“Ilhas de areia” no centro da discussão sobre dragagem do Guaíba

“Ilhas de areia” no centro da discussão sobre dragagem do Guaíba

Proposta na Câmara pretende incluir desassoreamento na Política Municipal de Sustentabilidade Hidroviária

Correio do Povo

É possível até mesmo caminhar por um dos bancos de areia formados após enchente de maio

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Desde a inundação de maio deste ano, um dos debates vigentes em Porto Alegre é a relação entre as cheias e a dragagem dos rios. Quando o Guaíba baixou, surgiram bancos de areia comparados a ilhas e que são apontados por pessoas ligadas ao setor hidroviário como risco à navegação de embarcações que utilizam a rota.

Quatro meses depois do início da crise climática, o acúmulo de areia e sedimentos trazidos pela correnteza ao Guaíba gera controvérsias sobre a necessidade de realizar seu desassoreamento, medida que divide opiniões. O tema surgiu com mais força após o navio Besiktas GH encalhar no Canal Furado Grande, em Canoas, no fim de julho. Em nota, à época, a Autoridade Portuária dos Portos do Rio Grande do Sul (Portos RS) confirmou que “o incidente aconteceu em razão do assoreamento, mas que a situação não chega a comprometer a navegação no local”.

Cerca de um mês antes, em junho, um grupo de hidrólogos do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) emitiu nota técnica apontando que a dragagem não surtiria efeito significativo para o Guaíba. De forma resumida, o documento, assinado por 12 especialistas da Universidade diz que a dragagem oferece resultados eficazes quando aplicada em rios de pequeno porte, além de destacar que, além o efeito incerto, a operação tem custo-benefício elevado em cursos d’água de maior dimensão.

“A dragagem é uma medida reconhecidamente positiva para pequenos rios e córregos, principalmente em bacia com significativa urbanização, como o caso do Arroio Dilúvio, em Porto Alegre. Já para trechos de grandes rios ela, eventualmente, também pode ser uma medida nos casos em que houve um processo de assoreamento significativo. Porém, essa necessidade deve ficar demonstrada por meio de medições ao longo do leito do rio. No momento não temos, ou não está disponível publicamente, este tipo de informação para recomendação desta medida”, consta em trecho da nota técnica.

Em outra parte do texto, os técnicos apontam que a mudança do leito de rios “é um movimento natural e periódico”, e que “não se pode confundir o processo de dragagem de canais de navegação, que é uma atividade rotineira de manutenção do calado de hidrovias e executada em uma área limitada e com colocação do material dragado dentro do corpo hídrico, com processos de desassoreamento para controle de cheias com maior abrangência”.

Proposta em debate no Legislativo

Está tramitando na Câmara de Vereadores de Porto Alegre projeto que acrescenta a limpeza, o desassoreamento do leito do Lago Guaíba e a recomposição da mata nativa em sua extensão à Política Municipal de Sustentabilidade Hidroviária. A proposta inclui tal diretriz na Lei n° 12.848, de 20 de julho de 2021.

Conforme o projeto, a realização do serviço será de responsabilidade exclusiva do Executivo Municipal, o qual poderá contratar empresas que atuarão sob sua fiscalização. Se o serviço for realizado diretamente pelo Executivo, este deverá obter o licenciamento ambiental e o registro de extração junto ao órgão competente.

A proposição veda a comercialização do mineral extraído pela atividade, o qual deverá ser empregado apenas em obras públicas. Em caso de contratação para a realização do serviço, a empresa contratada deverá possuir licença ambiental e concessão da área objeto do serviço a ser realizado.

A exposição de motivos do projeto salienta que “ao longo do tempo, os corpos hídricos vão ficando mais rasos em função do assoreamento e logicamente extravasam suas margens, o que pode ser evitado com a remoção da areia e detritos, assim como acontece em todos os rios navegáveis do mundo exatamente para que eles continuem navegáveis”.

Se o projeto for aprovado, a dragagem também deverá ser realizada nos afluentes que escoam no Guaíba. Impactados pelas inundações, estes cursos d’água estão igualmente assoreados e, em caso de transbordamento, ampliarão os efeitos dos alagamentos para as comunidades que vivem em seus entornos.


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