Marcas de moda são mais transparentes sobre impactos ambientais do que sobre direitos humanos

Marcas de moda são mais transparentes sobre impactos ambientais do que sobre direitos humanos

Índice de transparência do mercado fashion analisou a divulgação de informações sociais e ambientais das principais marcas nacionais

Giovanna Reis*
Foco do Fashion Revolution e do ITM Brasil é promover a justiça social e climática no mercado da moda

Foco do Fashion Revolution e do ITM Brasil é promover a justiça social e climática no mercado da moda

publicidade

Realizado desde 2018 pelo Instituto Fashion Revolution, o Índice de Transparência da Moda Brasil (ITMB) produz anualmente um relatório analisando dados de grandes marcas do mercado nacional. A última edição, divulgada neste mês, analisou 60 marcas e ranqueou a divulgação pública de informações sociais e ambientais dessas empresas.

Os resultados apontam que o mercado nacional é mais transparente sobre indicadores de ambientais do que sociais, e a situação se agrava em relação ao debate de gênero e racial/étnico. Em seis anos de pesquisa, nenhuma marca forneceu dados sobre disparidade salarial entre funcionários de diferentes raças.

Entre 2018 e 2023, houve um avanço na transparência na moda: a pontuação média das marcas subiu de 17% para 22%. Os indicadores da pesquisa são divididos em 5 categorias: políticas e compromissos, governança, rastreabilidade, conhecer, comunicar e resolver, e outros tópicos em destaque, envolvendo igualdade de gênero e racial e condições sustentáveis na produção e descarte.

Os resultados mostram que 68% das marcas reconhecem que o índice impulsionou suas práticas de sustentabilidade e transparência, enquanto 72% percebem mudanças internas como consequência da participação no projeto.

A atribuição de pontos ocorre apenas nos casos em que as informações são divulgadas publicamente no site da empresa, a partir das seguintes fontes:

• relatórios anuais ou em relatórios anuais de sustentabilidade/RSC
• outros documentos que estejam disponíveis para o público e que possam ser baixados gratuitamente
• sites de terceiros, mas apenas quando estiverem com link direto a partir do site da própria marca

Neste ano, o ITMB apresenta pela primeira vez uma edição comparativa, que oferece um balanço geral dos últimos anos da pesquisa, permitindo a compreensão de desafios persistentes e uma amplitude da perspectiva ampla sobre progressos, retrocessos e estagnações da indústria.

Para a coordenadora do projeto no país, Isabella Luglio, "a edição comparativa do ITMB revela que, embora tenhamos que celebrar alguns avanços da transparência do setor nos últimos anos, ainda há muito a ser feito pelas marcas para enfrentar os impactos ambientais da moda e proteger os trabalhadores mais vulneráveis ao longo da cadeia de produção. A análise das divulgações feitas nos últimos anos não só destaca o que foi realizado, mas também aponta os próximos passos necessários para cobrar transparência das marcas, pressionando-as a adotar estratégias que enfrentem a crise climática e assegurem os direitos humanos no setor".

Veja Também

O Fashion Revolution é um movimento global, com edições anuais que possibilitam debates sobre consumo e produção consciente no universo fashion. Foi fundado após o desabamento do edifício Rana Plaza em Bangladesh, em 2013, que resultou na morte de 1.138 pessoas e deixou mais de 2,5 mil gravemente feridas.

O instituto criado por Carry Somers e Orsola de Castro tem como objetivo alertar sobre questões relacionadas à transparência e à ética no mercado da moda para que tragédias como essa nunca mais aconteçam. A partir de questões como "quem fez minhas roupas?", compradores pressionam marcas a considerarem práticas mais sustentáveis e justas para quem confecciona as roupas.

O Índice de Transparência da Moda surge para aprofundar o questionamento sobre as problemáticas. A seção de rastreabilidade busca por respostas concretas para identificar não apenas quem faz as roupas, mas também onde e como elas são produzidas. A análise dessa seção se dá a partir da divulgação de listas de fornecedores das marcas, instalações de processamento e fornecedores de matérias-primas, permitindo o monitoramento de riscos sociais e ambientais.

Em 2018, a primeira edição do ITM no Brasil registrou a pontuação média de apenas 12% nessa seção. Já em 2023, atingiu os 25%: 23 grandes marcas divulgaram suas listas de fornecedores diretos; 2 marcas divulgaram suas listas de fornecedores de instalações de processamento e beneficiamento; e 15 incluíram uma seleção de seus fornecedores de matérias-primas.

A transparência tende a diminuir à medida que as informações se afastam das operações diretas das marcas. O nível de fornecedores de matérias-primas é o menos divulgado em todos os anos em que a análise foi realizada.

Na seção de meio ambiente, foram comparados diversos tópicos essenciais para o entendimento do papel da moda no combate aos impactos climáticos.

Em relação à circularidade, há uma baixa divulgação da quantidade de produtos projetados para reciclagem e reaproveitamento de resíduos, apresentando um avanço de 2% para a prática de 2021 para 2023.

A pesquisa ainda aponta que marcas nacionais são, em geral, mais transparentes do que as analisadas pelo ITM Global sobre a quantidade de itens produzidos anualmente.

O foco do movimento Fashion Revolution e do ITM Brasil é promover a justiça social e climática no universo da moda. A coordenadora da pesquisa afirma a relevância do projeto, considerando que “a transparência não é a norma do setor”. “Nosso sonho é que ele não precisasse mais existir, que esse passo de mudança sistêmica já tivesse sido dado”, finaliza Isabella Luglio.

O relatório completo e todas as suas edições anteriores podem ser acessadas pelo site do Fashion Revolution.

*Sob supervisão de Camila Souza


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895