Índios reivindicam Parque de Itapuã

Índios reivindicam Parque de Itapuã

Possível repasse da gestão da área à iniciativa privada preocupa pesquisadores

Fernanda Bassôa

Índios reivindicam Parque de Itapuã

publicidade

Declarações de integrantes do governo do Estado sobre o possível repasse da gestão do Parque Estadual de Itapuã, em Viamão, à iniciativa privada causaram alvoroço entre entidades que defendem direitos indígenas e áreas de preservação ambiental. Arqueólogos, antropólogos e ambientalistas entendem que Itapuã é de direito da comunidade da aldeia Guarani, formada por, pelo menos, 75 índios que vivem ao lado do parque.

A Coordenadoria-Geral de Identificação e Delimitação da Fundação Nacional do Índio (Funai) confirma que existe relatório preliminar dos estudos de demarcação da área como supostamente indígena. No entanto, o documento, feito por um Grupo de Trabalho (GT) criado em 2006, segue em análise. Segundo a Funai, o relatório necessita de ajustes. Este poderia ser um dos impasses que o governo do Estado enfrentaria para conceder à iniciativa privada a gestão do parque, que é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral.

Santiago Franco, membro do Conselho de Articulação do Povo Guarani, grupo independente que acompanhou as ações do GT, afirma que não só o Parque de Itapuã, mas também áreas vizinhas, como o Morro do Côco e a Ponta da Formiga, teriam sido identificadas como terras indígenas. Ele explica que o grupo está se movimentando para ir a Brasília nesta segunda-feira para reivindicar a oficialização da área. “Estamos preocupadíssimos. A privatização do Parque de Itapuã não pode acontecer.” Franco, que também integra o GT, comenta que o processo de pesquisa e identificação das áreas durou entre dois e três anos. “Não tenho dúvidas que a localidade do parque é terra dos índios. Estamos protestando contra esta ideia do Estado, pois o documento comprova e confere esse direito a eles”, garante o conselheiro que há anos acompanha os problemas as tribos da região.

O assessor técnico da Secretaria Adjunta dos Povos Indígenas e Direitos Específicos da Prefeitura de Porto Alegre, Luiz Fernando Fagundes, conta que, quando o parque foi criado, na década de 70, já havia aldeias indígenas no local, mais tarde removidas para criação do parque. “O Plano de Manejo reconhece que existem ali uma série de sítios arqueológicos, entre eles o tupi-guarani.”

O cacique guarani da aldeia de Itapuã, Vherá Poty, de 27 anos, diz que mais de 5,6 mil hectares na região são identificadas como área indígena. “Queremos aquilo que um dia foi nosso. Essa é nossa luta antiga.” Poty considera que o parque só existe, só é preservado, porque os índios moraram ali. Caso contrário, seria urbanizado. “Queremos viver de acordo com nosso modo cultural, nosso hábito indígena, preservando a mata nativa e os animais.”

Hoje, a aldeia ocupa 24 hectares ao lado do parque, espaço concedido pelo Estado. Segundo o cacique, as famílias vivem em casas construídas com tábuas, de forma precária. Contam com espaço de ensino e posto de saúde.

Até agora, não há irregularidade, diz MPF

O procurador do Núcleo das Comunidades Indígenas e Minorias Étnicas da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, Mauro Cichowski dos Santos, explica que não há nenhuma ação judicializada sobre o assunto, apenas o pleito antigo da comunidade indígena para garantir a apropriação das terras. “O que existe é um procedimento administrativo, um inquérito civil, muito complexo, que se arrasta há anos, e que busca a real identificação daquela área. Nós acompanhamos isso com a Funai.”

Santos afirma que não há nenhuma irregularidade na manobra do Estado em querer conceder a gestão administrativa do parque à iniciativa privada, mesmo se futuramente houver o reconhecimento oficial das terras como indígenas. “O Estado tem legitimidade para adotar qualquer política pública com relação ao espaço.” A postura do Ministério Público Federal (MPF) só mudará, conforme Santos, se houver qualquer dano, risco ou prejuízo ao direito do índio.

O que diz o Estado

A Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável informou que não há nada de concreto em relação à concessão, mas existe a intenção do governo de conceder alguns espaços. A definição do modelo ficará a cargo da Secretaria do Planejamento que, por sua vez, afirmou que, oficialmente, não há nenhuma negociação neste sentido. O Estado disse que não se manifestaria sobre a questão da área ser indígena porque não há nada oficializado sobre o assunto.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895