Abaixo-assinado contesta proibição de short no Colégio Anchieta

Abaixo-assinado contesta proibição de short no Colégio Anchieta

Texto pede que instituição ensine alunos a respeitarem o corpo feminino

Correio do Povo

Alunas fazem abaixo-assinado contra a proibição de short no Colégio Anchieta

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Um abaixo-assinado, que teria sido feito pelas alunas do Colégio Anchieta de Porto Alegre, protesta contra a proibição do uso de shorts na instituição. O texto "Vai Ter Shortinho Sim" pede que a direção deixe para trás o "machismo, a objetificação e a sexualização" e ensine aos demais alunos a respeitar partes normais do corpo feminino.

No abaixo-assinado, são citados casos em que uma menina teria sido obrigada a trocar de roupa ou voltar para casa por causa do short ser "muito curto". Até às 13h45min desta quarta-feira, 4.634 pessoas haviam assinado o texto. A meta é de 5 mil. A assessoria de imprensa do Colégio Anchieta prometeu divulgar até o final da tarde desta quarta uma nota oficial sobre o assunto.

O abaixo-assinado foi criado na noite dessa terça-feira pelas alunas Lara Dresch, 14 anos, e Kessin Weber, 15 anos. O texto foi escrito por Giulia Morschbacher, 16 anos. Segundo uma das responsáveis pela página da campanha no Facebook, Bianca Finamor, de 16 anos, 12 meninas se uniram para levar adiante o protesto.

"Mesmo com 35º graus o colégio nos proíbia de usar o "shortinho" por chamar atenção de meninos, e não ser adequado ao local", argumenta Bianca. Os meninos teriam permissão de usar calção de surf, mas, segundo a aluna, o short feminino "é considerado uma roupa de praia, não de escola" pela direção. "Podemos usar roupas com até 2 dedos acima do joelho", afirmou.

Na tarde desta quarta-feira, grande parte das meninas foram vestindo shorts para manifestar apoio ao grupo do #VaiTerShortinhoSim. De acordo com Bianca, foi marcada uma reunião nesta tarde entre a escola e as alunas.

Caso não seja liberado o uso do shortinho, as meninas pretendem seguir com os protestos e com o abaixo-assinado. "Temos direitos de nos vestirmos como bem entendermos e ninguém pode negá-lo! Não vamos descansar até alcançá-lo!", afirmou a jovem.

Confira o texto do abaixo-assinado na íntegra

"Nós, alunas do ensino fundamental e médio do Colégio Anchieta de Porto Alegre, fazemos uma exigência urgente à direção. Exigimos que a instituição deixe no passado o machismo, a objetificação e sexualização dos corpos das alunas; exigimos que deixe no passado a mentalidade de que cabe às mulheres a prevenção de assédios, abusos e estupros; exigimos que, ao invés de ditar o que as meninas podem vestir, ditem o respeito.

Regras de vestuário reforçam a ideia de que meninas tem que “se cobrir” porque garotos serão garotos; reforçam a ideia de que assediar é da natureza do homem e que é responsabilidade das mulheres evitar esse tipo de humilhação; reforçam a ideia de que as roupas de uma mulher definem seu respeito próprio e seu valor.

Ao invés de humilhar meninas por usar shorts em climas quentes, ensine estudantes e professores homens a não sexualizar partes normais do corpo feminino. Nós somos adolescentes de 13-17 anos de idade. Se você está sexualizando o nosso corpo, você é o problema.

Quando você interrompe a aula de uma menina para forçá-la a mudar de roupa ou mandá-la pra casa por que o short dela é “muito curto”, você está dizendo que garantir que os meninos tenham um ambiente de aprendizagem livre de “distrações” é mais importante do que garantir a educação dela. Ao invés de humilhar meninas pelos seus corpos, ensinem os meninos que elas não são objetos sexuais.

Ao invés de ensinar que a minha decência e o meu valor dependem do comprimento do meu short ou do tamanho do meu decote, ensine aos homens que eu sou a única responsável pela definição da minha decência e do meu valor. Ensine aos homens o respeito, desconstrua o pensamento de que a roupa de uma mulher decreta se ela é ou não merecedora de respeito.

O Colégio Anchieta diz ser um colégio que ensina a pensar e fazer o futuro, mas nós não vemos nada de futuro em suas aulas e suas políticas. Não discutimos temas atuais, fenômenos sociais; não aprendemos política; nunca ouvimos falar de feminismo, machismo, sexismo, racismo e xenofobia em sala de aula; não aprendemos sobre opressão de classe, gênero e raça; não nos falaram sobre o desastre da Vale/Samarco nem sobre as operações anticorrupção acontecendo no Brasil; não nos explicam sobre cotas para universidade; não nos ensinam a diferença entre opinião e discurso de ódio; não nos ensinam o mínimo para compreender e para viver em sociedade.

A prioridade é ensinar para o ENEM e vestibulares, entendemos. Mas a educação social e política não pode ser deixada de lado. É por meio dela que construiremos uma geração melhor que a anterior; é por meio dela que criaremos um mundo onde mulheres não serão julgadas e humilhadas pelas roupas que escolhem vestir, pela forma que tem ou por quantas pessoas já transaram; é por meio dela que acabaremos com a realidade de que, a cada 2 minutos, 5 mulheres são espancadas no Brasil e, a cada 11 minutos, 1 é estuprada; é por meio dela que criaremos um mundo onde cotistas não precisarão ouvir que “roubaram a vaga” de alguém que estudou a vida inteira em colégio particular; um mundo onde mães de crianças negras tenham certeza de que, no fim do dia, seus filhos voltarão pra casa; um mundo onde não perderemos mais vidas para a Guerra Às Drogas; onde mulheres não morrerão em clínicas clandestinas de aborto; onde a religião e a política não se misturarão; onde o capital não será mais importante do que a vida; onde os problemas de hoje serão solucionados.

Nós, alunas do ensino fundamental e médio do Colégio Anchieta, nos recusamos a obedecer a regras que reforçam e perpetuam o machismo, a cultura do estupro e slut shaming."

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