Debate promovido pelo IJF propõe a tributação sobre fortunas no Brasil e na América Latina

Debate promovido pelo IJF propõe a tributação sobre fortunas no Brasil e na América Latina

Injustiças nos sistemas tributários e a Campanha "Tributar os Super-ricos" foram temas abordados em live do Instituto de Justiça Fiscal

Sidney de Jesus

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“O Brasil tem historicamente uma das piores distribuição de renda do planeta. Um dos fatores que contribuem para esta concentração de renda e riqueza é a injustiça do sistema tributário. O seu caráter regressivo onera proporcionalmente mais os mais pobres e menos os mais ricos, fazendo o contrário do que deveria fazer”, afirmou o ex-diretor do FMI e banco dos Brics, o economista Paulo Nogueira Batista Jr, durante o debate sobre o tema “Tributação das grandes fortunas no Brasil e na América Latina” , promovido pelo Instituto Justiça Fiscal (IJF) e transmitido de forma virtual na noite desta segunda-feira, 28, pelo canal do Youtube da entidade. 

Conforme o economista Paulo Nogueira, o Brasil discute intensamente a questão da reforma tributária, mas raramente aprofunda o tema das injustiças do sistema tributário. “Normalmente essa questão é varrida para debaixo do debate”, afirmou Nogueira, que destacou quatro razões que levam a regressividade e a injustiça da tributação no Brasil: o peso da tributação direta, a baixa progressividade do imposto de renda, a reduzida tributação sobre fortuna e patrimônios e a fragilidade da administração tributária. “O peso dos tributos indiretos sobre o consumo responde por cerca de 50% da arrecadação total e incide sobre todos os consumidores, onerando mais do que proporcionalmente os de menor nível de renda. Já o  IRPF é de modo geral pouco progressivo. As alíquotas marginais sobre as faixas mais altas de rendimento são moderadas e a alíquota máxima é baixa em comparação com as de outros países”, exemplificou o economista. 

Ele lembrou ainda que a maioria dos Estados não aplica a alíquota máxima do imposto sobre heranças e doações, e o  Imposto sobre veículos automotores (IPVA), não incide sobre iates e aviões particulares. “O imposto territorial rural, por exemplo, arrecada muito pouco, respondendo por apenas 0,1% da arrecadação federal. Já o IPTU incide sobre imóveis subavaliados”, revelou. 

Para o ex-diretor do FMI, Paulo Nogueira Batista Jr, a tributação mais justa no Brasil é exigir mais dos super ricos. Ele destacou que assegurar uma distribuição equitativa da renda deve ser um objetivo fundamental para qualquer país. “A desigualdade excessiva pode erodir a coesão social. Com tributação linear ou até regressiva, os mais ricos pagam mais em termos absolutos per capita”, ressaltou o economista, lembrando que a justiça tributária implica progressividade.  “Os super-ricos devem pagar proporcionalmente mais, o que significa que as alíquotas médias devem ficar na razão direta dos níveis de rendimento e patrimônio”, enfatizou Nogueira. 

Segundo ainda Paulo Nogueira, o problema da injustiça tributária não é apenas a omissão de legislação. Ele destacou que a regressividade do sistema tributário também é alimentada pelas fragilidades da administração tributária. “Os mais ricos e super-ricos têm muitos meios de invadir a tributação recorrendo as formas variadas do planejamento tributário”, afirmou o economista.  

“O aumento da renda disponível dos pobres aumenta o consumo rapidamente, com efeito multiplicador sobre a economia. Já a redução na renda disponível dos mais ricos deixaria o seu consumo essencialmente inalterado”, destacou Paulo Nogueira, que afirmou que “aliviar a carga tributária dos mais pobres, aumentando a dos super-ricos, melhoraria a distribuição de renda e contribuiria simultaneamente para estimular a economia”. 

Ainda durante o debate, Paulo Nogueira afirmou que o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) existe desde 1988. “O objetivo era taxar os super-ricos. Se tivesse sido criado, o IGF teria sido o primeiro imposto na história brasileira a incidir exclusivamente sobre os mais ricos, e não sobre a classe média e os pobres”, afirmou o economista.  

Porta-voz da campanha latino-americana para tributar grandes fortunas, o sociólogo e especialista em tributação internacional, Jorge Coronado afirmou quea riqueza em geral não paga imposto na América Latina. Segundo o especialista, somente a Argentina, Bolívia, Equador e Peru avançam em legislações para cobrar impostos sobre as fortunas, que, em muitos casos, sequer são conhecidas pelos sistemas tributários dos países. “Os 10% mais ricos da América Latina concentram grande parte da riqueza da região e pagam pouco ou nenhum tributo sobre seus ativos financeiros e patrimoniais”, revelou o especialista 

Ele destacou ainda que os mais ricos contam com um sistema tributário que permite não pagar impostos ou pagar uma taxa muito baixa. “Esses 10% com toda essa riqueza não chegam a pagar 5% de impostos sobre seus ativos econômicos, financeiros e patrimoniais. Cobrar impostos da riqueza e grandes fortunas de cunho permanente é a única forma da América Latina superar desigualdades.  Isso significa arrecadar milhões de dólares permitindo enfrentar os problemas econômicos, incluindo os sanitários em meio à pandemia”, afirmou o especialista, lembrando que “tributando pessoas que tenham patrimônio maior que um milhão de dólares, teríamos mais de 26 bilhões de dólares ao ano”, revelou. 

De acordo com Coronado, a pandemia da Covid-19 evidenciou as desigualdades e se tornou um dos grandes problemas estruturais do sistema tributário da América Latina. “A pandemia evidenciou que a desigualdade é inaceitável. Os Estados não têm recursos para enfrentar a gravidade da situação, mas é indispensável tributar as grandes fortunas”, enfatizou o sociólogo, lembrando que o cenário é de um sistema tributário complicado e com privilégios fiscais. “Esse é o problema da América Latina que está deixando de receber cerca de 1,6% em relação ao PIB regional”, destacou. 

“Nem todos os problemas são derivados da pandemia na América Latina. No Brasil já vínhamos atravessando um momento de crise profunda, com questões de evasão fiscal. Nós tributamos muito mais o consumo e muito menos a renda, ou seja, a tributação sobre o consumo está alta porque não tributamos a renda, o patrimônio e as  grandes fortunas como deveríamos, afirmou a presidenta do Instituto Justiça Fiscal (IJF) e da coordenação da campanha Tributar os super-ricos, Maria Regina Paiva Duarte. 

De acordo com Maria Regina, os super-ricos são uma parcela muito pequena da população que paga pouco ou nada de impostos, gerando injustiça fiscal profunda e agravando o abismo entre os milhões de pobres, justamente os que mais pagam impostos proporcionalmente. “Fazer justiça fiscal tributando as grandes fortunas e altas rendas e corrigir a tabela do Imposto de Renda é uma oportunidade sem precedentes para assegurar receita de forma justa para atender a legião de desempregados e vulneráveis que rapidamente se formou e que vai se agravar”, afirmou a coordenadora da campanha Tributar os Super-Ricos. 

Durante o debate a presidenta do IJF, Maria Regina Paiva Duarte apresentou oito propostas com medidas tributárias que propõem o aumento de tributos para altas rendas. O pacote de medidas vai afetar apenas 0,3% dos mais ricos do país e propõe grandes patrimônios e redução para as baixas rendas e pequenas empresas. “Estes projetos tem um potencial arrecadatório anual de R$ 292 bilhões. O eixo central das propostas é a elevação da tributação das altas rendas e grandes riquezas. Com isso será possível desonerar trabalhadores e pequenas e médias empresas, além de combater  a evasão fiscal e fortalecer a administração tributária”, ressaltou a presidenta do IFJ. 

O deputado argentino Hugo Yasky afirmou que na Argentina  a criação do imposto sobre grandes fortunas tem a aprovação de 75% da população. Segundo ele, a medida vai permitir que o Estado garanta políticas públicas, como saúde e educação. “Temos que buscar uma maneira de reverter a lógica do rico cada vez mais rico e o pobre cada vez mais pobre. Não podemos seguir falando da pobreza se não falarmos da renda concentrada. É preciso construir políticas públicas pra construir um país mais justo”, enfatizou Yasky. 

O parlamentar argentino destacou também que a desigualdade da América Latina agrava o problema da pandemia da Covid-19. Segundo Ysaky, na Argentina o governo implementou uma série de medidas sociais para atender os setores mais vulneráveis. Ele lembrou que foi criada uma ajuda familiar de emergência, equivalente a 10 mil pesos argentinos. “Como medida para enfrentar a crise da pandemia, surgiu na Câmara a proposta de imposto sobre grandes fortunas, que prevê taxar aqueles que têm fortunas de mais de 200 milhões de pesos argentinos. Seria o ponto de partida para se discutir na Argentina uma reforma tributária justa e progressiva”, ressaltou. 


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