Mudanças na reforma trabalhista geram divergência

Mudanças na reforma trabalhista geram divergência

Alguns pontos alterados ainda estão em discussão em outras esferas jurídicas

Henrique Massaro

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Um ano e meio depois de entrar em vigor, a Reforma Trabalhista ainda é motivo de discordâncias. Aprovação rápida, com pouca discussão e mudança em mais de 100 artigos de forma abrupta é como define o processo a juíza do Trabalho e presidente Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região (Amatra IV), Carolina Gralha. Na visão dela, as principais bandeiras da mudança na legislação ainda não se justificaram e a redução expressiva do número de processos se explica, basicamente, pelo receio da população em acionar a Justiça do Trabalho.

Ela se refere ao fato de que, com a mudança, mesmo os trabalhadores que são detentores do benefício de justiça gratuita, precisar pagar a sucumbência em caso de perder a ação, ou seja, os honorários do advogado da parte contrária. A questão está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) sem previsão de ser resolvida e, conforme a magistrada, é o principal motivo da diminuição de ações. 58% das demandas, de acordo com ela, dizem respeito a verbas rescisórias, o que explica o medo de acionar a Justiça. “Há um receio de grande parte dos autores de ingressar, perder e ter que pagar”, avalia.

A juíza também afirma que duas das principais bandeiras da Reforma Trabalhista ainda não se provaram. Uma delas é a redução do desemprego, que supostamente ocorreria com as mudanças, mas que permanece estagnado próximo aos 13 milhões de pessoas. A outra é de que as novas leis ofereceriam mais segurança jurídica, que ainda não é o que o cenário reflete. Segundo ela, nem empreendedores estão se beneficiando da nova norma. “Nós da comunidade jurídica somos preparados para o trabalho com uma nova norma, o que preocupa são os trabalhadores com uma nova lei e não sabem o que fazer com ela”, explica.

Para a presidente da Amatra IV, de fato, até 2016, o número de ações trabalhistas era elevado, mas isso refletia a grande quantidade de lesões aos direitos dos trabalhadores. Ela afirma que, diferentemente do que diziam parte dos defensores da reforma, a principal razão disso não era o abuso do direito de ação, ou seja, quando a Justiça é acionada de maneira equivocada. De acordo com a juíza, no Rio Grande do Sul, por exemplo, somente 14% das demandas foram improcedentes, o que não justificaria uma mudança de todas as relações de trabalho. Na avaliação da magistrada, eventuais e pontuais modificações são importantes nas legislações, mas não foi isso que ocorreu. “A motivação não foi essa modernização, tanto que não houve grandes avanços e a reforma não entregou aquilo que prometeu.” 

Para o advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), Gilberto Stürmer, o receio da população em acionar a Justiça é um dos motivos que reduziu o número de processo, mas não apenas isso. Na opinião dele, a diminuição também tem relação com uma tendência moderna de menos brigas judiciais e com o aspecto da Reforma Trabalhista de coibir o abuso do direito de ação.

Ele concorda com a presidente da Amatra IV que a maioria das demandas na Justiça do Trabalho seja buscando a reparação da lesão do direito dos trabalhadores, mas entende que o abuso do direito de ação acontecia e era algo considerável. De acordo com Stürmer, isso ocorria muitas vezes até por postura dos profissionais e teve uma redução importante após a reforma.

Na sua visão, esse tipo de processo também diminuiu em função do receio da população em ter que pagar a sucumbência. O advogado afirma que tende a concordar com esse ponto, mas não de forma ampla. De acordo com ele, há a necessidade de se examinar caso a caso e jamais fazendo com que o trabalhador hipossuficiente precise tirar dinheiro do próprio bolso.

Para o professor, a Reforma Trabalhista não deve ser analisada ideologicamente, mas do ponto de vista técnico. Nesse sentido, explica que tende a ter uma visão mais equilibrada. De acordo ele, o principal ponto positivo é o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical. Apesar disso, essa medida esbarra em um dos aspectos que considera negativo, pois, da maneira como o sistema sindical foi desenhado, acaba enfraquecendo os sindicatos. Para Stümer, um dos principais erros da reforma foi ela ter vindo antes da Reforma Sindical.

O advogado concorda que até hoje as mudanças não refletem segurança jurídica. Segundo ele, diversas alterações radicais ainda têm matérias sumuladas com a interpretação anterior à aprovação da reforma, porque o Tribunal Superior do Trabalho (TST), assim como o Supremo Tribunal Federal (STF), ainda não ajustaram a jurisprudência dominante. O professor da PUCRS explica que isso gera dificuldade de entendimento em sala de aula e, na prática, dos empregados e até dos empregadores. “As empresas, de maneira geral, estão preocupadas com a interpretação de muitos dispositivos.”


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