Ocupação soviética da Tchecoslováquia deixou mais de 400 mortos

Ocupação soviética da Tchecoslováquia deixou mais de 400 mortos

Tropas invadiram país para desmobilizar "Primavera de Praga" que defendia democracia

AFP

Tropas invadiram país para desmobilizar movimento pró-democracia

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O dia em que o exército liderado pelos soviéticos entrou na Tchecoslováquia comunista para acabar com o movimento pró-democracia mudou a vida de Milan Tesar. "Eu vi tanques vindo por essa estrada, aqui. Joguei uma pedra na direção deles e então ouvi as balas passando," disse em entrevista à AFP na pequena cidade de Hostivice, oeste de Praga. A invasão esmagou o movimento chamado "Primavera de Praga", liderado pelo líder do Partido Comunista, o reformista Alexander Dubcek, que tentou colocar "uma face humana no socialismo" através de reformas no regime totalitarista.

A resistência espontânea de Tesar contra a invasão teve consequências para o então garoto de 16 anos: "Eu não tive permissão para estudar." Mas ele não foi morto, destino de mais de 400 concidadãos, entre homens, mulheres e crianças capturadas pela repressão. Em 20 de agosto aproximadamente 14 milhões de checos e eslovacos aproveitavam uma calma noite de verão, sem desconfiar da tragédia que estava por vir. Alguns membros do Partido Comunista e da polícia secreta em oposição a Alexander Dubcek, então Chefe de Estado e líder do partido, eram os únicos que sabiam.

Primeiras vítimas

Naquela noite, a TV estatal transmitiu "A River Performs Magic", uma comédia lírica sobre um idoso que encontra a juventude perdida em sua cidade natal. O jornal do Partido Comunista, Rude Pravo, discutia mudanças no estatuto do partido e anuncia a visita do Secretário-Geral das Nações Unidas, U Thant. Durante a noite, tudo mudou. Dezenas de tropas soviéticas, apoiadas pelos exércitos da Bulgária, da Alemanha Oriental, Hungria e Polônia esmagaram o movimento "Primavera de Praga", que derrubara a censura e introduzira uma inédita liberdade de imprensa.

O alvorecer trouxe as primeira vítimas, 50 pessoas mortas pelos tiros e tanques das tropas no primeiro dia da invasão. "No total, 137 pessoas morreram na Tchecoslováquia entre 21 de agosto e 31 de dezembro de 1968," diz Libor Svoboda, historiador do Instituto para o Estudo dos Regimes Totalitaristas, em Praga. Quinze pessoas, a maioria jovens, morreram próximo do quartel-general da Rádio da Tchecoslováquia, no centro de Praga, onde uma multidão se reuniu para proteger o prédio com nada além de suas próprias mãos.

"A rádio se transformou em um símbolo de resistência contra a ocupação, porque continuou a transmitir informações livremente mesmo após o início da ocupação", disse Svoboda à AFP. "Muitas pessoas foram mortas a tiros aqui, outras morreram quando um tanque explodiu e o fogo se espalhou pelos prédios próximos" disse em frente ao prédio da rádio.

Caminhão contra pessoas

"Cinco homens com idades entre 20 e 44 anos foram mortos de maneira brutal em frente ao prédio da rádio por um caminhão vazio empurrado pelos soviéticos pela rua contra a multidão, que não teve chances de escapar", lembra Svoboda. Ele lista outras vítimas, incluindo uma jovem mãe de 26 anos com filho pequeno que "foi morta com uma metralhadora sem motivo aparente". "Dois jovens mochileiros de 15 anos foram mortos por soldados que abriram fogo contra um caminhão em que acabavam de entrar", lembra.

Historiadores consideram 402 pessoas como número total de vítimas da ocupação soviética, que durou 20 anos. O último soldado soviético deixou o país apenas em 1991, dois anos após a Revolução de Veludo, que derrubou o regime comunista totalitário. "Nos anos que seguiram à invasão, muitos tchecos e eslovacos, além de vários turistas estrangeiros, foram vítimas de acidentes de trânsito causados pelos soldados soviéticos, que não sabiam dirigir caminhões", diz Svoboda.

"Mas não devemos esquecer crimes como o desertor soviético que assassinou uma mulher e seus dois filhos com um martelo... em abril de 1981." A última vítima das tropas soviéticas em solo tcheco foi um idoso aposentado de 72 anos morto por um caminhão em 16 de novembro de 1990, um ano após a retomada da democracia na Tchecoslováquia, que acabou dividida em dois países em 1993: República Tcheca e Eslováquia.

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