Mais de 45 anos depois, Porto Alegre presencia nova implosão

Mais de 45 anos depois, Porto Alegre presencia nova implosão

Operação para derrubada do prédio da SSP provoca alterações da rotina da Capital

Felipe Nabinger

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Quatro décadas de história virão abaixo em Porto Alegre. Um marco visual da entrada e saída da Capital, que por sete horas foi atingido por chamas no ano passado, será implodido em sete segundos. O prédio da antiga sede da Secretaria da Segurança Pública (SSP) dará lugar a 20 mil toneladas de escombros, após o acionamento de 200 quilos de explosivos. Pioneiro da área da implosão de prédios no Brasil, o engenheiro paulista Hugo Takahashi, falecido em 1990 em um acidente automobilístico, dizia que esse tipo de ação é uma “tragédia com hora marcada”. No caso do prédio em questão, essa hora está marcada para amanhã, 9h. Será a primeira implosão na Capital depois do antigo prédio das Lojas Renner, em 1976.

Comparada a uma “operação de guerra”, 28 entidades públicas – das esferas federal, estadual e municipal – e privadas estão envolvidas no evento que modifica a rotina da Capital desde o final da tarde de hoje. Com a ação de cada órgão articulada pelo Sistema de Comando de Incidentes (SCI), instalado pelo Estado e sob a coordenação da Defesa Civil, a operação demanda a evacuação total de residências e estabelecimentos em um raio de 300 metros a partir do prédio e o fechamento temporário da Estação Rodoviária e parte das estações do Trensurb, a restrição do espaço aéreo e bloqueios de trânsito em importantes vias da cidade. O custo da implosão do prédio foi estimado pela SSP em R$ 3,15 milhões.

“O trabalho de limpeza de área já começa no sábado. A Empresa Pública de Transportes e Circulação (EPTC) começa com o controle dos estacionamentos na área de interesse operacional, que é um raio de 300 metros do prédio da SSP. Na manhã de domingo, a partir das 7h, há um contingenciamento de veículos, que não entrarão mais. Às 8h se congela tudo. Não entra pessoas nem veículos, mesmo que sejam moradores”, explica o sub-chefe da Defesa Civil estadual, coronel Marcus Vinicius Gonçalves Oliveira. 

O coronel reforça que o horário previsto para a normalização das atividades impactadas é o meio-dia. No entanto, ele estima que a partir das 10h, uma hora após a implosão, a cidade já inicie o retorno a sua normalidade.

Conforme o vice-governador e titular da Secretaria de Segurança Pública do Estado, Ranolfo Vieira Júnior, há duas possibilidades para o terreno após implosão. Uma é a construção de um novo prédio para a SSP e outra a permuta do local, ficando quem assumi-lo responsável pela construção de nova sede em outro ponto da cidade. A definição deve ocorrer ainda em março.

Confira os impactos da operação:

• SÁBADO

As ações referentes à implosão já começam a ser executadas hoje. É possível destacar o isolamento do perímetro pela EPTC, evitando o estacionamento de veículos, a montagem da estrutura que servirá de base de operações e o reforço das orientações para pessoas em situação de rua.

Isolamento

Hoje, a partir das 18h, a EPTC inicia o isolamento das vagas de estacionamento no perímetro, que engloba as ruas Garibaldi, Santo Antônio, Ernesto Alves, Comendador Coruja e Pelotas, entre a avenida Farrapos e a rua Voluntários da Pátria. A partir deste momento, não será mais permitido estacionar em via pública no raio de 300 metros do prédio, considerada Área de Segurança Pública.

Montagem do da base operacional

A estrutura do Posto de Verificação Veicular (PVV), entre a Rua Comendador Álvaro Guaspari e o início da Rua Santo Antônio, local que funcionará como área para posicionamento de viaturas das forças de segurança e base das equipes de trabalho, também começa a ser montada no final da tarde.

Orientações da Fasc

Durante a semana, a Fundação de Assistência Social e Cidadania de Porto Alegre (Fasc) realizou abordagens à população em situação de rua da região, informando sobre a necessidade de evacuação temporária no perímetro. Hoje essa ação foi intensificada.

• DOMINGO

Sirenes soarão no Centro de Porto Alegre. Cinco sinais sonoras serão acionadas em alerta de segurança para anunciar o fim do prazo de cada uma das etapas. A primeira marca a desocupação dos imóveis e a última delas sinaliza a contagem regressiva para a implosão. 

Sinalização sonora

8h – desocupação dos imóveis;
8h30min – bloqueio total das vias para circulação de trânsito e pessoas;
8h50min – inspeção final da área evacuada;
8h55min – toque de atenção;
8h59min – contagem regressiva para implosão.

Evacuação de domicílios

Ao longo da última semana, a Defesa Civil do Estado distribuiu um impresso com informações de evacuação dos imóveis dentro do raio de 300 metros do prédio da SSP. Amanhã, a partir das 7h, em conjunto com a Brigada Militar (BM), será dado início ao trabalho de desocupação total dos imóveis. Todos os moradores e trabalhadores de estabelecimentos serão orientados a deixarem os locais e se dirigirem para além dos limites da Área de Segurança Pública. Ninguém poderá permanecer, sob nenhuma hipótese, podendo retornar somente após a liberação das autoridades. Foram levantados 55 imóveis existentes no perímetro.

Aos residentes na área, foi solicitado, além da evacuação, que fechem o registro do gás (botijão); cerifiquem-se que todas as portas e janelas estão fechadas a fim de evitar eventual poeira; desliguem a chave geral de energia; mantenham os veículos em garagens cobertas; e levem consigo seus animais de estimação. “São pouquíssimos imóveis residenciais. As pessoas estão bem conscientes e acreditamos que será muito tranquilo”, afirma o sub-chefe da Defesa Civil do Estado.

Bloqueios de trânsito

A interrupção de circulação de pessoas e veículos no perímetro da operação demandará uma série de desvios de trânsito, incluindo entradas de Porto Alegre, nas proximidades das pontes sobre o Guaíba. A EPTC e Polícia Rodoviária Federal (PRF) darão início aos bloqueios às 8h. A Avenida Farrapos estará livre para circulação, com passagem bloqueada apenas para ingresso nas ruas que levam ao perímetro que será evacuado.

Serão 14 pontos de barreiras:
1. Rua Ramiro Barcelos com Rua Voluntários da Pátria
2. Rua Ramiro Barcelos com Avenida Farrapos
3. Avenida Farrapos com Rua Pelotas
4. Avenida Farrapos com Rua Comendador Coruja
5. Avenida Farrapos com Rua Ernesto Alves
6. Avenida Farrapos com Rua Santo Antônio
7. Avenida Farrapos com Rua Garibaldi
8. Avenida Farrapos com Rua Barros Cassal
9. Avenida Farrapos com Rua Voluntários da Pátria
10. Largo Vespasiano Júlio Veppo (acesso à rodoviária)
11. Avenida Castelo Branco (acesso ao lado da Estação Rodoviária do Tresurb)
12. Avenida Júlio de Castilhos (acesso ao elevado que leva para a Avenida Castelo Branco)
13. Avenida Castelo Branco (acesso pela Ramiro Barcelos)
14. Avenida Castelo Branco – PRF (desvio desde o km 94 da BR-290 e bloqueio na alça de acesso pela ponte antiga do Guaíba).

Rotas alternativas

Para desviar do perímetro da operação, que terá circulação totalmente interrompida, os motoristas terão opções de trajeto.

1. Pela avenida Júlio de Castilhos para rua da Conceição e Farrapos, seguindo em direção à zona norte.
2. Pela avenida Júlio de Castilhos para rua da Conceição e entrar no túnel em direção aos bairros.
3. Pela avenida Júlio de Castilhos para a Mauá em retorno ao Centro.
4. Para quem sai do Túnel da Conceição pela direita, para a avenida Farrapos, em direção à zona norte.
5. Para quem sai do Túnel da Conceição para a avenida Mauá em direção ao Centro.
6. Pela avenida Farrapos, passando por baixo do elevado da Conceição, rumo à avenida Mauá, para seguir ao Centro.
7. No km 94 da BR-290, desvio para a nova ponte do Guaíba, direção Eldorado do Sul, ou para a rua João Moreira Maciel. Depois, curva à esquerda em direção ao bairro Navegantes, com orientação da EPTC para sequência no trajeto, ou, para quem seguir reto, subida para o vão móvel também em direção à Eldorado do Sul.
8. Para quem vem da antiga ponte do Guaíba, acessos normais para seguir pela avenida Sertório ou em direção à BR-116, BR-448 e freeway, com bloqueio apenas para a avenida Castelo Branco.

Rodoviária fechada

A Estação Rodoviária de Porto Alegre também terá de ser totalmente desocupada durante a manhã deste domingo. As últimas saídas e chegadas de ônibus à Capital ocorrem às 7h. Depois disso, terá início a evacuação total do Largo Vespasiano Júlio Veppo. As viagens programadas para o período entre 7h e 12h o Terminal Conceição, embaixo do viaduto do túnel, entre as avenidas Farrapos e Alberto Bins, vai se tornar uma rodoviária temporária, estabelecida pelo Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), que controla a circulação de ônibus intermunicipais, interestaduais e internacionais, e a EPTC. Ao todo, estão previstas 54 saídas e 30 chegadas em Porto Alegre nesse intervalo.

Estações da Trensurb

O funcionamento do Trensurb estará suspenso em três estações amanhã pela manhã. Quem chega ou sai de Porto Alegre de trem, terá como estação terminal a Farrapos. As estações São Pedro, Rodoviária e Mercado não vão operar. Para atender aos cerca de 10 mil usuários que utilizam o trem nas manhãs de domingo, a EPTC vai disponibilizar ônibus para passageiros da estação Farrapos até a estação Mercado.

Fiscalização reforçada no rio

A navegação pelo rio Jacuí, que deságua no Guaíba e fica às margens do perímetro da operação de implosão, não será interrompida. No entanto, haverá fiscalização reforçada por parte da Capitania Fluvial de Porto Alegre para impedir a aproximação de embarcações da área de risco.

Espaço aéreo estará segregado

O espaço aéreo sobre terreno da operação ficará segregado desde as 6h do domingo, até a liberação pelas autoridades. A Força Aérea Brasileira (FAB) limitará um raio de 2 quilômetros na horizontal e 300 metros (mil pés) na vertical, a partir do prédio da antiga sede da SSP. Serão permitidos voos apenas de aeronaves e drones das forças de segurança pública e da empresa contratada para o serviço de implosão, sendo totalmente proibidos quaisquer outros voos de aeronaves e drones.

A implosão

Serão utilizados 200 quilos de explosivos Ibegel SSP, com cartuchos de uma polegada de diâmetro por oito polegadas de comprimento (20 cm). Os explosivos foram instalados a partir do final da semana, tendo sido transportados por uma empresa de segurança especializada. Exército, Departamento de Inteligência da Segurança Pública da SSP (Disp) e Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos (GIE) da Polícia Civil monitoraram toda a movimentação para garantir a proteção do material.

Os explosivos serão instalados em 1.184 furos horizontais, feitos em pilares do prédio, com 1,02 metro de profundidade média, usando 4,5 mil metros de cordel de detonante. O acionamento será realizado a partir de um tubo pirotécnico de 300 metros até o ponto de detonação. A estrutura colapsada foi envolta do térreo até a altura do quarto andar com quatro camadas de telas de proteção reforçadas, no chamado envelopamento, para evitar que eventuais detritos escapem. “No caso específico da implosão são telas feitas por encomenda, mais resistentes que nas obras”, explica o engenheiro responsável Manoel Jorge Diniz Dias. 

A queda total da estrutura colapsada levará sete segundos, gerando cerca de 20 mil toneladas de entulho. Seis sismógrafos de engenharia estarão posicionados em pontos estratégicos do terreno para medir o nível de vibração da implosão e deslocamento de ar (barulho). A estimativa é que a vibração seja inferior na implosão que na rotina de trânsito da região em dias normais. O limite por normas regulamentares é de 15 milímetros de velocidade de partícula por segundo, sendo que a empresa responsável acredita em uma vibração abaixo dessa medida. “Não temos nenhuma preocupação com esse tipo de ocorrência”, garante Dias.

Limpeza e emergências

Jatos d’água serão usados para limpeza de pistas no terreno, onde poderá ocorrer o acúmulo de poeira da implosão, sendo operados pelo Corpo de Bombeiros Militar com caminhão autobomba tanque (ABT). Outro ABT estará próximo do acesso à Avenida Castelo Branco, para auxiliar em eventual necessidade de limpeza da via. Ambulâncias dos bombeiros de do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) ficarão no Posto de Verificação Veicular (PVV) e, caso haja necessidade, o atendimento de eventuais emergências terá como referência o Hospital de Pronto de Socorro (HPS). Conforme os responsáveis pela demolição, a retirada das 20 mil toneladas de entulho deve levar cerca de um mês.

Empresa responsável pela implosão

A FBI Demolidora, empresa com sede em Cotia, em São Paulo, será responsável pela execução técnica do trabalho de implosão do prédio da antiga sede da SSP. O engenheiro de minas Manoel Jorge Diniz Dias e a engenheira civil Ana Paula Marino Faustino são os responsáveis técnicos. Dias é reconhecido como o profissional com maior conhecimento na área do país. Ele esteve à frente das maiores implosões já realizadas no Brasil e tem o apelido de “Manezinho da Implosão”. 

Tendo o engenheiro Takahashi como mentor, em seu currículo estão as implosões do Edifício Palace II, no Rio de Janeiro, em 1998, da penitenciária do Carandiru, em São Paulo, em 2002 – com uma segunda etapa realizada em 2005, do Edifício Berrini, também em São Paulo, em 2008 e do antigo Estádio da Fonte Nova, em Salvador, em 2010. A empresa iniciou os trabalhos de preparação do terreno e do prédio há mais de um mês, em 1º de fevereiro.

“O incêndio acabou deixando como herança essa imagem (do prédio destruído). Esperamos que nosso trabalho possa minimizar a dor, especialmente dos familiares dos bombeiros mortos no incêndio”, disse o engenheiro. Ele apontou similaridades da implosão com a do Palace II, porém o prédio da SSP estaria abaixo no grau de dificuldade entre 5 e 10. Enquanto no prédio no Rio de Janeiro apresentaria uma complexidade nível 10, o da edificação gaúcha estaria em 8. 

O incêndio

Na noite do dia 14 de julho de 2021, aproximadamente às 21h40min, o Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul (CBMRS) foi acionado para fazer o combate ao incêndio no prédio da SSP. As chamas tiveram início nas dependências onde funcionavam setores da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), no quarto andar, na Ala Norte do edifício. Atuaram no combate ao fogo, em uma operação que durou sete horas, 68 militares em 21 viaturas de combate e duas autoescadas mecânicas. 

Dois bombeiros militares morreram na operação: o oficial de serviço de dia de Porto Alegre, tenente Deroci de Almeida da Costa, e o sargento Lúcio Ubirajara de Freitas Munhós, servidor do Comando-Geral, que se voluntariou para auxiliar os colegas. Uma sindicância descartou falhas administrativas, embora não tenha sido conclusiva quanto ao que provocou o início das chamas. O prejuízo patrimonial foi estimado em quase R$ 55 milhões.

Implosão em 1976

A implosão de amanhã será a primeira em Porto Alegre após 1976. Naquele ano, em 30 de maio, o prédio das Lojas Renner, na esquina da avenida Otávio Rocha com a rua Doutor Flores, no Centro, levou seis segundos para vir abaixo, sendo posteriormente reconstruído. A implosão foi acompanhada pelo jornal Folha da Manhã, do grupo Caldas Júnior, que registrou cerca de 200 pessoas, apesar da chuva fina e do frio, presenciando a operação, também realizada em um domingo. A edificação fora, em 27 de abril, cenário de uma tragédia. Um incêndio matou 41 pessoas, deixando outras 60 feridas. 


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