Parte do trabalho de investigação foi jogada no lixo, reconhece delegado
Judiciário divulgou informações sobre prisões temporárias e prejudicou operação da polícia gaúcha
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"Medida cautelar é em sua essência sigilosa, não há dúvida quanto a isso. O Judiciário deveria ter mais cuidado", afirmou o delegado Ferreira, que comandou as investigações. Ele destacou que não houve nenhum erro doloso, mas de procedimento das varas criminais. Apesar de haver 10 mandados de prisão expedidos, a Operação Rio Branco conseguiu localizar apenas um suspeito de integrar uma quadrilha de assalto a bancos com uso de explosivos. Segundo o delegado, o motivo da ofensiva frustrada foi a publicação da decisão judicial no banco nacional de mandados de prisão – que informa sobre a concessão de mandados. Nesse caso, no entanto, serviu para alertar advogados dos criminosos, que conseguiram fugir.
O delegado Juliano Ferreira admitiu que a frustração é grande e ressaltou o esforço da equipe para identificar os integrantes da quadrilha até chegar ao cumprimento dos mandados. Ferreira disse que muitos juízes lavam as mãos para a criminalidade, "o que não poderia ocorrer, pois o Judiciário é a garantia da efetividade das investigações". O delegado salientou a importância do banco nacional de mandados, que ajuda na busca de informações de criminosos de outros estados, por exemplo. Por outro lado, o delegado afirmou que é necessário bom senso para determinar quais dados podem se tornar públicos. "Os criminosos continuam em circulação e certamente vão seguir praticando ataques a bancos", afirmou.
Entre as gravações obtidas pela polícia está uma conversa entre uma advogada e cliente, em que a defensora informa sobre o cumprimento dos mandados e passa orientações para que o suspeito não seja preso. Para o delegado, o ato não é ilícito, mas uma postura possivelmente antiética.
As investigações policiais identificaram 38 integrantes da quadrilha que usa explosivos nos ataques a bancos e costuma fazer reféns. A Justiça, porém, indeferiu os pedidos de mandado. Assim, o delegado decidiu dividir o grupo em partes, solicitando a prisão dos 10 principais componentes. Apenas um dos mandados foi cumprido, em Canoas. A outra detenção ocorreu por flagrante de posse de maconha, no bairro Rubem Berta, na zona Norte de Porto Alegre, mas o suspeito também seria integrante da quadrilha investigada.
Judiciário cumpriu a legislação, afirma desembargador
Questionado sobre a publicação da decisão judicial no banco de mandados do CNJ, o presidente do Conselho de Comunicação Social do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, desembargador Túlio Martins, afirmou que a medida está definida em lei. Conforme ele, o sigilo é a exceção, por isso tem que ser solicitado e justificado. "Concordo que realmente é uma pena que tenha se perdido a investigação, agora não vejo, pelos dados que temos até o momento, nenhuma falha. Houve o cumprimento da lei. Fazer o quê? A lei do País é esta", lembrou.
O magistrado admitiu que a divulgação poderia ter sido realizada de outra maneira, mas não soube precisar o que motivou a decisão nesse caso. O desembargador contou que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) irá averiguar o que ocorreu e, caso seja verificada alguma falha no trabalho do Judiciário de acordo com o que estabelece a lei, os responsáveis serão penalizados.
O desembargador disse que compreende a perplexidade da população e a indignação dos policiais envolvidos, mas ressaltou que o Judiciário apenas cumpre o que determina a legislação. Dessa forma, ele acredita que seja necessário dialogar com os representantes e ver quais medidas podem ser adotadas, como alteração das leis.
O representante da Justiça gaúcha destacou que é um problema de todos, já que os cidadãos são responsáveis por escolher os deputados, senadores e presidentes, que formulam e aprovam leis. "Temos situações em que é muito difícil se administrar a Justiça da maneira que a população espera, com os instrumentos que essa mesma população dá ao Judiciário", enfatizou
O desembargador também afirmou que é preciso melhorar o diálogo entre juízes, promotores e delegados, a fim de evitar que situações como essa se repitam.