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O labirinto de Gaza: entre a trégua frágil e a esperança distante

Por rabino Pablo Schejtman, da União Israelita Porto-Alegrense

Outubro de 2025. Dois anos após o massacre de 7 de outubro, Israel e Hamas alcançam um cessar-fogo. Como rabino em Porto Alegre, acompanho com alívio contido – nas ruas de Gaza e Tel Aviv respira-se uma pausa necessária, mas ninguém se ilude de que seja paz definitiva. Este acordo já estava na mesa havia um ano; o Hamas escolheu prolongar a agonia para melhorar sua posição negociadora.

Israel enfrentou um dilema brutal: resgatar 200 reféns sem abrir mão de neutralizar o Hamas. A resposta foi pressão militar calibrada. Quando encurralado, o grupo desdobrou uma campanha sobre a fome em Gaza, desviando a pressão internacional. Somente sob ameaça de ocupação total cedeu, mas ainda vê o armistício como uma chance de reorganização.

Mediadores como Qatar, Egito e EUA agiram por interesses próprios. Trump buscava construir sua imagem de pacificador; os países árabes precisavam acalmar suas opiniões públicas. Esta trégua nasceu mais da conveniência que da convicção.

Netanyahu, que deveria ter renunciado após a falha do 7 de outubro, encontrou no conflito um impasse político conveniente. Sua coalizão ultradireitista caminha sobre corda bamba – Smotrich e Ben-Gvir consideram traição qualquer concessão. De fato, a sociedade virou definitivamente à direita.

Mas, enquanto o mundo focava Gaza, a Cisjordânia ardia em silêncio. Com 500.000 israelenses em assentamentos e a Autoridade Palestina desgastada, a solução de dois Estados tornou-se miragem distante. De fato, lá muitos jovens palestinos já veem o Hamas como referência de resistência.

A crise humanitária em Gaza é real, mas o Hamas a transformou em arma estratégica, controlando imagens e usando o sofrimento como munição midiática. Chamar a operação de “genocídio” é uma distorção grotesca – com o poder militar israelense, estaríamos falando de centenas de milhares de mortos, não dezenas.

Me defino como “pessoptimista”: cético no imediato, otimista no horizonte. Este armistício é precário, mas a realidade demográfica é inexorável: árabes e judeus são numericamente equivalentes entre o Jordão e o Mediterrâneo. Nenhum povo desaparecerá, o que eventualmente forçará alguma forma de acomodação política.

E a reconciliação não significará esquecer. Palestinos carregarão as feridas de Gaza; nós, judeus, o horror do 7 de outubro. A questão é transformar essas memórias em vacinas morais, não em armas. Israelenses devem dormir sem temer massacres; palestinos merecem direitos reconhecidos.

Hoje as bombas se calaram – crianças em Gaza dormem sem sobressaltos, famílias israelenses abraçam libertados. É apenas um intervalo. O que faremos com este respiro determinará se encontraremos a saída deste labirinto ou continuaremos condenados ao deserto do conflito.

Ken yehi ratzón – Assim seja Sua Vontade.