Em quatro décadas, homem construiu um lar na rua

Em quatro décadas, homem construiu um lar na rua

Andarilho de Porto Alegre criou um ambiente na região central

Felipe Samuel

Andarilho de Porto Alegre criou um ambiente na região central

publicidade

Quem passa debaixo do viaduto da avenida Júlio de Castilhos, no Centro, próximo à Rodoviária, percebe que existe algo diferente. Uma casa de madeira, com 1,95m de comprimento por 1,84m de largura, invade a paisagem de centenas de pedestres e motoristas que passam diariamente pelo local. O ambiente, que conta com um dormitório, uma cozinha e uma sala; abriga Loreni Alves da Silva e a cachorrinha vira-lata Diana, que o acompanha há três anos.

Andarilho com passagens por vários bairros de Porto Alegre, Loreni sobrevive com o que ganha realizando trabalhos artesanais ou em pequenas reformas. Mesmo sem saber ler ou escrever, sempre se virou para manter uma vida digna. Morador de rua há quatro décadas, o descendente de índios nascido em Miraguaí – município que se emancipou de Tenente Portela em 1965 – deixou a cidade natal aos 8 anos para morar Capital. Foi acolhido por uma família, mas aos 10 anos decidiu sair de casa.



O desafio de morar na rua parecia enorme, no entanto, Loreni já havia passado por um turbilhão de problemas desde a infância. Perdeu o pai aos 5 anos. E a mãe um ano depois. Sem contato com parentes, veio para a Capital, onde iniciou sua trajetória perambulando. Antes de montar a casa que o abriga, Loreni dormia dentro de carrinhos adaptados com soluções criativas, como lixeira e fogão. Barracas também serviam de abrigo.

Uma das poucas vezes em que decidiu morar em um local fixo foi em uma casa na Ilha da Pintada. Foram dois anos. Mas a enchente de julho de 1994 colocou tudo abaixo. E botou fim a um relacionamento com a mãe de seus dois filhos, Eliane, 21 anos, e Elias, 19. Desde 2005, o carpinteiro não vê a familia. Após a perda da casa, a volta para as ruas foi praticamente natural.

Aos 46 anos, garante que vive de pequenas reformas em prédios próximos ao viaduto. “Já trabalhei na Cootravipa, mas o que eu gosto de fazer são trabalhos em madeira”, garante. Mesmo com a vida cheia de altos e baixos, ele assegura que sempre tem uma boa companhia para tomar café e aproveitar a casa. Do lado de fora, aliás, tem um varal de roupas retrátil pendurado. Dentro do quitinete, fogão, mesa, bancos, panelas e copos – todos bem organizados – completam a infraestrutura oferecida pelo anfitrião. A cama modesta e arrumada tem uma pequena entrada. Com uma rotina marcada pelo trabalho, dorme e acorda cedo. “Tendo pernas e saúde, a gente não precisa de mais nada”, destaca.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895