(Re)Construção Cultural: Centro Municipal de Cultura e Lazer em obras
Complexo cultural abriga o Renascença, a Sala Álvaro Moreyra, Biblioteca Josué Guimarães e Atelier Livre
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Era uma quinta feira e o Centro Municipal de Cultura e Lazer (CMC) estava movimentado. Pessoas no saguão se alongavam e se preparavam para uma aula de dança, alguns momentos depois, cerca de 10 pessoas dançavam com movimentos fluídos, um tipo de dança contemporânea, no saguão do espaço cultural. A cena contrasta com a realidade de seis meses atrás, quando a enchente na noite do dia 6 de maio se alastrou pelo complexo cultural, que está localizado na Av. Érico Veríssimo, e abriga o Teatro Renascença, a Sala Álvaro Moreyra, a Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães, o Atelier Livre e o Saguão de Exposições.
O prédio tem 48 anos e jamais havia enfrentado uma invasão de água tão intensa, que atingiu cerca de 1 metro de altura, após o desligamento da Estação de Bombeamento de Água Pluvial 16, no bairro Menino Deus. Os espaços mais afetados foram o Atelier Livre Xico Stockinger e o Teatro Renascença. Para a recuperação do Centro Municipal de Cultura e Lazer a Prefeitura de Porto Alegre anunciou um projeto com um custo estimado de R$ 2,8 milhões e as obras tiveram início no dia 9 de outubro.
Os trabalhos estão sendo realizados pela empresa Construtec, uma parceria público-privada promovida pela Prefeitura. A previsão de entrega das obras é março de 2025. Juliana Wagner, arquiteta da Secretaria Municipal da Cultura e Economia Criativa (SMCEC) responsável pelo projeto, aponta os planos para a recuperação. Para o prédio em geral, pretende-se fazer a manutenção de reservatórios, substituição de bombas hidráulicas, conserto infraestruturas elétricas e fazer a manutenção dos telhados e calhas, e todos os espaços individuais irão receber cuidados, como a pintura das paredes, substituição de pisos e portas e substituição de toda rede elétrica afetadas pelas águas.
O Teatro Renascença foi o primeiro a receber os reparos, com a remoção do carpete e das 270 poltronas, que foram danificadas após ficarem submersas, e agora aguardam descarte na parte de trás do CMC. Além disso, será feita a manutenção de sanitários, camarins e do palco. Wagner aponta que serão feitas melhorias na acessibilidade e haverá a compra de novas mesas de som e luz. Um exemplo sobre o empenho na revitalização, foi trazido por Liliana Cardoso, Secretária de Cultura e Economia Criativa: a banda municipal tinha alguns instrumentos guardados no subsolo, pois ensaiavam no Teatro Renascença. Com a enchente, os instrumentos foram perdidos. “Já estamos com um processo licitatório para compra de novos instrumentos”, aponta a Secretária. Ela ainda diz que há um de piano de cauda danificado pelas água, com um valor estimado em R$500 mil, o instrumento está “indo para pleno restauro numa parceria com a Secretaria de Estado da Cultura junto com o Instituto Estadual de Música e a Discoteca Natho Henn”, diz.
Na Biblioteca Josué Guimarães, em que o espaço localizado no subsolo atingiu cerca de 1,90m e ficou submerso por um longo período, será incluída uma climatização do ambiente. O espaço já está aberto ao público, porém perdeu uma grande parte do acervo com cerca de 400 livros e 600 DVDs. O local de leitura tem 40 mil obras disponíveis para consultas.
A Sala Álvaro Moreyra tem uma posição mais elevada no prédio e não foi atingida. Tão logo o espaço foi limpo e a luz retornou, os artistas já o ocuparam. Entre os espetáculos, “A Fome”, da Cia. Espaço em Branco, com uma curta temporada de 4 a 6 de outubro.
Liliana Cardoso, estima que foram cerca de R$ 2 milhões perdidos pelo impacto da enchente no CMC. Para mitigar as perdas, caso uma nova enchente aconteça, será instalado um novo sistema de bombeamento hidráulico e será feita uma manutenção dos telhados. Ela ainda explica que “a obra será realizada como compensação por uma obra da empresa CFL Empreendimentos, dentro do modelo de Termo de Aquisição de Solo Criado por Contrapartida e a gente assinou o contrato junto à Prefeitura, para compensar a compra do índice construtivo para o empreendimento a empresa CFL paga em obra e não em dinheiro”. E por sua vez, a CFL contratou a empresa Construtec para a realização das obras.
Situação do Atelier Livre preocupa os artistas
Com 63 anos de existência, a escola de artes Atelier Livre Xico Xico Stockinger perdeu, na enchente, em torno de 300 móveis, entre eles banco, cadeiras, mesas, armários, estantes e alguns eletrônicos. A escola de artes visuais teve um grande impacto nas salas de escultura, cerâmica, xilogravura, litografia e na biblioteca. Na sala de gravura os reparos já começaram. Mas, enquanto os espaços não ficam prontos para receber alunos, a escola de artes já acomoda aulaa, reabrindo dois meses após a enchente.
A sala de escultura foi limpa para acomodar as aulas. “Nós conseguimos reestruturar uma sala, para que possa comportar todos os nossos cursos. Fizemos um trabalho muito exaustivo para que a gente pudesse acomodar o calendário, a gente tem essa sala grande, onde estão acontecendo os cursos de cerâmica, escultura, arboreser e na parte superior estão acontecendo os cursos de desenho e de pintura”, explica a psicopedagoga Thais Amaral, diretora do Atelier Livre há dois anos e meio.
Em meio a reconstrução, um abaixo-assinado promovido por artistas da capital chama a atenção em favor da recuperação da importância e do prestígio do Atelier Livre. Encabeçado pelo movimento Livre Atelier Livre, Fundação Vera Chaves Barcellos e Instituto Zoravia Bettiol, o documento no site change .org já conta com mais de 2.000 assinaturas, desde que foi lançado em 15 de outubro.
O movimento reivindica uma série de ações, mas entre elas, as mais urgentes seriam a contratação de novos professores e eleger para a direção do Atelier, “um profissional de competência administrativa comprovada da área de artes visuais, com a participação de professores, funcionários e alunos”, como relata o documento. Vera Chaves Barcellos e Zoravia Bettiol defendem que o Atelier Livre deve ser um espaço gerido por pessoas do meio artístico, porém não negam que deve ter um administrador para auxiliar. Para elas, a escola deve permanecer pública. Zoravia lembra de uma época em que o Atelier tinha 1.500 alunos em três turnos de manhã à tarde e à noite e tinham 33 professores.
Thais Amaral se diz muito chateada com o abaixo-assinado. Reconhece que é preciso um novo concurso público, e diz que já fez o pedido à Prefeitura para repor os professores, a opinião é compartilhada pela Secretária da Cultura Liliana.
Atualmente, são somente quatro tutores. A solução encontrada por Thais foi criar cursos extras, contratados por um edital. A partir de novembro deste ano, serão 12 cursos, incluindo uma novidade: um curso para crianças de 8 a 13 anos. A Secretária Municipal da Cultura, diz que toda a manifestação é justa e faz parte da democracia, portanto convidou o grupo por trás do abaixo-assinado para uma conversa, para “entender quais são as razões e o que a gente pode construir enquanto o futuro”, disse Liliana.
*Com colaboração de Laura Copelli e Letícia Pasuch