Tempos crônicos
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Morrerei, porém, para sempre
Ou, ao menos, pela eternidade,
Que ninguém sabe quanto dura.
Levarei comigo a claridade
Dos olhos em certa idade,
Quando a alma pega fogo,
E o corpo é campo de jogo.
Morrerei como quem dorme
Morrerei sem tocar o alarme
Só para não acordar a tarde,
Sonolenta depois do sexo,
Côncavo, suarento e convexo.
Foi-se o homem que sorria,
Dirão quem sabe os meninos.
Foi-se o louco dos desatinos,
Fulminarão os jornalistas,
Diante da banca de revistas,
Falando da crise do impresso
E do alto preço do ingresso
Para entrar no paraíso.
Foi-se o velho que dormia,
Contarão talvez os jovens,
Rindo da lentidão do tempo
Sem um game de passatempo:
O que se fazia sem tecnologia?
Vivia-se por acaso de utopia?
Foi-se o homem que amei,
Todo dia digo seu nome,
Suspirará certa senhora
Que um dia foi embora
Levando meu coração,
Que nunca devolveu.
Deixarei pegadas na areia
Um frasco de perfume francês,
Cartas em estilo burguês,
Pérolas, versos, viagens.
Deixarei também pelo que fui,
Sem mágoas, pois tudo flui,
Uma discreta mensagem:
Estive aqui de passagem.
Que a eternidade seja breve!