“Tentaram nos quebrar, não conseguiram e nem vão conseguir, pois a gente se inspira no povo palestino.” Com o espírito intacto e sensação de dever cumprido que Gabi Tolotti, a gaúcha que acompanhou a flotilha global humanitária Sumud, que buscava quebrar o cerco israelense e levar alimentos à Faixa de Gaza, retornou a Porto Alegre.
Ela estava na terceira maior das 50 embarcações com 497 pessoas de 44 países que partiu de Barcelona (ESP) em 31 de agosto rumo a um dos lugares mais perigosos do mundo atualmente. Dados oficiais apontam mais de 67 mil mortos desde que o conflito Israel-Palestina se intensificou em 7 de outubro de 2023, quando houve atentado do grupo Hamas, mas estimativas apontam que esse número pode se multiplicar.
No Aeroporto Salgado Filho, Gabrielle, que é presidente do PSol-RS e militante pró-Palestina, reencontrou, nesta quinta-feira, família e amigos – todos emocionados. Após seu barco ser interceptado pelo IDF, o Exército de Israel, ela havia ficado incomunicável.
“Roubaram tudo, isso (roupas em cores cinzas) é o que eu fiquei. Roubaram a camiseta do Movimento Esquerda Socialista (MES), meus óculos, meus brincos, então a gente não tinha telefone para saber tudo isso. É muito bom estar em casa, não foi fácil, mas eles não nos quebraram. Se tiver uma nova flotilha, pode ter certeza que eu vou estar lá”, afirmou, em sua primeira manifestação novamente em solo gaúcho.
Ela acredita que a flotilha global Sumud cumpriu seu propósito, que não era apenas levar suprimentos aos palestinos, mas atrair atenção internacional ao conflito. “O sucesso da missão ia depender do apoio que ela ia conseguir fora dos barcos, não dependeria só dos barcos. Obviamente que era uma flotilha com 500 pessoas, 44 barcos e isso teve uma mudança qualitativa na história das flotilhas, que acontecem desde 2008. Mas a gente sabia que não teria tanto efeito se o apoio externo não fosse muito grande”, declarou.
“Nossa primeira missão era chegar a Gaza e abrir um corredor humanitário, mas, mais do que isso, levar os olhos do mundo a Gaza”, definiu Gabi Tolotti.
Apesar dos alimentos não terem encontrado seu destino, a ação do grupo ocupou as forças israelenses por cerca de 12 horas e permitiu que a população de Gaza tivesse acesso ao mar: “Por conta de todo o aparato, eu acho que 3 mil soldados estavam envolvidos nisso, a população de Gaza conseguiu pescar naquele dia e eles pescaram muitos peixes. É simbólico. A flotilha não precisa existir, não precisa levar alimentos para Gaza. Se eles não tiverem custódia militar, eles têm os seus alimentos, eles pescam, eles trabalham, eles se organizam. Eles só precisam da nossa ajuda porque um estado sionista está lá matando eles todos os dias”.
Sua embarcação foi interceptada em águas internacionais e ela relatou a ação ostensiva na hora da prisão e já em detenção em uma cadeia próxima a Gaza. “Falaram que a gente foi interceptado com água. Não, a gente foi interceptado com metralhadora e laser na testa. Isso que a gente já estava sentado ali porque era uma missão humanitária e não violenta. Nossa cela tinha quatro mulheres menstruadas e estavam dando um absorvente por dia. Não deixavam nossos advogados entrar. Todas as violações de direitos humanos que existem, jurídicas, privação de sono, de alimentação, cachorro dentro da cela, metralhadora, todas essas coisas, mas estamos aqui”, relatou a militante.
Gabi Tolotti ainda comentou o tratado para o cessar-fogo, anunciado pelo presidente dos Estados Unidos Donald Trump como um primeiro estágio de um acordo de paz entre Israel e a célula terrorista Hamas.
“É óbvio que não é um acordo de libertação da Palestina, de retomada das terras, de todos os direitos, mas é um acordo de cessar fogo. Principalmente porque se fosse pelo (primeiro-ministro israelense Benjamin) Netanyahu, eles teriam matado toda a população de Gaza, não tenho nenhuma dúvida disso. O cessar fogo é importante por isso, porque eles não conseguiram. Gaza respira. Gaza vive e resiste”, declarou.