A potência da amizade feminina e como ela impulsiona a vida das mulheres

A potência da amizade feminina e como ela impulsiona a vida das mulheres

Mulheres de diferentes idades refletem sobre a importância da amizade em todas as fases da vida

Brenda da Rosa

Segundo estudos, a amizade feminina é benéfica para a saúde e para o bem-estar das mulheres

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As amizades são relações importantes para o desenvolvimento psíquico e social. Para a Organização das Nações Unidas (ONU), a união promovida por essas conexões é tão necessária que passou a ser celebrada oficialmente no mundo todo em 20 de julho, o Dia Internacional da Amizade.

Segundo a antropóloga Aline de Moura Rodrigues, as amizades são as primeiras construções de vínculo afetivo para além do núcleo familiar. “O espaço da amizade nos possibilita, no decorrer da nossa vida, que nos reconheçamos no outro, que amemos esse outro, apesar das diferenças”, explica.

Para as mulheres, este espaço diz respeito aos lugares onde sentem que podem receber apoio, amor e segurança. Nos últimos anos, escritoras, dramaturgas e teóricas feministas vêm escrevendo sobre a amizade como parte fundamental na vida.

A autora norte-americana bell hooks, falecida em 2021, discorre sobre na obra “Tudo sobre amor” (1999). Em um trecho marcante, ela aponta: “Amizades amorosas nos dão espaço para experimentarmos a alegria da comunidade num relacionamento em que aprendemos a processar todos os nossos problemas, a lidar com diferenças e conflitos enquanto nos mantemos vinculados.”

Um estudo da Universidade da Califórnia (UCLA) mostrou que ter amizades femininas ajuda a promover a saúde e o bem-estar das mulheres e inclusive colabora para o sucesso profissional.

A antropóloga argumenta que a conexão com outras mulheres desafia a socialização e a questão da rivalidade. “Uma mulher desenvolver e manter amizade com outra confronta essas expectativas de rivalidade do sistema patriarcal. Socialmente, essas amizades femininas podem ser entendidas como ‘políticas de vida’, de sobrevivência, e nos dizem que é possível, sim, se manter unida apesar da figura do patriarca”, diz Aline.

Infância, juventude e meia idade

A psicologia compreende que as referências aprendidas na primeira infância acompanham as pessoas até a vida adulta. Para a psicóloga Gabrielle Reichelt, na infância, esse tipo de conexão diz respeito ao processo de identidade de cada indivíduo.

“As nossas amizades na infância são um portal para a gente conseguir se reconhecer, se identificar e ver as coisas nas quais conseguimos nos enxergar ou não. Se eu tenho boas relações na infância, eu tenho uma noção mais amigável das coisas, passo a me abrir mais e vejo um futuro mais positivo no mundo.”

A pré-adolescente Vitória Souza, 14 anos, tem uma amizade de infância para chamar de sua. Ela e a melhor amiga Alanis, 13, se conheceram aos três anos de idade e seguem juntas desde então. “Somos tão unidas porque nos conhecemos desde pequena, nos vimos crescer, nos vimos enfrentar coisas e enfrentar o horror que é a adolescência e isso conecta bastante a gente”, conta.

Apesar da pouca idade, Vitória fala com carinho e determinação das memórias que coleciona com Alanis. “O que eu mais gosto de fazer com ela é jogar Roblox ou Minecraft, gosto de fazer chamadas de áudio e sair quando nossos pais deixam. Eu admiro a confiança dela e o fato de ela não desistir tão facilmente das coisas. Ela insiste, é corajosa, é engraçada e isso é o que eu mais gosto nela.”

Vitória Souza (direita) e a melhor amiga Alanis (esquerda) | Foto: Arquivo pessoal / Reprodução / CP

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“Irmã de alma”

Na juventude, ter amigas por perto também se torna fundamental para a jornada dos “vinte e poucos”. Para a estudante Amanda Peixoto, 22, o vínculo com a melhor amiga Maisa é importante justamente pela companhia da adolescência que seguiu para o início da vida adulta.

“A gente gosta de brincar que é irmã de alma, mas é que a Maisa entrou num momento da minha vida onde eu tava me descobrindo enquanto mulher negra, quando eu tava me descobrindo enquanto mulher bissexual e ela acompanhou toda essa mudança e sempre foi muito apoiadora de tudo isso”, relembra.

Amanda (direita) e Maisa (esquerda) | Foto: Arquivo pessoal / Reprodução / CP

Mais de 40 anos de parceria

Ao passo que se descobrir adulta é uma tarefa difícil, mas que se torna fácil pela companhia de uma amiga, ser uma mulher mais velha, com filhos e outra bagagem de vida, é uma jornada parecida. Para Valesca Spindler, 55, a amizade longínqua com Andrea é de parceria e cumplicidade, por isso é especial e dura tanto: mais de 40 anos.

Mesmo com muito tempo de amizade, ela diz que a manutenção é frequente, seja com conversas ou tempo de qualidade juntas. “Temos uma tradição que é: todo domingo de manhã, não importa onde a gente estiver, acordamos de manhã e nos ligamos por vídeo e de pijama. Temos que estar de pijama porque isso é um símbolo de intimidade. Aí conversamos um pouco e depois tocamos o dia”, revela.

Valesca (esquerda) e Andrea (direita) | Foto: Arquivo pessoal / Reprodução / CP

Rede de apoio e saúde mental

No dia a dia, existem situações em que a procura por conforto é maior entre pessoas do sexo feminino. Um estudo da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) sugere que mulheres reagem diferente em situações de estresse, e tendem a buscar umas às outras como forma de encontrar um semelhante que sabem que podem contar.

Da mesma forma acontece em cenários de procura por suporte e saúde mental. A psicóloga Gabrielle Reichelt argumenta que é benéfico para mulheres que elas tenham uma rede de apoio feminina.

“Quanto mais amigas eu tenho, que eu vejo que são diferentes de mim e que fazem coisas diferentes e são felizes fazendo, mais eu começo a imaginar coisas diferentes pra mim mesma. É um processo de empoderamento muito grande, tanto com relacionamentos românticos quanto com todas as outras coisas que nos foram impostas na socialização”, pontua.

Para a especialista, a amizade feminina é fortalecida pela representatividade e faz com que as mulheres criem noção da própria identidade. “Quando as mulheres se veem nas suas amigas, tudo se torna melhor, mais leve. Se eu me vejo numa semelhante, eu sei que tenho apoio ali e que as coisas se tornam menos difíceis com a presença da minha amiga”, finaliza.

*Sob supervisão de Camila Souza


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