Oferta de imóveis residenciais para alugar cai 21,55% em Porto Alegre

Oferta de imóveis residenciais para alugar cai 21,55% em Porto Alegre

Comparação entre os primeiros nove meses deste ano e mesmo período de 2022 mostra também aumento de preços

Karina Reif

Jeitos de morar foram se modificando ao longo do tempo e mercado procura acompanhar

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A oferta de imóveis residenciais para alugar em Porto Alegre reduziu 21,55% nos primeiros nove meses do ano frente ao mesmo período do ano passado. Isso significa, segundo o vice-presidente de Locações do Sindicato Intermunicipal das Empresas de Compra e Venda, Locação e Administração de Imóveis (Secovi/RS), Leandro Moraes Hilbk, que mais contratos estão sendo fechados nos últimos meses do que em 2022, reduzindo a quantidade de estoque de apartamentos e casas disponíveis para moradia na Capital, ainda que o valor médio por metro quadrado tenha aumentado 9,5% no acumulado em 12 meses terminado em setembro, no levantamento do Secovi-RS. Em outro intervalo de tempo, entre novembro de 2022 e outubro de 2023, apurado pelo Índice Aluguel QuintoAndar Imovelweb, a alta chegou a 14,28%.

“Em época de alta crise, acontece o contrário, as pessoas vão morar junto, voltam para a casa da família, para o interior. Podemos entender que agora as pessoas estão se sentindo mais confiantes para fazer um investimento em uma parte importante da vida delas. ”, observa.  

O especialista em dados do Grupo QuintoAndar Pedro Capetti atribui o aquecimento ao atual cenário econômico. “As taxas de desemprego, principalmente aqui no Rio Grande do Sul, estão em níveis mais baixos. Esse movimento acaba impactando a economia. Com mais trabalho e renda, as pessoas acabam tendo mais recursos para escolher a sua casa”, ressaltou. Em Porto Alegre, o último levantamento do Caged mostrou a criação de 1.397 vagas com carteira assinada em setembro. 

Segundo ele, isso ajuda a explicar o motivo de os proprietários manterem os preços elevados e também de estarem dando menos desconto. O Índice de Aluguel QuintoAndar Imovelweb mostrou que o abatimento médio das transações feitas em outubro foi de 3,3% na Capital, 0,4 ponto percentual a menos do que no mês anterior. Conforme ele, se o locatário está concedendo menos desconto, é porque está inflexível e confiante de que encontrará um interessado disposto a pagar o que foi anunciado. 

No caminho oposto à elevação das ofertas, o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), utilizado nos contratos de aluguel como referência para reajuste dos imóveis, caiu 4,57% no acumulado de 12 meses em outubro. “Isso é explicável, porque o imóvel locado normalmente reajusta de acordo com o IGP-M, mas a oferta não necessariamente. Ela varia de acordo com a demanda.” Quanto maior a procura, a tendência é que os valores subam.  Além disso, ele observa que, durante a pandemia, muitos abatimentos foram concedidos e agora esses valores começaram a ser recompostos, apesar da queda do índice. 

Mesmo com o cenário de mais locações residenciais na Capital, o número poderia ser ainda maior. Segundo levantamento do Secovi-RS, o tempo médio para se alugar um imóvel, tanto residencial como comercial, é de 14 meses. A entidade atribui isso a fatores como localização, idade do imóvel, elevador, conservação, valor do condomínio, poluição sonora, segurança do bairro, entre outros.

Alguns inquilinos colocam nessa lista a burocracia que ainda existe nas imobiliárias. O desenvolvedor de software Guilherme Bazzo e sua namorada decidiram mudar para ganhar mais espaço. "Eu trabalho em casa alguns dias da semana e, como só tínhamos um quarto, o ambiente começou a ficar pequeno", conta. Contudo, a mudança não foi fácil. “Em geral, foi trabalhoso”, relata. “As assinaturas minhas e de todos fiadores precisavam estar no mesmo documento. Então tivemos que levar o documento até Farroupilha (onde os fiadores residem) para poder coletar as assinaturas”, explica. 

O modelo com fiador, apesar de burocrático, foi escolhido porque não precisaria adicionar dinheiro, além do valor do aluguel. “Estava conferindo os outros modelos e tinha um por cartão de crédito, seguro fiança, ou título de capitalização. No caso de fiador, para o valor do meu aluguel, precisaria de um fiador com dois imóveis quitados, ou dois fiadores com um imóvel cada”, observa. Da escolha do apartamento até a mudança, levou cerca de três semanas, segundo Bazzo. 

Em contrapartida, Hilbk salienta que o processo já está muito mais simples do que foi no passado. “Só precisa ter um nome sadio que se consegue, com muita facilidade, o imóvel sem oferecer garantias. Tem também seguros e uma série de produtos ,garantidores da locação, não precisando mais ir atrás de um fiador”, declara. Além disso, algumas imobiliárias aceitam as assinaturas de documentos on-line e outros recursos à distância. “Facilitou muito. O fiador é uma alternativa para o inquilino não pagar nada, pois tem o fiador que vai garantir (o valor do aluguel) para ele”, esclarece.  

O diretor de operações na Foxter Cia Imobiliária, Fernando Erhart, coloca outra hipótese para o aumento das locações. Segundo sua análise, os juros altos têm inibido a contratação de alguns financiamentos para compra de imóveis. Porém, a previsão de declínio da Selic, que é a taxa básica, para 9,25% ao ano no final de 2024, como aponta o Boletim Focus, tem feito algumas pessoas esperarem para adquirir uma unidade própria. “Havendo queda na taxa de financiamentos e juros e o número de imóveis se mantendo em patamar elevado, existe um cenário de aumento de volume de transações de venda no ano que vem”, projeta. 

O brasileiro sempre teve a compra da casa própria no radar. A pesquisa Censo QuintoAndar de Moradia, em parceria com a Datafolha, em 2022, indicou que 88% dos entrevistados na região Sul do Brasil têm o sonho de adquirir seu imóvel. Porém, nos últimos anos, vem se popularizando uma tendência de usufruir mais e possuir menos, segundo a professora da Escola de Negócios da Fadergs Janine Rocha.  “Isso quer dizer deixar de comprar e passar a usar”, salienta. Ela entende que o movimento vem junto com a procura de aluguel de imóveis por períodos curtos, por exemplo. “Isso ainda aparece de forma tímida, mas acredito que ainda vá crescer. O brasileiro ainda se sente confortável e seguro quando tem uma casa própria e um carro próprio, por exemplo”, pondera.  

Configuração das famílias mudou o jeito de morar

Mudanças nos modos de vida, especialmente das famílias, têm influenciado os jeitos de morar. Por consequência, o mercado vem acompanhando essas demandas com ofertas para atender as novas configurações. O professor da Faculdade de Arquitetura e do Programa de Pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional da Ufrgs, Eber Pires Marzulo, salienta que, a partir da metade do século 20, o modelo rural familiar com vários filhos e agregados passou a se transformar, nos grandes centros urbanos, em um ideal composto por pai, mãe e filhos, o que demandava alguns determinados tipos de residência. 
“A família urbana vai morar em pequenos espaços, em edifícios com muitas unidades e poucos quartos. Com apenas dois gêneros, um apartamento de até três quartos servia a essa configuração”, explica. Conforme a elevação da renda e classe social, o que ia se agregando eram áreas comuns no lar, como sala de jantar, por exemplo. 

À medida que os filhos cresciam, passavam a sair de casa para constituir suas próprias famílias. “No padrão médio, o que tem hoje, cada vez mais, são casais sem filhos, heterosextuais ou homossexuais, além de famílias com poucos filhos, ou monoparentais, que moram, em geral, com a mãe”, ressalta.

Como as áreas centrais das cidades acabam reunindo jovens adultos solteiros e sem filhos, foi se popularizando, nos últimos anos, o formato estúdio em prédios com áreas comuns. “Eles estão, muitas vezes, em bairros com infraestrutura para a vida cotidiana, como bares, restaurantes, lavanderia. Não têm garagem, porque essas pessoas moram em áreas centrais e são abertas para outros modos de vida. Usam táxis, aplicativos, bicicletas e motos”, detalha. Com isso, o estoque de unidades novas vai se modificando. 

Por outro, reflete o professor, coexiste um padrão de família de classe média de um nível mais alto de renda, em que os filhos viram profissionais e seguem morando com os pais. “Começa a ter, por exemplo, programas de apartamentos com três suítes e três vagas de garagem, o que pressupõe que há três ou mais adultos em casa. Isso, alguns anos atrás, não fazia sentido”, analisa. 

Da mesma forma, há ainda os chamados bairros planejados e os condomínios com muitas comodidades. “São dois modelos distintos: um que leva a usar a cidade e o outro que não leva.” Ele acrescenta aí uma possibilidade de demanda de investidores no mercado. “Para quem tem mais dinheiro, quanto maior o valor individual do bem, melhor para o investimento”, ressalta, lembrando que muitas unidades são utilizadas para investimento de aluguel para curta temporada. 

Se para a classe média em geral, esses formatos de moradia foram mudando e ficando mais diversificados, para a população de renda mais baixa, o cenário se modificou de outras maneiras. Segundo o professor, nas vilas e favelas, ainda se encontram famílias mais numerosas e, em grande parte, a mulher é a chefe da estrutura. “Essas mulheres convivem com mulheres de outras gerações. Há mais espaços comuns. As áreas sociais e privadas da moradia são mais mescladas. De uma peça para a outra, se passa, muitas vezes, por dentro de um quarto, por exemplo”, conta.  

O mercado tem ocupado regiões que eram do estado ou áreas industriais que não são mais usadas para edificar. Com isso, essa parcela da população acaba sendo restringida. “Nas áreas ocupadas por pessoas de baixa renda, elas precisam se deslocar, o que é o chamado processo de gentrificação. As coisas vão ficando caras e aquela população tradicional acaba sendo expulsa, indiretamente.”


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