Papa diz que Cúria sofre de '"Alzheimer espiritual"
Mensagem de Natal de Francisco foi de severidade para membros do governo da Igreja
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O Papa afirmou que, como qualquer corpo humano, a Cúria sofre de infidelidades ao Evangelho e de doenças que precisa aprender a curar" Francisco citou 15 doenças, usando expressões fortes como, além de "alzheimer espiritual", "terrorismo do falatório", "esquizofrenia existencial", "exibicionismo mundano", "narcisismo falso" e "rivalidades pela glória".
Através de expressões fortes, que geraram um certo desconcerto entre os cardeais e altos funcionários da Santa Sé, o Papa analisou o que chamou de patologia do maquinário central da Igreja católica, e pediu reflexão, penitência e confissão por ocasião do período natalino.
A primeira doença a que se referiu foi a de sentir-se imortal e insubstituível, sem defeitos, privado de autocrítica, que não se atualiza nem tenta melhorar. "É preciso visitar os cemitérios para ver os nomes de tantas pessoas que se consideravam imunes e indispensáveis", alfinetou.
A segunda doença citada foi o excesso de atividade de trabalho, e convidou a Cúria a respeitar as férias e a dedicar momentos de descanso com a família, algo que ele pessoalmente não segue. A terceira doença que atinge os membros da Igreja é a petrificação mental e espiritual, seguida do excesso de planejamento e funcionalismo, má coordenação e o que chamou de "Alzheimer espiritual", ou seja, o esquecimento do fervor da fé inicial. Outra grave patologia é a da rivalidade e vanglória, o viver no mundo das aparências.
Na lista, o pontífice inclui a "esquizofrenia existencial" de quem esquece que está a serviço das pessoas, de quem apenas se limita a realizar trâmites burocráticos, dos que somente dependem de suas próprias paixões, caprichos e manias e "constroem a seu redor muros e costumes". "Sanar essa enfermidade tão grave é urgente e indispensável", afirmou.
Intrigas e fofocas
O tom foi ainda mais severo quando mencionou a doença das fofocas e das intrigas e pediu que todos se protejam desse tipo de terrorismo pelos danos que provoca. Entre as doenças, incluiu a de divinizar os chefes, o de ser vítima do carreirismo e do oportunismo, de pensar apenas no que pode obter e não no que pode oferecer.
Outra patologia é a doença da indiferença para com os demais e a da cara fúnebre, já que acha que o religioso deve ser uma pessoa amável, serena e entusiasmada. Deve transmitir alegria, enfatizou. "Como faz bem uma boa dose de humor", acrescentou ainda.
Francisco, que rejeita toda e qualquer ostentação papal, inclui entre os males da Igreja atual os de acumular bens materiais, de pertencer a círculos fechados, assim como ao mundano e o exibicionismo. Respeitando o estilo singular de seu discurso, o Papa recordou que os sacerdotes são como os aviões, são notícia apenas quando caem. E concluiu com uma advertência. "Quanto mal pode causar a todo o corpo da Igreja um único sacerdote que cai", afirmou, aludindo indiretamente aos escândalos sexuais e financeiros, assim como o vazamento de notícias por parte de membros da Cúria, atos que marcaram o pontificado de seu antecessor, Bento XVI.
"A cura é o fruto da tomada de consciência da doença", concluiu o Papa, pedindo que os bispos e cardeais permitam que o Espírito Santo inspire suas ações, invés de confiar apenas em suas capacidades intelectuais.
Depois deste discurso, recebido como uma ducha fria, Francisco saudou um a um todos os cardeais, em um ambiente tenso, apesar das amabilidades de fachada. "Ele não teve piedade ao dar o nome das doenças que percebe nos ambientes próximos a ele", comentou o vaticanista Gianni Valente. "Rompeu com o estereótipo do 'papa latino-americano' que não conhece a complexidade da Cúria e a cultura europeia, críticas que provêm de seus detratores para neutralizá-lo", afirma Valente no Vatican Insider. Francisco conduz desde sua eleição, em março de 2013, uma profunda reforma da Cúria, e encontra inúmeras oposições internas, causando muitas preocupações em certos meios.