A farra do auxílio-moradia
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Quem garante a legalidade da manobra? Ele mesmo. Acabou-se.
O mais interessante dessa história de terror é que beneficiados nunca deixaram de reconhecer que se tratava de um estratagema, de uma compensação, de um aumento de salário disfarçado, sem imposto de renda. O vil mortal não tem uma barbada dessas para usar quando sente a água lhe bater no queixo. Se não cumprir suas obrigações, o judiciário trata de enquadrá-lo. A regra da magistratura é mínima: se é legal, eu quero. Se eu quero, é legal. Quanto juiz dono de casa de alto nível na cidade, na praia e na serra, recebendo auxílio-moradia, mandou despejar miseráveis de prédios públicos abandonados!? E o futuro: se o salário ficar defasado novamente, sempre é possível, voltará o auxílio-moradia com outro nome para não dar na vista ou para que não se fale de eterno retorno do mesmo?
Magistrados costumam ser campeões de racionalização. A racionalização é uma adulteração da racionalidade, um argumento que parece lógico e recepcionável não o sendo. Um sofisma. Chega a parecer infantil. Como crianças, batem pé. É correto receber auxílio-moradia quem mora em casa própria? Não, mas nosso salário está desfasado, etc. A subjetividade perpassa as práticas do judiciário. Um ministro do STF pode ficar anos sentado em cima de uma questão do interesse da sua categoria sem que nada o obrigue a mexer-se na cadeira. Não empurra com a barriga. Retém com os glúteos. A imagem não é agradável. Metáfora de mau gosto. Como o auxílio-moradia. O que a plebe pode fazer? Nada.
Sim, pode fazer piada. É só.
Há representantes das corporações togadas e adjacentes inconformados. Queriam o aumento e a manutenção do auxílio-moradia. Consideram que saíram perdendo. Feitas as contas, vão receber um pouco menos. Queriam tudo. Isso não corrompe a ideia que se deve ter de um poder da República? Em 1993, Marie-Noëlle Lienemann, ministra e depois senadora, publicou um livro intitulado “Os canibais do Estado” no qual mostrava como a elite tecnocrática francesa apropriava-se dos melhores postos e dos recursos da nação cobrindo-se de privilégios e de auxílios fantásticos.
O livro era local. O título, universal. Luís Fux mostrou ontem que, como ministro do STF, ele é um excelente representante sindical da sua categoria na suprema corte. Tem tudo para fazer uma carreira política.
Salvo que isso requer votos e alguma capacidade de falar com a plebe.