Dólar sobe 3,7% e vai a R$ 5,19, novo recorde histórico

Dólar sobe 3,7% e vai a R$ 5,19, novo recorde histórico

Ibovespa voltou a fechar em queda acentuada, caindo 10,35%, terminando o dia em 66.894,95 pontos

AE

No ano, a moeda americana já sobe 30% e no mês, 16%

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Em um dos dias mais nervosos no mercado financeiro mundial na atual crise gerada pela pandemia de coronavírus, o dólar foi a R$ 5,25 na máxima do dia, renovando seu recorde histórico. Para tentar acalmar os investidores, o Banco Central fez quatro leilões de dólares, mas em um deles vendeu apenas US$ 30 milhões, um indício de que, com a elevada incerteza e perspectiva de piora da atividade doméstica e mundial, investidores já não querem pagar qualquer preço para terem dólares, nem o BC quer vender a qualquer taxa. No encerramos do pregão, o dólar à vista encerrou em R$ 5,1960, em alta de 3,74%. No ano, a moeda americana já sobe 30% e no mês, 16%.

Refletindo o nervosismo dos investidores hoje, o mecanismo de circuit breaker foi acionado na B3 pela sexta vez este mês, e quase chegou a ser acionado pela sétima na parte da tarde. Os juros futuros atingiram os limites de oscilação máxima. Em Nova York, os índices também pararam e, na Europa, os mercados perderam mais de 5%.

Além das ações do BC, o presidente Jair Bolsonaro e seus ministros, incluindo o da Economia, Paulo Guedes, ficaram cerca de duas horas em uma entrevista coletiva para explicar as ações do governo, mas nem isso tranquilizou os mercados, com o dólar indo às máximas, a R$ 5,2570 durante a entrevista, quando foi anunciado o terceiro leilão de dólares à vista do dia. O valor total da oferta não foi anunciado e o BC informou que vendeu US$ 30 milhões.

A analista de moedas do banco alemão Commerzbank, You-Na Park-Heger, avalia que em meio ao pânico, os mercados parecem estar questionando a capacidade dos governos de agir para impedir a piora da crise. No caso do Brasil, ela observa que esses temores se amplificam porque a capacidade fiscal da economia brasileira é limitada e a disparada do dólar pode limitar um corte mais agressivo dos juros. Pesa negativamente a visão de que o presidente Jair Bolsonaro parece não estar levando a pandemia muito a sério, ressalta ela. O número de casos no Brasil ainda é baixo, mas a analista observa que isso não quer dizer muita coisa, basta olhar o que aconteceu em outros países.

Com a crise gerada pela pandemia, os estrategistas do banco francês Société Générale (SG) elevaram as previsões para o dólar nos mercados emergentes. No caso do Brasil, a previsão é de que a moeda americana fique em R$ 5,15 até o final do primeiro trimestre, continue perto de R$ 5 na segunda metade do ano e chegue a R$ 5,25 ao final do primeiro trimestre de 2021. Ante emergentes, em dia que os preços do petróleo despencaram, o dólar disparou 7% hoje na Rússia, 4% no México e na Colômbia. Na Turquia, avançou 3%.

Bolsa

O Ibovespa conseguiu evitar o segundo circuit breaker do dia e, na hora final dos negócios, afastou-se das mínimas da sessão. Ainda assim, colheu perdas de dois dígitos no fechamento desta quarta-feira, em tarde na qual autoridades brasileiras, de máscara, procuraram informar e tranquilizar a população em longa entrevista coletiva, de cerca de duas horas, liderada pelo presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, entre outros, como o da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e o da Justiça, Sergio Moro. "Isso é uma guerra", chegou a dizer o general Azevedo. "O inimigo é invisível, feroz, dedicado", acrescentou.

Com vencimento de opções sobre o Ibovespa, e dólar a R$ 5,2570 na nova máxima histórica intradia, o índice à vista da B3 voltou a fechar em queda acentuada nesta quarta-feira, tendo perdido quase metade dos pontos ante o recorde de fechamento em 23 de janeiro, de 119.527,63 pontos. No encerramento, o Ibovespa mostrava hoje 66.894,95 pontos, em queda de 10,35% na sessão, e acumulando agora perda de 44,04% ante o pico histórico, em pouco menos de dois meses. Na semana, o Ibovespa cai 19,09%; no mês, 35,78%; e no ano, 42,16%.

O sexto circuit breaker de março foi acionado pouco depois das 13h, e algum tempo após a retomada dos negócios, o mecanismo quase foi efetivado novamente, quando as perdas se aproximavam da marca de 15% - a B3 aumentou então o limite de flutuação do índice futuro, desafogando o índice à vista. O giro financeiro totalizou R$ 58,9 bilhões, impulsionado como de costume em dia de vencimento de opções sobre o índice. No exterior, a referência americana de petróleo, o WTI, foi negociada hoje no menor nível do século.

"A palavra é a mesma, aqui e fora: pandemia", resume o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira. Com o acúmulo de perdas na B3 e a economia global se assemelhando cada vez mais a uma catatonia, com dificuldades de operação de cadeias logísticas e o recolhimento compulsório de consumidores e trabalhadores às casas, a agitação parecia ainda mais perceptível do que em dias anteriores, já tensos. "Me liga mais tarde, estou liquidando posições", disse um operador, depois do circuit breaker do dia, o sexto do mês, igualando o pior momento da crise global de 2008. "Está difícil falar, tem muita gente em home office", explicou outro integrante de mesa.

A escalada de notícias ruins parece acompanhar o ritmo exponencial de disseminação do vírus. Instituições como Goldman Sachs reduzem projeções econômicas e já preveem a possibilidade de recessão no Brasil. A revista The Economist reporta que cerca de metade da população mundial será afetada pelo coronavírus. E o secretário do Tesouro americano, Steven Mnuchin, avalia que, em cenário extremo, a taxa de desemprego nos EUA - hoje na mínima de cinco décadas - poderia chegar a 20%, muito acima do auge observado na última crise global (10% em outubro de 2009) e não muito distante ao da Grande Depressão (24,9% em 1933).

Na B3, as empresas do setor aéreo e de turismo se mantiveram, mais uma vez, na ponta negativa, com Smiles em queda de 38,89%, CVC, de 36,78%, e Azul, de 33,09%. Destaque também para perda de 32,95% em Via Varejo, de 28,72% para Cyrela e de 28,41% para Gol. No ano, Azul perde agora 82,24%, CVC, de 85,18%, Gol, de 84,78%, e Smiles, de 73,62%. Entre as blue chips, Petrobras PN fechou hoje em baixa de 13,15% e a ON, de 15,52%, enquanto Vale ON cedeu 6,89%. Entre os bancos, Bradesco PN caiu 11,66%, Banco do Brasil perdeu 7,71% e Itaú Unibanco caiu 6,94%. Duas ações do Ibovespa conseguiram fechar em alta hoje: Carrefour (+1,97%) e BB Seguridade (+0,67%).

Juros

O mercado de juros chegou ao dia da mais esperada decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) dos últimos tempos convicto num novo corte da Selic, mas sem consenso sobre o tamanho da redução em meio ao grau elevadíssimo de incertezas do cenário global. Apesar da aposta em novo afrouxamento monetário, as taxas hoje fecharam em alta consistente, de cerca de 50 pontos-base no trecho curto e entre 120 e até 165 pontos nos vértices intermediário e longo.

As taxas trilharam trajetória altista desde a primeira etapa, mas o pico do estresse foi atingido à tarde, quando boa parte dos principais contratos bateram nos limites máximos de oscilação, exigindo ajustes por parte da B3. A escalada decorreu da zeragens de posições desencadeadas pela piora do câmbio, com o dólar à vista chegando a até R$ 5,25.

O contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2021 fechou a sessão regular em 4,000%, de 3,597% ontem no ajuste. O DI para janeiro de 2022 encerrou com a taxa de 5,81% (máxima), de 4,451% ontem no ajuste. O DI para janeiro de 2027 fechou com taxa de 8,55%, ante 7,382% ontem no ajuste.

Profissionais nas mesas de renda fixa relatam que, com o noticiário sobre os estragos do coronavírus piorando dia a dia, numa crise já tida como sem precedentes, e a percepção de que a situação ainda vai piorar muito antes de melhorar, o mercado está perdido e o "pânico é total". Desde ontem, grandes instituições do mercado financeiro vêm revisando suas expectativas para o PIB brasileiro este ano para zero e até números negativos, o que ilustra a severidade da crise.

"As medidas são paliativas para enfrentar a crise e na medida em que piorou o dólar, piorou o DI. O mercado está reagindo muito ao exterior e ao espaço limitado para atuação de política fiscal e monetária, que, de todo modo, terão pouco resultado", disse o operador de renda fixa da Nova Futura, André Alírio.

Para o Copom, dado o estresse do dia, a curva, ao contrário de ontem, não mostra mais precificação para corte de 0,75 ponto porcentual da Selic hoje. Segundo o Haitong Banco de Investimento, a precificação é de -43 pontos-base, ou seja 70% de chance de corte de 0,50 ponto e 30%, de 0,25 ponto. Para maio, a precificação é de -7 pontos, ou seja 30% de chance de redução de 0,25 e 70% de chance de Selic estável.

Sérgio Goldenstein, ex-chefe do Departamento de Mercado Aberto do Banco Central, defende que o Copom reduza a Selic em 0,50 ponto. "Uma redução de apenas 25 bps seria muito ruído para nada, enquanto 100 bps ou mais seria gerar muito ruído sem ter convicção de nada. A única convicção é que aquilo que alguns convictos chamavam de 'gripezinha' vai afetar bastante a atividade", escreveu, em sua conta no Twitter.


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