“Não podemos fingir que é apenas um problema de segurança pública”, diz delegada sobre série de feminicídios no RS

“Não podemos fingir que é apenas um problema de segurança pública”, diz delegada sobre série de feminicídios no RS

Cristiane Ramos, diretora da Divisão de Proteção e Atendimento à Mulher da Polícia Civil, defende envolvimento da sociedade para enfrentar o problema

Caroline Souza
Em quase todos os casos, as vítimas foram assassinadas por parceiros ou ex-companheiros

Em quase todos os casos, as vítimas foram assassinadas por parceiros ou ex-companheiros

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*Com informações de Paulo Roberto Tavares.

O feriado prolongado de Páscoa terminou com famílias enlutadas e comunidades inteiras chocadas com a brutalidade de crimes contra mulheres no Rio Grande do Sul.

Dez mortes violentas foram registradas em um curto intervalo de tempo e em diferentes regiões do Estado.

Conforme a delegada Cristiane Ramos, diretora da Divisão de Proteção e Atendimento à Mulher da Polícia Civil, essa é uma situação sem precedentes.

"Não existe uma resposta para o que aconteceu e não vai ter, porque é multifatorial. O único padrão entre os casos, é que em todos há um homem machista, que não aceita a decisão de uma mulher e faz uso da força para ficar no controle." explica.

Fatores compartilhados

A sequência de crimes escancara a dificuldade das mulheres em romper ciclos de violência construídos dentro de casa. Em quase todos os casos, as vítimas foram assassinadas por parceiros ou ex-companheiros em um momento de aumento do convívio familiar.

Conforme a delegada Cristiane Ramos, diretora da Divisão de Proteção e Atendimento à Mulher da Polícia Civil, historicamente, feriados e finais de semana tendem a abrir espaço para a ocorrência dos conflitos no ambiente domiciliar.

O abuso de álcool e drogas nestes períodos também é um fator de risco que pode desencadear episódios de violência.

Problema social

O fato de os sinais de alerta para violência contra a mulher estarem geralmente associados à intimidade das relações, como o excesso de controle do agressor sobre a vítima, faz com que as situações demorem a chegar ao conhecimento da polícia.

Por isso, a delegada ressalta que o caminho para conter os feminicídios passa por um comprometimento conjunto da sociedade em denunciar e estar atento aos sinais.

"Não podemos fingir que é apenas um problema de segurança pública. Se continuarmos com a ideia de que em briga de marido e mulher não se mete a colher, esses casos vão continuar acontecendo. Precisamos que a sociedade inteira repense e interfira em situações de violência, porque nem sempre a mulher tem condições de passar por isso sozinha", ressalta.

Educação como ponto de partida

Com mais de 20 anos na Polícia Civil, a deputada Nadine Tagliari Farias Anflor (PSDB), uma das precursoras no comando da Delegacia de Mulher, em Porto Alegre, considera que uma solução para o problema passa fundamentalmente pela educação.

“Só uma mudança cultural irá resolver o problema, fazendo com que os homens mudem a maneira de ver a mulher como posse”. “Quando titular da Delegacia da Mulher, vi situações em que o homem dizia 'não vai ser meu, não será de mais ninguém', e muitos além de matar a companheira tentava de matar”, registrou a parlamentar.

Segundo Nadine, a medida protetiva é válida e ajuda a coibir os feminicídios. Das dez mortes, uma tinha a medida protetiva, conforme a deputada. “Sou um favor da Lei Maria da Penha, é uma ótima iniciativa. Ela funciona, mas só isso não basta, precisa de um sistema integrado e não só na Segurança Pública, mas em hospitais e outros locais”, comenta. “Em geral, a medida provisória vem com a violência e temos que ter um mecanismo para chegar antes da agressão”.

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