; descarbonização da economia, acelerando a transição para matriz energética mais limpa; de empoderamento feminino, com empresas lideradas por mulheres; redução de desigualdades, com acesso ao crédito para grupos historicamente sub-representados e atração de investimentos por meio da carteira verde, para atrair investidores institucionais interessados em ativos sustentáveis.
- Vinícola Aurora: estratégias para minimizar impactos nas viticulturas
A cooperativa Vinícola Aurora, de Bento Gonçalves, apresentará as estratégias para minimizar os impactos das mudanças climáticas na viticultura da Serra Gaúcha. Estará acompanhando na COP o diretor administrativo e financeiro Rui Ficagna.
Maurício Bonafé, gerente agrícola da cooperativa, afirma que a Aurora já trabalha há alguns anos em ações voltadas à mitigação de mudanças climáticas, e diretamente ligado à enchente de maio do ano passado. A região não foi afetada diretamente pela inundação, mas sim por deslizamentos de solo por conta do volume excessivo de chuva. Também serão apresentadas ações ligadas à preservação da camada fértil do solo, a ambientação do cultivo da uva, que deve agregar na manutenção do solo e da biodiversidade da área.
Os projetos apresentados serão voltados para a manutenção da vegetação nativa e implantada, mantendo a cobertura verde em todas as estações. “Quando a gente coloca cobertura sobre o solo, a gente tem também o menor impacto da gota da chuva que cai diretamente no solo, não desestruturando o mesmo, fazendo com que se mantenha nas características químicas e físicas, não tendo erosão dentro do vinhedo”, explica Bonafé. Os produtores também têm trabalhado na construção de vinhedos em patamares, já que as áreas são mais fibrosas, afirma o gerente. Isso deve reduzir a velocidade da água no escorrimento superficial, e auxilia a evitar as erosões e manter a fertilidade.
Outros trabalhos envolvem o monitoramento climático para ter mais assertividade na recomendação de tratamento às doenças sanitárias. A cooperativa já vem fazendo um bom trabalho em cima desse monitoramento climático através de um software junto com a Embrapa eh e uma empresa que disponibiliza então um aterramento para a gente poder ter esse monitoramento, ser mais assertivo na nas recomendações da aplicação dos produtos
“Para a cooperativa, é muito interessante estar levando informações desse case porque, queira ou não, vai estar sendo visto a nível mundial. É uma forma de divulgar o trabalho que fazemos tanto na parte de produção das uvas, quando auxiliando na comercialização dos produtos finais”, afirma o gerente.
- Coasa: práticas de conservação do solo
A cooperativa Coasa está levando o programa de cuidado com o solo, chamado de "Nosso Solo, Nossa Colheita". A iniciativa é voltada ao compartilhamento de informações e de técnicas de conservação do solo e de manejo sustentável nas propriedades dos associados da cooperativa, que já abrange 16 municípios. "É uma prática que a cooperativa tem desde a sua fundação. Um dos objetivos de iniciarmos a cooperativa há 30 anos, que foi investir em tecnologia para melhorar o solo e a produção de agricultores", diz o presidente da cooperativa, Orildo Germano Belegante.
A metodologia realizada na Coasa tem acompanhamento técnico nas propriedades, realizado pelo Departamento Técnico (Detec), com eventos e treinamentos que reúnem especialistas e produtores. O objetivo é incentivar o manejo adequado e contínuo do solo, mantendo cobertura vegetal durante todo o ano, reduzindo a erosão, melhorando sua estrutura e aumentando o sequestro de carbono.
Em ano de estiagem, Orildo lembra que também teve uma das melhores médias de fertilidade no Rio Grande do Sul, por conta da capacidade de retenção de água e de absorção de calor. "Tudo, hoje, depende do solo. A colheita é resultado da qualidade do solo. Isso é fundamental", diz.
Cooperativas que terão cases apresentados na COP30
- Unicred: reaproveitamento de resíduos têxteis e capacitação profissional
A Unicred Ponto Capital, de Santa Maria, levará a iniciativa “Batalhão do Bem”, que envolve colaboradores, cooperados e parceiros em ações de impacto social e ambiental. O projeto atua em frentes como o recebimento e reaproveitamento de resíduos têxteis, aliados à capacitação profissional em costura industrial de pessoas em situação de vulnerabilidade social, sendo majoritariamente mulheres.
Um dos principais resultados, informados pela cooperativa, foi o reaproveitamento de mais de três toneladas de resíduos têxteis provenientes de unidades militares da região, que seriam descartados em aterros ou incinerados. Foram transformados em peças reutilizáveis e são doadas a outros projetos sociais, além de se tornarem fonte de renda para as alunas envolvidas nas oficinas.
A participação da cooperativa ocorrerá por meio de conteúdos institucionais e painéis voltados ao cooperativismo, com a delegação brasileira sendo a porta-voz da iniciativa. De acordo com Wellinton Henrique Martins, coordenador do projeto, representar o Rio Grande do Sul e a Unicred em um evento como a COP é, ao mesmo tempo, uma responsabilidade e um reconhecimento do trabalho feito em prol da sustentabilidade e do cooperativismo.
“Estar presente nesse espaço significa mostrar que as cooperativas também são protagonistas nas soluções para os desafios climáticos e sociais. É levar a voz de um modelo de negócio que coloca as pessoas e o planeta no centro das decisões, e reforçar que o cooperativismo é, por essência, uma prática ESG”, diz.
- Cooperconcórdia: consumo consciente e gestão correta de resíduos
A Cooperconcórdia, de Santa Rosa, levará a Belém o programa Multiplicadores Lixo Zero, que tem como objetivo desenvolver comunidades e cooperativas como multiplicadoras das ações alinhadas às ODS da ONU e o sétimo princípio do cooperativismo, com o interesse pela comunidade.
“É estimular que as comunidades tenham consumo consciente, que aproveitem os materiais através da economia circular, que façam a gestão correta dos resíduos, que também executem, nas escolas, nas casas e nas cooperativas os processos de compostagem dos resíduos orgânicos e tornar as cidades também mais sustentáveis”, explica Raquel Jeske, agente de Desenvolvimento Organizacional da Cooperconcórdia.
A cooperativa, localizada em Santa Rosa, na região noroeste do Estado, é voltada ao trabalho educacional e atende a todo o Brasil com formações, palestras, consultorias e aprendizagem profissional. Também tem uma escola de ensino infantil, fundamental e médio em Santa Rosa, com 500 alunos.
O programa surgiu em 2022 dentro da escola como um projeto piloto. Nos últimos três anos, a cooperativa participou de editais com apoio do Fundo Social do SCOP, e executou em parceria de intercooperação com outras cooperativas, e leva para comunidades palestras sobre sustentabilidade, sobre controle, geração de resíduos e economia circular.
O principal resultado com a iniciativa, até o momento, foi conseguir desviar 52% de resíduos dos aterros sanitários nos municípios das cooperativas parceiras e as escolas. Já em gases de efeito estufa, foi registrada uma economia de 23,31 toneladas de CO2 e espaços de aterro sanitário. Foram 19,3 metros cúbicos de espaços que não foram utilizados.
O projeto será apresentado de forma expositiva na COP. “Nosso foco principal é atualmente levar esse projeto para ser aplicado dentro das próprias cooperativas pelos colaboradores, e associados com boas práticas de gestão de resíduos e em escolas”, completa Raquel.