“Vamos importar arroz no tamanho de nossa necessidade”

“Vamos importar arroz no tamanho de nossa necessidade”

Em entrevista ao Correio do Povo, o presidente da Conab, Edegar Pretto, explica como será realizada a aquisição do cereal de países, preferencialmente, do Mercosul

Poti Silveira Campos

Presidente da Conab, Edegar Pretto, participou de distribuição de alimentos realizada pela companhia em Porto Alegre

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Anunciada pelo ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, durante reunião com a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), a importação de até um milhão de toneladas de arroz pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) causou estranhamento entre dirigentes da entidade gaúcha, da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz) e produtores gaúchos. A medida foi avaliada como desnecessária e, eventualmente, prejudicial ao setor no Estado. Nesta quarta-feira, em entrevista ao Correio Povo, o presidente da Conab, Edegar Pretto, detalhou como deverá ocorrer a operação e seus objetivos. A entrevista, por telefone, ocorreu momentos antes de Edegar Pretto participar de distribuição de alimentos entregues pela companhia a cozinhas que preparam refeições para famílias atingidas pelas enchentes em Porto Alegre.

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A Conab deu início à operação de importação de arroz?

Estamos trabalhando na elaboração da medida provisória. Esta medida provisória vai dar autorização para que a Conab possa importar um milhão de toneladas de arroz. Obviamente, vai ser de uma vez só. Vamos fazer os leilões de aquisição escalonados. A intenção é, neste primeiro momento, que a gente faça para 200 mil toneladas. Vamos observar como será o comportamento da questão interna. Esta ação é para evitar especulação, para evitar que alguém queira se aproveitar deste momento triste, dramático, que o Rio Grande do Sul está vivendo. Temos o cuidado de não fazermos uma competição com a produção local e nem nacional.

Para onde será destinado o arroz importado?

O produto será destinado às regiões Norte, Nordeste e Sudeste. Não virá para o Rio Grande do Sul, nem para a Região Sul ou para o Centro-Oeste. Vamos colocar, especificamente, para pequenos e micro varejistas, especialmente os que compram dos atacarejos para abastecer o seu comércio, para evitarmos que chegue com preço muito alto ao consumidor.

A importação poderá ser inferior a um milhão de toneladas?

A medida provisória nos dará autorização para a importação, mas o volume da aquisição é o governo que vai decidir conforme a necessidade.

O senhor saberia me dizer quanto o Brasil importou de arroz no ano passado?

Não tenho esses números agora. A previsão que a Conab faz é de produzirmos pouco mais de 10 milhões de toneladas de arroz. Setenta por cento está concentrado no Rio Grande do Sul, pouco mais de sete milhões de toneladas. Importamos cerca de um 1,5 milhão de toneladas. Exportamos uma quantidade semelhante. Estamos muito equilibrados na balança entre o que a gente produz e consome, entre o que importamos e exportamos.

A grande questão é que tem uma sensibilidade na produção do arroz com a concentração no Rio Grande do Sul. Nos últimos anos, o Estado, infelizmente, passa por essa instabilidade climática.

A estimativa que a Conab faz é que perdemos 15% da safra que estava no campo, que está embaixo d’água, mais uma quantidade da produção que já estava colhida e que está nos armazéns de algumas regiões afetadas pelas águas. Não conseguimos dimensionar o que pode ter sido perdido. Então, não podemos arriscar uma especulação.

O temor do governo é faltar arroz ou não haver condições de escoar o arroz desde o Rio Grande do Sul?

A nossa precaução é exatamente a questão da locomoção desse arroz. Muitas regiões produtoras, onde está estocado o arroz, está sem conseguir trafegabilidade. Então, como vamos garantir o abastecimento das regiões mais distantes, o Norte e o Nordeste, por exemplo? É muito importante que o governo, de alguma forma, dê essa tranqüilidade. Os pequenos e micro varejistas não trabalham com grandes estoques. Muito possivelmente, havendo desabastecimento por dificuldades de transporte, pode haver alta nos preços. A medida vai nessa direção. Não é, de forma alguma, para competir com a produção local. Os nossos produtores [os produtores gaúchos] também precisam de proteção nessa hora. Vamos importar arroz no tamanho de nossa necessidade. Tem todo um cuidado, uma sensibilidade que o governo está tendo nesta operação.

O Brasil importa 1,5 milhão de toneladas. Vamos, então, importar mais um milhão?

O volume de importação que me referi é o que acontece normalmente, sem a intervenção ou participação do governo federal. É a compra que particulares fazem. O que é excepcional é a importação que vamos fazer pela Conab, por decisão do governo federal.

Em encontro entre Farsul e ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, surgiu a preocupação de que a importação possa resultar em queda de preço do arroz gaúcho. Como evitar que isso ocorra?

Trabalhando de uma forma muito organizada. Observando todos esses detalhes e essas sensibilidades. Um milhão de toneladas de arroz não será comprado de pronto. Não vamos encher o mercado com arroz que vem de fora, justamente para não acontecer um prejuízo para os produtores. É um equilíbrio que precisamos ter. Infelizmente, trabalhamos com a possibilidade de haver especulação, de alguém que possa segurar o produto para aumentar o preço. Nós não podemos deixar a população mais vulnerável numa situação como essa.

Queremos garantir uma estabilidade também, evitar que o preço suba demasiadamente para os consumidores. Por isso que vamos direcionar este arroz para a periferia das grandes cidades, abastecer os pequenos supermercados que normalmente tem de comprar do grande atacadista.

Quais são os países preferenciais para a importação?

Na medida provisória, vamos colocar como prioridade a compra de países do Mercosul. O produto do Mercosul tem semelhança com o produto local. Mas também trabalhamos com a possibilidade de deixar mais abrangente para ter uma segurança maior.

Além do arroz, vamos importar outros produtos?

Por ora, trabalhamos com a possibilidade de importação do arroz. O presidente [Luiz Inácio Lula da Silva] também se referiu na questão do feijão, mas o feijão, ao contrário do arroz, baixou o preço para o produtor. Nossa expectativa é que essa baixa de preço para o produtor se reverta ao consumidor, o que ainda não aconteceu. Temos feijão no nosso mercado interno. A Conab trabalha com medidas a serem anunciadas no Plano Safra, junto com o Ministério da Agricultura, com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar.

Trabalhamos a possibilidade de mapear, especialmente, os produtos que são para nosso consumo interno, o arroz, o feijão, o próprio milho primeira safra, trigo, farinha de mandioca, enfim, produtos que são base alimentar da população, e trabalharmos com preço mínimo compensador e também a possibilidade de fazermos contrato de opção de venda.

Com isso, dar ao produtor garantias, para aqueles que optarem por produzir alimentos, que eles terão renda e que será um bom negócio para quem fizer essa opção. Obviamente, garantimos isso com políticas públicas. Essa seria uma medida para aumentarmos a oferta de alimentos para nosso consumo interno. Essa é uma ação para a próxima safra, que possivelmente será anunciada no Plano Safra, que acontece em junho.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895