Fiz um samba
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Não me comprometo com início, meio e fio. Pois fiz um samba.
Morro do Socorro
Subi no morro, subi no morro
Fui em busca de Socorro
Subi no morro, subi no morro
Quis sentir a alma do meu povo
Nunca é tarde pra nascer de novo
Subi no morro, subi no morro
Numa roda de cachorras encontrei Ana Patrícia
Hoje sei que a vida pode ser uma delícia
Subi no morro, subi no morro
Mas nem tudo é alegria
Ninguém samba todo dia
Subi no morro, subi no morro
De lá não desço mais
Se descer eu morro
Subi no morro, subi no morro
Não sei se o pessoal do samba vai aprovar essa história de roda de cachorras. Ia colocar roda de bambas, mas achei clichê. Samba e funk não dialogam? Na minha cabeça, tudo fala. Imagino este meu sambinha cantado por Glau Barros, por Zeca Pagodinho e por Neguinho da Beija-Flor. Sou modestamente megalomaníaco. Acho que seria uma excelente trilha para uma novela de televisão passada numa comunidade, a história de um cara que deixa o asfalto e vai viver numa favela.
Todo grande sambista é poeta. Quer poesia pura? Clara Nunes fez: “Dei um aperto de saudade/No meu tamborim/Molhei o pano da cuíca/Com as minhas lágrimas/Dei meu tempo de espera/Para a marcação e cantei/A minha vida na avenida sem empolgação”. Eu me arrepio. Eu me emociono. Sei que tem grande sambista branco. Noel Rosa é a prova sambada dessa afirmação. Chico Buarque também. Mas o samba para mim é negro. Maravilhosamente negro. Como o futebol. Ainda que o futebol possa ir do samba ao tango, é negro. Foi a negritude de Pelé que o fez reinventar o futebol assim como Pablo Picasso reinventou a pintura.
Receberei mensagens assim: “Que sambinha rastaquera, tchê! Que letrinha mais medíocre”. Não me abalo. Tenho o couro duro. Na solidão da minha mente consigo cantá-lo e gosto muito. Ouço aplausos e gente pedindo bis. É o que me basta. O resto a imaginação faz. Obra-prima. Modestamente, claro.