Prefeitura e ambientalistas divergem sobre enchentes em reunião de comissão da Câmara de Porto Alegre
Em encontro nesta terça, porém, técnicos de ambos os lados concordaram que é preciso melhorar sistema de proteção contra cheias da Capital
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A Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara Municipal de Porto Alegre realizou, nesta terça-feira, uma reunião virtual para tratar das lições após as enchentes históricas na Capital, especialmente a mais recente, em maio. O encontro, com a participação de parlamentares e representantes da sociedade civil e órgãos públicos, trouxe contrapontos entre especialistas em saneamento e meio ambiente, que pediram, por exemplo, a recriação do extinto Departamento Municipal de Águas Pluviais (DEP), além de criticarem a falta de manutenção no sistema de proteção contra cheias.
De outro lado, representantes técnicos da Prefeitura aventaram a necessidade de melhorias no sistema em si, porém destacaram o caráter extraordinário das chuvas na ocasião, assim como o excesso nos fluxos dos rios que desembocam no Guaíba. Para o ex-diretor do DEP, Vicente Hauber, além do aquecimento global causado pelas mudanças climáticas cuja ação humana é diretamente responsável, a questão do saneamento em Porto Alegre é tratada como um “patinho feio das políticas públicas”.
“Durante muito tempo, a Capital foi referência nacional e internacional nesta questão, e precisamos retomar isto. É também impensável ver somente 3% do nosso lixo sendo reciclado, sendo que já tivemos 25%. O Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) não consegue fornecer água suficiente para as pessoas de Porto Alegre. Seus investimentos estão muito atrasados e seu quadro de pessoal, insuficiente”, relatou Rauber.
Já o professor do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) e coordenador do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá), Paulo Brack, discorreu sobre a importância na redução do consumo de energia e da emissão de gases causadores do efeito estufa. “É importante que tenhamos políticas públicas e órg]aos públicos para que elas estejam voltadas para o interesse público da sociedade. Temos também que rever os projetos de ocupação da orla do Guaíba, e repensar a cidade no sentido de diminuirmos nossa pegada ecológica, para que possamos avançar o mínimo possível nas áreas naturais”, disse Brack, que, em sua fala, abordou ainda a manutenção dos sistemas de bombeamento de água por parte do Dmae.
Por parte do Executivo porto-alegrense, o procurador-adjunto de Domínio Público, Urbanismo e Meio-Ambiente, Nelson Marisco, afirmou que os instrumentos de proteção contra cheias do município precisam ser aprimorados, porém o que Porto Alegre sofreu foi consequência de uma inundação prévia em outras bacias hidrográficas, segundo ele. “Em locais como os rios Taquari, Jacuí, e outros, houve uma carga de água a qual não temos sequer a dimensão exata da quantidade de chuva que caiu. Claro que isto não escusa os entes públicos, de refletir e investigar tudo o que possa ser feito para que isto não aconteça novamente”, comentou Marisco.
Em seguida, ele falou da criação do Escritório de Reconstrução, criado pela Prefeitura para aprimorar medidas de retorno à normalidade. Ainda conforme ele, retomar o DEP “pode ou não ser uma alternativa”. “O que precisa ser feito é especial e específica atenção para a questão da drenagem em Porto Alegre. Quando o DEP foi extinto, as pessoas não sumiram, apenas passaram a compor outra autarquia”, acrescentou.
A diretora de Tratamento e Meio Ambiente do Dmae, Joice Becker, relatou à comissão situações vivenciadas pelos técnicos durante a enchente. “Nos causou estranheza, enquanto ainda estávamos na contingência, ou seja, a água ainda não havia baixado, que já houvesse relatórios de diagnósticos das estruturas. Nós, que trabalhamos com isto no dia a dia, somente estamos conseguindo montar isto agora aos órgãos de fiscalização e controle”, afirmou ela. Em seguida, disse que este foi o primeiro evento em que houve uma vazão tão grande de água de todo o projeto do sistema de contenção, desenvolvido na década de 1970.
“Ficamos com o Guaíba acima da cota de 4 metros por muitos dias. As casas de bomba que estão nos projetos das Estações de Bombeamento de Águas Pluviais (Ebaps) foram projetadas para funcionar 24 horas durante dois meses”, discorreu Joice. Ainda segundo ela, o projeto foi criado “em uma condição ideal”, mas que houve situações não previstas, como o furto de algumas estruturas que prendiam os portões no muro na noite anterior à inundação. “Este projeto é bastante robusto, porque suportou pelo menos três eventos de grande magnitude, mas é óbvio que precisa ser muito melhorado”, destacou.