Químico russo garante que ataque a ex-espião russo foi obra de Moscou
Vil Mirzayanov quer que neurotóxico Novichok seja registrado na lista de armas químicas proibidas
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Vil Mirzayanov, de 83 anos, chegou aos Estados Unidos em 1995 depois de trabalhar por 30 anos para o Instituto Estatal de Pesquisa Científica de Química e Tecnologia, ou GNIIOKhT. Foi ele quem revelou no início dos anos 90 a existência desse tipo de agentes neurotóxico poderoso, primeiro na imprensa russa durante a abertura que levou ao colapso da União Soviética e, em seguida, com fórmulas químicas em seu livro "State Secrets" (Segredos de Estado), publicado em 2007.
O ex-agente russo Sergey Skripal, de 66 anos, foi encontrado no dia 4 de março em estado crítico com sua filha Yulia no banco de um parque em Salisbury (sul da Inglaterra), onde morava há anos. Londres diz que é "altamente provável" que Moscou esteja por trás do ataque com o agente neurotóxico. Falando em sua casa em Princeton, Nova Jersey, Mirzayanov afirma estar convencido de que a Rússia realizou o ataque como uma forma de intimidar os opositores do presidente Vladimir Putin.
"Somente os russos desenvolveram esse tipo de agente neurotóxico", afirmou o químico. "Eles mantiveram e ainda mantêm o segredo". A única outra possibilidade, acrescentou, é que alguém tenha utilizado as fórmulas publicadas em seu livro para fazer a substância.
- Intimidação -
Ele indicou que os russos poderiam argumentar que talvez alguém sintetizou a substância e "poderiam me culpar". Esta é a primeira vez que o agente neurotóxico, que levou 15 anos para ser desenvolvido e que foi testado em animais, foi usado para tentar matar uma pessoa, indicou Mirzayanov. Porque agora? Mirzayanov acredita que o Kremlin quer intimidar os inimigos de Putin.
Ele citou como exemplo a hipótese de alguém que deixou a Rússia com material comprometedor para o presidente Donald Trump em relação à investigação sobre se sua campanha eleitoral esteve em conluio com Moscou para ajudá-lo a derrotar Hillary Clinton. "É muito perigoso para o Kremlin porque é uma conspiração contra os Estados Unidos", disse ele. "Então eles ameaçam essa pessoa e dizem: 'Veja o que aconteceu com Skripal, o mesmo pode acontecer com você'".
Mirzayanov considera que, mesmo que Skripal já não representasse problemas na Rússia, o Kremlin poderia tê-lo matado de maneira cruel apenas para intimidar os adversários potenciais.
- Efeitos incuráveis -
Um ataque com Novichok, que é 10 vezes mais poderoso do que o VX, é horrível e não tem cura, acrescentou, explicando que meio grama é suficiente para matar uma pessoa pesando 50 quilos. Uma pessoa exposta ao agente neurotóxico primeiro tem sua visão desfocada, e se um antídoto não é aplicado, logo começa a sofrer convulsões violentas e não consegue respirar. "Eu vi o efeito em animais: em coelhos, cachorros. É horrível", disse ele. Mesmo que não morram, Skripal e sua filha sofrerão pelo resto de seus dias, prevê.
Este agente neurotóxico é fácil de administrar porque é binário, o que significa que é o resultado da mistura de duas substâncias que são individualmente inofensivas. Isso permite que ambos os componentes sejam transportados de forma segura, e depois misturados para fabricar o agente e colocá-lo em uma arma pulverizadora.
Mirzayanov afirmou que, apesar do horror do ataque, poderia surgir algo bom: que o Reino Unido e outros países ocidentais insistam que que o Novichok seja registrado na Convenção para a Proibição de Armas Químicas, como ele próprio pede há mais de 20 anos. Se fosse assim, talvez o ataque de Salisbury não tivesse ocorrido.
Agora que Mirzayanov fala abertamente sobre o Novichok, seus amigos pedem que tenha cuidado, para que Moscou não busque represálias contra ele. "Mas eu já vivi bastante tempo. Eles não podem me impedir. Vou trabalhar até o fim para que o Novichok seja submetido ao controle internacional", disse ele.