Dólar abaixo de R$ 5 preocupa arrozeiros

Dólar abaixo de R$ 5 preocupa arrozeiros

Desvalorização da moeda impacta receita de exportadores e contribui para pressionar ainda mais os preços do cereal no mercado interno

Patrícia Feiten

Para junho, a Federarroz projeta que os embarques do cereal fiquem em torno de 100 mil toneladas.

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As oscilações do dólar vêm deixando os produtores de arroz apreensivos. Acentuada nas últimas semanas, a desvalorização da moeda norte-americana impacta a receita das exportações do cereal na conversão para real, reduzindo as margens de rentabilidade dos agricultores, que compraram os insumos usados no plantio do cereal com o dólar em alta. A trajetória de queda da divisa também se reflete negativamente no mercado interno, já que os preços de exportação da commodity servem de baliza para as cotações praticadas em nível local.

Na segunda-feira (19), o dólar fechou a R$ 4,77, seu menor patamar em mais de um ano. Nesta terça, a moeda mostrou uma pequena reação e encerrou o dia a R$ R$ 4,79, mas ainda acumula perdas de 5,48% no mês e 9,15% no ano. A saca de 50 quilos de arroz, que iniciou o ano cotada acima de R$ 90, era negociada a R$ 81,70 no dia 19, de acordo com o indicador Cepea/IRGA-RS. Já os custos de produção da saca são estimados pelo setor entre R$ 90 e R$ 95.

As exportações gaúchas do cereal seguem firmes. De janeiro a maio, os embarques somaram 554 mil toneladas, volume 34% superior ao do mesmo período do ano passado. Isso representou uma receita de 224,7 milhões de dólares, um aumento de 44% na mesma base de comparação, de acordo com dados da Federação da Agricultura do Estado (Farsul). Se considerado apenas o mês passado, as vendas geraram 67,6 milhões de dólares, um avanço de 535% frente a maio de 2022.

Segundo o presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), esse salto em termos financeiros reflete negócios fechados com base em cotações do dólar ainda no patamar de R$ 5. “O que está acontecendo no mercado interno é um reflexo da queda do valor nominal das exportações no porto (de Rio Grande). É uma queda muito grande no câmbio, que está trazendo uma referência menor de preço ao mercado interno, que já pagou R$ 92, R$ 93 e hoje está em R$ 81, em média, no Rio Grande do Sul”, diz o presidente da entidade, Alexandre Velho.

Essa retração do mercado arrozeiro gerada pelo declínio do dólar, observa o dirigente, é reforçada pela queda das cotações da soja. A saca de 60 quilos do grão era negociada acima de R$ 180 em janeiro e hoje está em torno de R$ 130. “Metade dos produtores que plantam arroz plantam soja também. O produtor preferiu vender arroz do que vender soja, então houve também uma oferta muito grande de arroz no mercado”, afirma Velho.

Para junho, a Federarroz projeta que os embarques do cereal fiquem em torno de 100 mil toneladas. A estimativa para o ano é de um volume de 1,5 milhão de toneladas, em linhas com as projeções de exportação da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Mas esse desempenho, segundo o presidente da entidade, dependerá do comportamento do câmbio até setembro, quando a safra dos Estados Unidos começa a entrar no mercado. “Ainda estamos com um volume grande de demanda, porque não temos hoje a concorrência americana e o preço internacional do arroz continua em alta. Isso que explica que a gente continue exportando mesmo com a queda do câmbio”, destaca Velho.

Concorrência norte-americana

O economista Evandro Oliveira, da consultoria Safras&Mercado, também vê com preocupação o ingresso da produção norte-americana no mercado internacional. A área cultivada com arroz nos Estados Unidos passou de 850 mil hectares para mais de um milhão de hectares no ciclo atual, e o desempenho das lavouras aponta para uma supersafra do cereal. “Isso vai inundar o mercado e deve pressionar os preços de exportação norte-americanos. Vai deixar eles muito mais competitivos, (o país) vai poder ‘roubar’ um pouco do mercado do México, do Caribe, alguns mercados da América do Sul, como a Venezuela”, avalia Oliveira. Atualmente, o México e a Costa Rica são os principais destinos do arroz brasileiro.

Para Oliveira, a cotação atual do dólar está muito distante do patamar ideal para alavancar os negócios no mercado externo. “Na temporada passada, as tradings (exportadoras) costumavam travar o dólar a R$ 5,20, R$ 5,30. Apesar desse câmbio, a gente vem registrando bons volumes de exportação”, afirma. Segundo o analista, no início da safra gaúcha, a expectativa do mercado era a de uma reação mais firme dos preços do arroz em relação às temporadas anteriores, o que não se concretizou. “A gente está tendo uma concentração de oferta no final da safra e um ingresso de produto do Mercosul. Toda essa pressão de oferta, justamente neste momento em que ainda há algumas áreas pontuais sendo colhidas, vem contribuindo (para achatar os preços)”, diz o economista.


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