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Respostas tímidas à crise de saúde mental

Por CARLOS ASSIS, Editor do Anuário Saúde Mental nas Empresas

Vivemos uma crise de saúde mental que se reflete de forma direta no mundo do trabalho. E, ao que tudo indica, os esforços do Poder Público e das empresas para frear a crise – com poucas exceções – têm sido tímidos.

O Rio Grande do Sul registrou, em 2024, 39 mil afastamentos do trabalho por questões de saúde mental. O número representa aumento de 52,7% em relação a 2023, quando foram concedidas 25,5 mil licenças médicas a trabalhadores. Em todo o Brasil, questões de saúde mental afastaram cerca de 500 mil pessoas de suas atividades laborais em 2024.

Os dados são do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho e resultam em perda de produtividade, aumento de custos para as empresas e para o sistema de saúde.

Apesar da gravidade, a resposta institucional no Brasil tem sido insuficiente. A Lei 14.831/2024, que criou o Certificado de Empresa Promotora da Saúde Mental, até hoje não foi regulamentada e segue sem efeito prático. Já a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), atualizada para incluir riscos psicossociais como assédio, estresse e sobrecarga na política de saúde e segurança do trabalho, teve sua entrada em vigor adiada para 2026.

Nesse contexto, os dados do Anuário Saúde Mental nas Empresas 2025, divulgado no Dia Mundial da Saúde Mental (10 de outubro), ajudam a dimensionar a distância entre discurso e prática. O índice geral de promoção de bem-estar pelas grandes companhias no Brasil passou de 5,05 pontos em 2024 para 8,19 neste ano. No entanto, em um ranking cuja pontuação máxima é 16, o resultado mostra que estamos aquém do ideal e revela contrastes entre setores e companhias. O crescimento foi puxado por um pequeno grupo de empresas que, efetivamente, transformam discurso em ações concretas.

Ainda existe uma cultura empresarial que enxerga incompatibilidade entre aumentar a lucratividade e promover o bem-estar, mas é possível conjugar o bem-estar dos colaboradores com o retorno para os acionistas. Estudos demonstram o impacto positivo dos investimentos em saúde mental. Análises da McKinsey apontam retorno sobre investimento de até quatro vezes para cada dólar investido, o que é ratificado pela National Safety Council (EUA).

Mas, se investir em saúde mental vale a pena, devemos entender por que ainda predomina a hesitação em ampliar ações de promoção do bem-estar. A escuta verdadeira dos colaboradores exige coragem das lideranças, que passam a lidar com a subjetividade em um mundo guiado pela objetividade. Quando se abre esse espaço, não basta coletar informações: é necessário agir a partir delas. A crise é evidente, mas também uma oportunidade. O risco é perdermos essa chance, deixando a saúde mental confinada a índices frios, leis paradas e normas adiadas.