Reforma desidratada

Reforma desidratada

Câmara dos Deputados eliminou muitas maldades

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  O governo mandou o seu projeto de reforma da Previdência para a Câmara dos Deputados. Era um monstrengo com a cara de Paulo Guedes sem filtro de envelhecimento. Entre a Comissão de Constituição e Justiça e a Comissão Especial, o projeto foi desidratado. Ainda bem. Perdeu as suas principais maldades: o regime de capitalização, menina dos olhos do ministro da Economia, Paulo Guedes; a intenção de retirar da Constituição dispositivos que protegem os cidadãos de reformas por leis comuns, mais fáceis, rápidas e “baratas” de aprovar; a tentativa de alterar para baixo o BPC, ajuda aos miseráveis da nação; a proposta de mudança da aposentadoria rural; a redução do tempo mínimo de contribuição. O governo queria passar homens e mulheres de 15 para 20 anos. O relator pretendia sacrificar só os homens em 20 anos. No apagar das luzes, um destaque trouxe tudo de volta para 15 anos. Mas, atenção, no caso dos homens, os 15 anos só valem para quem já está na ativa. Sempre tem um pega-ratão nas jogadas parlamentares. Olho vivo.

      A transição para professores na ativa ficou mais branda. Policiais federais fizeram pressão e levaram. Os militares assistem tudo de camarote, longe do esquartejamento geral, protegidos pela fidelidade ao capitão. Este modesto colunista criticou todos os pontos que acabaram por ser alterados. Nesse sentido, declara-se humildemente judicioso analista dos exageros que poderiam ter sido perpetrados e que não podem voltar. O que precisa ainda ser modificado? Vale lembrar que no segundo turno da Câmara dos Deputados só caberão destaques supressivos. Em linguagem de gente que sua para se aposentar, pode tirar, não pode acrescentar. Um destaque vai tentar tirar a maldade maior, a mãe de todas as maldades: a nova fórmula de cálculo do benefício. Pelas regras atuais, faz-se a média de 80% dos melhores salários. Pelo que está proposto e aprovado, far-se-á, a mesóclise é exclusiva dos maldosos e frios, a média de cem por cento dos ganhos.

      A matemática é governista e neoliberal: vai puxar o resultado para baixo. Os primeiros salários de uma vida profissional costumam ser menores. A maioria dos brasileiros não consegue nem de longe contribuir por 35 anos. Chegar aos 15 anos já é uma façanha para poucos. Projeção com perda: faz-se a média de todos os salários, o que já produz redução, se a mulher contribuiu pelo tempo mínimo de 15 anos, tem 60% do valor obtido. A cada ano a mais trabalhado, leva mais 2%, até o limite de cem por cento. O homem começa a obter o ganho a mais a partir de 20 anos. Essa fórmula não atinge preferencialmente o “andar de cima”. Ceifa todo mundo. Arranca um naco de quem ganha pouco. Fixar uma idade mínima de aposentadoria mais compatível com o tempo de vida atual, tudo bem. Aproveitar a onda para tirar um pedaço do pouco que muitos ganham, não.

      O Senado pode consertar esse erro. Se precisar, é só compensar cortando privilégios dos militares numa futura reforma que os inclua. Outro ponto que precisaria ser abordado pelo Senado: de onde saiu o número mágico de dois anos antes da aposentadoria para regras mais brandas (pedágio de 50%). Por que não três, quatro ou cinco anos? Vale lembrar que os parlamentares inscritos no plano de aposentadoria especial terão 180 dias para escolher se continuam na mamata. Ganha uma viagem para turismo em Brasília quem adivinhar o que eles farão?

Por fim, falta corrigir a maldade prevista para as pensões por morte.

O Senado não pode ser cartório para só carimbar o que recebeu.

Vai se acadelar ou rugir como o leão que deve ser?


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