Ministério Público acompanha investigação da Polícia Civil sobre assassinato de adolescente indígena

Ministério Público acompanha investigação da Polícia Civil sobre assassinato de adolescente indígena

Vítima de 14 anos foi encontrada nua e com o corpo dilacerado na Terra Indígena do Guarita, em Redentora

Correio do Povo

Corpo da vítima foi encontrado no dia 4 deste mês

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O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) acompanha as investigações da Polícia Civil sobre o assassinato da indígena kaingang adolescente Daiane, de 14 anos, cujo corpo foi encontrado na tarde do último dia 4. O crime ocorreu no Setor Estiva da Terra Indígena do Guarita, com cerca de 23,4 mil hectares, no município de Redentora, localizada na região Noroeste do Estado.

O promotor de Justiça Miguel Germano Podanoche está encarregado do acompanhamento. “O caso, por envolver uma investigação complexa, está sob sigilo. Por enquanto, o MP está colaborando com a Delegacia de Polícia e aguardando que o inquérito policial seja concluído, para que então se busque a punição da pessoa ou das pessoas envolvidas no fato”, afirmou.

A vítima estava em uma plantação nas imediações de uma mata aberta. Nua, a indígena estava com parte do corpo dilacerado. O delegado Vilmar Alaídes Schaefer já adiantou que nenhuma hipótese é descartada para o crime, como vingança ou violência sexual, com morte e mutilação do corpo.

REPERCUSSÃO

O Conselho Indigenista Missionário-Cimi Regional Sul manifestou indignação. “A violência que se pratica contra indígenas se intensifica na medida em que se proliferam os discursos de ódio e intolerância contra os povos em âmbito nacional. Lamentavelmente os jovens, especialmente meninas, têm sido vítimas preferenciais de homens perversos, assassinos e estupradores. Exige-se justiça e medidas de proteção aos territórios e aos direitos dos povos indígenas”, protestou em nota oficial.

“O Cimi Sul espera que a Funai e os órgãos de investigação federais promovam ações no sentido de coibir as violências e responsabilizar os agressores e criminosos, bem como averiguar e ou identificar se os crimes estão vinculados a intolerância e o racismo contra os povos indígenas. Manifestamos nossa solidariedade e apoio à família de Daiane e ao povo Kaingang nesse momento de perplexidade e dor. Esse crime hediondo não pode ficar impune”, concluiu no comunicado.

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, também posicionaram-se sobre o “crime bárbaro” da jovem indígena.

“A violência contra os povos indígenas tem se intensificado a cada dia. Assassinam nossos jovens, nossas mulheres, nossas lideranças; roubam nossas terras e querem tirar nossos direitos. A violência contra as mulheres indígenas é intensa desde a invasão portuguesa. Mulheres que são a vida do nosso povo, mulheres que curam mulheres guerreiras”, manifestaram-se as entidades, repudiando “toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade”.

“Não podemos aceitar que nossas vidas continuem sendo ceifadas, e que nossos direitos sejam retirados, ainda mais quando falamos do nosso direito maior, o direito à vida! Exigimos justiça!”, enfatizaram na nota oficial.

Já a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) igualmente publicou manifesto de repúdio e denúncia. “Temos visto dia após dia o assassinato de indígenas. Mas, parece que não é suficiente matar. O requinte de crueldade é o que dilacera nossa alma, assim como literalmente dilaceraram o jovem corpo de Daiane, de apenas 14 anos”, postou nas redes sociais.

“Esquartejam corpos jovens, de mulheres, de povos. Entendemos que os conjuntos de violência cometida a nós, mulheres indígenas, desde a invasão do Brasil é uma fria tentativa de nos exterminar, com crimes hediondos que sangram nossa alma. A desumanidade exposta em corpos femininos indígenas, precisa parar!

Estamos aqui, reivindicando justiça! Não deixaremos passar impune e nem nos silenciarão. Lutamos pela dignidade humana, combatendo a violência de gênero e tantas outras violações de direitos”, complementou.

“As violências praticadas por uma sociedade doente não podem continuar sendo banalizadas, naturalizadas, repleta de homens sem respeito e compostura humana, selvageria, repugnância e macabrismo. Quem comete uma atrocidade desta com mulheres filhas da terra, mata igualmente a si mesmo, mata também o Brasil. Mas saibam que o ÓDIO não passará! Afinal, a violência praticada não pode passar impune, nossos corpos já não suportam mais ser dilacerados, tombado há 521 anos. Que o projeto esquartejador empunhado pela colonização, violenta todas nós, mulheres indígenas há mais de cinco séculos”, acrescentou.

“Somos 448 mil Mulheres Indígenas no Brasil que o estrupo da colonização não conseguiu matar e não permitiremos que a pandemia da violência do ódio passe por cima de nós.

Parem de nos matar! A cada mulher indígena assassinada, morre um pouco de nós. Vidas indígenas importam. Gritaremos todos os dias, a cada momento, vidas indígenas importam. E a vida de Daiane importa. Importa para sua família, para seu povo. Importa para nós mulheres indígenas”, finalizou a entidade.

Por sua vez, a Secretaria de Igualdade, Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social do Rio Grande do Sul manifestou pesar e indignação pela morte da indígena. “O caso estarrecedor da menina Daiane expõe o quão necessário e urgente é fortalecer as políticas públicas protetivas e transversais para essa população que vem sofrendo de forma constante violências de todos os tipos em todo o território brasileiro. Estamos acompanhando as investigações que estão sendo conduzidas com absoluta prioridade pelas forças policiais do Estado, a fim de elucidar qualquer hipótese que possa ter ocasionado esse fato”, informou.

“Reafirmamos a importância do Estado e da sociedade no processo de cuidado e garantia dos direitos humanos dos povos originários, no sentido de combater a xenofobia e o preconceito, infelizmente ainda persistentes. É preciso, também, que respeitemos a diversidade cultural e étnica, que muito nos ensina sobre os cuidados com o lugar onde moramos, a valorização da natureza, dos seres vivos, da vida e da humanidade. Esta Secretaria expressa seus sentimentos aos povos indígenas e se coloca indispensavelmente à disposição neste momento de tanta dor”, concluiu em nota oficial.

 


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