Plataforma e ministro tucano do STF

Plataforma e ministro tucano do STF

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Para os tucanos a eleição presidencial de 2014 ainda não acabou.

O terceiro turno atende pelo nome de impeachment, cassação ou renúncia da presidente Dilma Rousseff. O seu apelido é atalho. A sua alcunha mais pejorativa é golpe. Coerentes com a expectativa de alcançar o poder antes de 2018, os tucanos pediram aos seus “pensadores” da economia, Gustavo Franco e Armínio Fraga, a definição dos principais pontos para um caso de “vitória”. A receita é quente.

Foi publicada por Ilimar Franco, na última sexta-feira, em O Globo.

Os especialistas supostamente técnicos e pretensamente nada ideológicos, pois ideologia, no entender desse pessoal, é sempre o pensamento dos outros, para salvar o Brasil da crise profunda, propõem: adoção da idade de 65 anos para a aposentadoria; rever a estabilidade no emprego no setor público; supremacia do negociado em detrimento da lei em questões trabalhistas; acabar com as vinculações obrigatórias de recursos para reduzir gastos com saúde e educação; reformar o PIS/Cofins; unificar o ICMS; desvinculação total da aposentadoria do salário mínimo; e manter fator previdenciário.

Nenhuma linha sobre taxação de grandes fortunas ou de lucros e dividendos distribuídos por pessoas jurídicas a acionistas. Perguntas ingênuas: em quanto países democráticos não há estabilidade no serviço público? Como proteger as pensões? Como melhorar a educação e a saúde reduzindo gastos e acabando com destinações obrigatórias? O leitor pode fazer as demais perguntas. O método já está sugerido.

Que nome dar a esse conjunto de propostas tucanas? Uma possibilidade vulgar é: neoliberalismo, direitismo, conservadorismo, exploração total da plebe ou defesa radical dos interesses da turma dos camarotes. Em todo caso, os tucanos têm direito de querer tudo isso.

Atrevo-me, contudo, a dar sugestão gratuita. Não cobro pelas minhas melhores ideias. Para aplicar um programa desse nível devastador é fundamental ter legitimidade. Há uma maneira garantida de obter essa tal legitimidade, ao mesmo tempo, simples e complexa: ir às urnas e ganhar a eleição. Essa fórmula tem sido testada em muitos lugares nos últimos séculos, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, e tem-se revelado a mais eficiente já inventada. Dá certo trabalho. É preciso convencer na campanha, conquistar o maior número de eleitores, vencer os debates, suplantar os argumentos dos oponentes e persuadir gente de classes, ideias e regiões diferentes.

Que país esse Brasil! O PT sempre foi socialdemocrata, mas nunca quis se reconhecer nesse figurino. José Dirceu queria ser Lênin. Acabou sendo Al Capone. O PSDB nunca foi socialdemocrata, mas se assumiu como tal para melhor disfarçar a sua identidade. Será que o Tea Party, a ala republicana mais radicalmente conservadora dos Estados Unidos, não acharia essa plataforma tucana neoliberal demais? Talvez fosse melhor para os tucanos esconder essa receita antes da efetivação do golpe de modo a evitar que a população atingida por esse plano de melhorias “modernas” prefira ficar com Dilma mesmo.

Tucano Gilmar

Muito se acusou José Antônio Dias Toffoli de não ter isenção para ser ministro do Supremo Tribunal Federal por ter sido advogado do PT. Os mesmos que destilaram ódio e ironia contra Toffoli não se manifestam quanto ao mais militante de todos os ministros do STF, o tucano Gilmar Mendes. Indicado por FHC, Mendes manteve a suposta neutralidade exigida pelo cargo por pouco tempo. Atualmente, sem o menor constrangimento ou pudor, milita pela derrubada da presidente Dilma Rousseff e adota abertamente a linguagem partidária do tucanato para se referir ao petismo. Na semana passada, depois de acusar os governos petistas de cleptocracia, Mendes ironizou uma ação judicial.

– Espero que não me imputem ter matado Celso Daniel.

Os mais ferrenhos adversários do PT, entre os quais muitos tucanos, em mesas de bar e redes sociais, costumam sugerir que o PT estaria por trás do assassinato do prefeito de Santo André, em 2002. É a típica provocação de torcedor, de quem veste a camiseta, de quem gosta de uma baixaria. Eu pensava que esse tipo de tirada não caía bem num homem que usa toga e ajuda a decidir o que é constitucional ou não. No Brasil, constitucional não é o que está escrito na Constituição, mas o que o STF diz que está. Às vezes, as interpretações coincidem com o texto da Carta Magna. Outras, não. O que conta é o “entendimento” desses homens acima do bem e do mal. Entre eles, o cada vez mais tucano Gilmar Mendes.

Falta pouco para ele querer disputar com Aécio Neves, José Serra e Geraldo Alckmin o “direito” de suceder Dilma Rousseff caso aconteçam novas eleições.

Gilmar Mendes assumiu as vestes de principal defensor da moralidade pública neste ocaso da República das Empreiteiras montada pelo petismo. Em 2009, ele ainda enfrentava alguma resistência. O seu colega ministro Joaquim Barbosa, num bate-boca, dirigiu-se a ele nestes termos também pouco adequados a quem usa toga: "Vossa excelência não está na rua, não. Vossa excelência está na mídia, destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro. É isso. [... Vossa excelência quando se dirige a mim não está falando com os seus capangas do Mato Grosso, ministro Gilmar. O senhor respeite".

Não posso acreditar que um ministro do STF tenha capangas.

Deve ter sido um erro de metáfora cometido por Barbosa num arroubo de retórica.

Arroubos retóricos também caracterizam os destemperos do próprio Gilmar Mendes. Contrário a aplicação da Lei da Ficha nas eleições de 2010, cuspiu algumas frases dignas de uma antologia do pior, entre elas esta pérola rugosa: "O povo não é soberano nas democracias constitucionais". No embalo, rotulou a lei da Ficha Limpa de "barbárie da barbárie", algo como o nazifascismo. Mendes também se tornou famoso por ter livrado duas vezes o banqueiro Daniel Dantas da cadeia. Tudo isso não impede que diga algumas verdades sobre o desvio de dinheiro público para campanhas petistas. A mesma indignação, porém, não o tem acometido em casos relativos a outros partidos. Mendes sentou em cima da votação pelo STF do financiamento empresarial de campanhas políticas durante um ano e meio. Mas perdeu.

 

 

 

 

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