Caso Miguel: delegado relata falta de desejo da mãe em encontrar filho e chama madrasta de monstro

Caso Miguel: delegado relata falta de desejo da mãe em encontrar filho e chama madrasta de monstro

Primeiro depoimento foi do delegado Antônio Carlos Ractz

Rodrigo Thiel

Delegado relata falta de desejo da mãe em encontrar filho e chama madrasta de monstro

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O julgamento do assassinato do menino Miguel dos Santos Rodrigues começou na manhã desta quinta-feira no Fórum de Tramandaí, no Litoral Norte. As rés são mãe e madrasta da criança, morta aos sete anos em 2021.

O primeiro a depor foi o delegado Antônio Carlos Ractz responsável pela investigação do caso. À época do crime, ele era titular da Delegacia de Imbé, onde as acusadas moravam com a vítima.

Ele afirmou que a mãe do menino, Yasmin Vaz dos Santos, não tinha desejo de encontrar o filho logo depois de ter comunicado o desparecimento. Ao falar da madrasta, Bruna Nathiele Porto da Rosa, Ractz foi ainda mais incisivo: “Eu não tenho respeito por ela. Ela não é uma pessoa, ela é um monstro”, declarou.

"Desde o início, eu achei estranho o comportamento da mãe e da madrasta. No interrogatório da Yasmin eu me deparei com a pessoa mais fria que encontrei na minha vida. Eu chorei durante esse interrogatório. Ela admitiu que mantinha a criança trancada num armário. Eu tentava tirar dela o paradeiro da criança, mas ela não demonstrava desejo de encontrar o próprio filho”, disse o delegado.

Antônio Carlos Ractz explicou que durante as investigações encontrou as buscas que mãe e madrasta fizeram antes de comunicar o desparecimento da criança. “Procuraram para ver se era possível encontrar digitais no mar”.

Durante a sua manifestação, Ractz se deteve a falar do comportamento da madrasta Bruna Nathiele. “Ela é teatral. Ela provavelmente fará aqui um teatro, mas eu não tenho respeito por ela. Para mim, ela não é uma pessoa, ela é um monstro”, relatou.

Ractz explicou que Miguel era trancado em armário com o auxílio de um cabo de vassoura. "Ele permanecia ali boa parte do tempo. Ele fazia as suas necessidades ali, nas próprias roupas, e apanhava por isso. Enquanto isso, a vida da mãe e da madrasta seguia. Elas trabalhavam e passeavam enquanto ele ficava trancado", acrescentou.

Conforme o delegado, Miguel já teve a sua sentença de morte decretada há muito tempo. "O Miguel já estava morto há muito tempo. Ele foi rejeitado pelo pai lá atrás. E com elas não ele não era alimentado. A foto que temos dele, que ficou conhecida publicamente, foi tratada. Ele na realidade estava muito pior do que aquilo ali. Coloca mais 15 dias em cima daquela foto", pontuou.

Impedido de frequentar aulas

Os fatos aconteceram durante a pandemia, ocasião em que a escola da vítima manteve aulas online. Na versão do delegado, a mãe de Miguel impedia que ele participasse das lições. A intenção seria impedir que o menino tivesse contato com colegas e professoras, para não levantar suspeitas dos maus-tratos.

"Não havia aula presencial, mas era possível online. A Yasmin disse que ele não iria acompanhar online. Isso porque, se ele aparecesse falando no celular, com certeza as professoras iam desconfiar e perceber alguma coisa. Ela até assinou um termo, onde disse que não queria aulas virtuais, e chegou a dizer que não tinha internet em casa. Na realidade, o apartamento delas tinha roteador e ficava no centro, elas tinham o melhor sinal de internet em Imbé”, destacou o policial.

Na sequência, ele disse que as buscas localizaram uma corrente com material genético de Miguel na casa das rés. Isso provaria que o menino foi acorrentado no local. A criança, segundo o relato, também passava fome e era forçado a escrever textos autodepreciativo.

"Não bastava ele ter sido torturado, elas também o forçaram a escrever ‘sou idiota’, ‘não mereço a mãe que tenho’, ‘sou ruim’, etc. Isso é a prova da tortura psicológica dele.”

Ractz complementou que as duas foram filmadas por câmeras de segurança, em um trajeto onde andavam com uma mala, onde o corpo da criança teria sido colocado. Material genético do menino também foi localizado dentro do item.

"Ele talvez tenha sido dobrado ou teve os ossos quebrados. Enfim, Miguel cabia na mala, como foi comprovado em perícias. O IGP comprou um boneco de criança com as mesmas medidas dele, para fazer reprodução simulada. Ficou comprovado que a mala aguentava o peso de uma criança daquela idade”, enfatizou.

Trancado e sem comida

Ainda no depoimento do delegado, ele foi perguntado sobre a capacidade das rés Yasmin e Bruna de realizarem o homicídio. “Ela (Yasmin) é má, é um monstro. E os peritos atestaram que a Bruna era mentalmente capaz de cometer o crime. Se comparar com outros casos parecidos, como o do Bernardo (Boldrini) e do Rafael (Winques), o do Miguel é o pior desses casos. Ele permaneceu trancado, acorrentado e sem comida”, completou.

Ao final do depoimento, a defesa da ré Bruna, madrasta de Miguel à época, questionaram sobre a participação dela no caso. “Com relação à tortura, o papel dela era muito maior. Já quanto ao homicídio, ela participou também. Nós chegamos à conclusões com base em provas. O Miguel não está aqui para contar o que aconteceu. O comportamento da Bruna com relação a ele era o pior possível, na forma como ela tratava o guri. Ali ela mostra o monstro que ela é. Eu acho que ela fingiu sempre. Os peritos dizem que ela simula situações”, finalizou o delegado.

O relato do delegado e os questionamentos de promotores e advogados de defesa durou cerca de 3h, marcando a primeira manhã do julgamento do caso Miguel. O julgamento foi suspenso e deve retornar às 13h30min desta quinta-feira. A previsão é que, na tarde desta quinta-feira, ocorra o depoimento de outras oito testemunhas e o interrogatório das rés.

Relembre o caso Miguel

Segundo a denúncia do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), o homicídio teria ocorrido entre 26 e 29 de julho de 2021, mas desde abril do mesmo ano a criança já seria submetida à tortura física e mental. O corpo teria sido arremessado no rio Tramandaí e nunca foi localizado. Uma mala teria sido utilizada para carregar o corpo até o rio. No objeto, também teria sido encontrado DNA do menino.

Yasmin e Bruna foram denunciadas pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) por terem espancado e matado o menino Miguel. Elas respondem por homicídio triplamente qualificado, tortura e ocultação de cadáver, com qualificadoras de motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima.

Em depoimento, Yasmin e Bruna teriam confessado a autoria do crime. O MPRS afirmou que pedirá pena máxima para as rés. O juri será formado por sete jurados, que vão decidir se elas são culpadas ou inocentes. Caso sejam condenadas, o juiz Gilberto Fontoura definirá a pena das rés.

* Com a participação do repórter Marcel Horowitz


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