Veto aos coletivos gera reação após minirreforma na Câmara dos Deputados

Veto aos coletivos gera reação após minirreforma na Câmara dos Deputados

Emenda é rechaçada pelo único mandato coletivo ativo no RS, que prevê possibilidade de judicialização caso haja aprovação no Senado

Felipe Nabinger

Câmara votou o texto-base na noite de quarta-feira

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Uma das mudanças da minirreforma eleitoral que foi aprovada na Câmara dos Deputados, a proibição de candidaturas coletivas, já provoca reações no campo político, com possibilidade de judicialização em caso de implementação. No Rio Grande do Sul, o único mandato coletivo ocupando cadeira é o que tem como representante o vereador de Porto Alegre Giovani Culau (PCdoB), que vê a necessidade de uma “grande articulação desses mandatos coletivos” espalhados pelo país para barrar no Senado a sua vedação. “Se necessário fazer uma contestação judicial. Afinal, entendo que ninguém pode impedir esse nosso objetivo de compartilhar a representação política e a tomada de decisão nos nossos mandatos.”

O texto-base da minirreforma buscava regulamentar as candidaturas coletivas. No entanto, uma emenda do deputado federal gaúcho Bibo Nunes (PL) no sentido oposto foi aprovada. Bibo afirmou que as candidaturas coletivas podem levar ao estelionato. “Como um candidato recebe votos de quem votou em outro? É uma enganação”, disse na defesa da emenda. “Não me surpreende que essa emenda seja um retrocesso proposto pela extrema-direita. Porque justamente tem o objetivo de combater o êxito eleitoral dessas candidaturas e o êxito da atuação parlamentar desses mandatos coletivos”, contrapõe Culau. 

Em 2020, houve mais de 300 pedidos de registro de candidaturas coletivas nas eleições municipais no país inteiro, número quatro vezes superior ao da eleição anterior, em 2016. Destes 24 foram eleitos para Câmaras de Vereadores, sendo 22 ligados a partidos à esquerda, campo ideológico que concentra a maior parte dos registros. Além disso, um era de partido de centro e uma candidatura de direita. 

O próprio PL, partido de Bibo, teve nas últimas eleições municipais três candidaturas coletivas: uma em Cabo de Santo Agostinho (PE), uma em Goiana (PE) e outra em Praia Grande (SP). Nenhuma delas foi eleita, mas figurou entre os suplentes. A situação também ocorreu com Culau, que concorreu sob o nome Giovani e Movimento Coletivo, em Porto Alegre. Como suplente, o coletivo assumiu a vaga deixada por Daiana Santos (PCdoB), eleita deputada federal em 2022, ano em que mais de 200 coletivos tentaram cadeiras no parlamento estadual ou federal pelo país. Somente dois foram eleitos, ambos para o cargo de deputado estadual pelo PSol, em São Paulo.

“A construção de candidaturas e mandatos coletivos é uma inovação produzido em especial pelos segmentos da sociedade historicamente excluídos dos espaços de poder e decisão. São as mulheres, negros e negras, população LGBTQIA+, significando essa experiência de empoderamento, de ocupação do espaço público e da política, em uma experiência que também visa compartilhar a representação e a tomada de decisão nesses espaços, também enfrentando essa lógica consolidada, estabelecida na política, que é altamente personalista e individualista, muitas vezes pouco pautadas no debate e no projeto coletivo”, defende Culau. 

 

Natureza simbólica, avalia cientista político

Professor do Programa de Pós-graduação (PPG) em Ciência Política da Ufrgs, Rodrigo Stumpf González não acredita em um grande impacto, no entanto, caso a regra seja aprovada pelo Senado e depois sancionada. Isso porque, segundo ele, o “eleitor brasileiro vota por identificação pessoal”.

“Candidaturas ditas coletivas são uma tentativa de inovação com baixo apelo popular, circunscrita a alguns grupos políticos. Do ponto de vista da representação dos partidos, não deve ter grande impacto no resultado das eleições. É mais de natureza simbólica.”

Atualmente, as candidaturas coletivas respeitam as regras que constam em resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo a última de 2021. Apesar de minirreformas anteriores, há uma lacuna sobre o tema, que o texto-base buscava preencher. Somente o cabeça de uma chapa coletiva eleita pode discursar no Parlamento, participar de colégios de líderes e votar nas sessões, com base nas decisões tomadas junto ao coparlamentares. 
A emenda que veda registro das candidaturas coletivas foi vista como uma “resposta” do Parlamento à Justiça Eleitoral. “É dizer ao Tribunal Superior Eleitoral: chega de se intrometer no que não é o seu dever, o dever de legislar é da Câmara dos Deputados”, declarou em sessão o deputado federal gaúcho Marcel Van Hattem (Novo).

González frisa não ser uma novidade a reação do Congresso às decisões do TSE. “Sempre que o Tribunal inova em uma eleição com novas restrições ou regras que desagradam os parlamentares, o Congresso acaba aprovando um projeto para regular de forma diferente. Por isso temos vivido de ‘minirreformas’ desde 1988 e não ocorreram duas eleições exatamente com as mesmas regras em todo o período.” 

Não há previsão para que o Senado coloque em pauta a minirreforma. Para que as regras entrem em vigência em 2024, é preciso que sejam aprovadas e sancionadas até o dia 6 de outubro, um ano antes da eleição.


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