Revolução de 23: acervo de Assis Brasil será explorado

Revolução de 23: acervo de Assis Brasil será explorado

Milhares de documentos que foram retirados do Castelo de Pedras Altas há cinco anos vão começar a ser analisados e catalogados

Mauren Xavier

Registro da assinatura do tratado que deu fim à Revolução de 1923 no Castelo de Pedras Altas

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Completado um século da Revolução de 1923, marcada pelo confronto entre chimangos e maragatos no Rio Grande do Sul, parte do acervo inédito de Joaquim Francisco de Assis Brasil, uma das lideranças dos maragatos, começará a ser explorado. A diversidade de documentos é grande, uma vez que não deve se deter apenas aos acontecimentos do conflito civil, mas à discussão sobre o código eleitoral de 1932, que garantiu, por exemplo, o voto às mulheres.

O conteúdo estava na propriedade da família de Assis Brasil, o Castelo de Pedras Altas, no Sul do RS, local onde foi assinado o tratado de paz, que recebeu inclusive o nome da propriedade. A etapa de análise e catalogação começará em breve, uma vez que, na semana passada, o Fundo para Reconstituição de Bens Lesados, vinculado ao Ministério Público do RS (MPRS), autorizou o repasse de cerca de R$ 300 mil para a contratação de equipes especializadas para fazer esse serviço. 

“Eles (os documentos) podem recontar uma parte importante da história do país e do Estado”, resume o coordenador do Centro de Apoio Operacional de Meio Ambiente do MPRS, promotor Daniel Martini, que está à frente da preservação do conteúdo. Nessa primeira etapa será feita a organização, catalogação, além da análise técnico-científica. Dependendo do ritmo, é possível que a primeira etapa seja concluída até o final do ano. 

Parte do acervo foi retirada do castelo pelas condições inadequadas em que estava sendo mantido. Isso ocorre porque, em função das infiltrações, alguns itens estavam se deteriorando por causa da umidade e da má conservação. Assim, os arquivos foram trazidos em um caminhão para Porto Alegre em fevereiro de 2019 e estão sendo armazenados em local com condições controladas no Memorial do MPRS, no centro de Porto Alegre. Martini recorda que ainda não é possível ter uma dimensão do conteúdo histórico dos documentos. Isso porque eles estavam espalhados por cômodos do Castelo. “Agora estão a salvo.” 

Após primeira etapa de organização e catalogação, começará a parte do estudo do conteúdo desses documentos. A intenção é digitalizá-lo e torná-lo público. “O importante não é nem que a gente avalie documento por documento (...), mas que a gente catalogue e digitalize para torná-los públicos para que historiadores e estudiosos possam avaliar e estudar esses documentos. E isso vai produzir efeitos e resultados ao longo de muito tempo. São milhares e milhares de páginas de documentos”, pontua. Ele apontou ainda que, após a conclusão dessas etapas, o acervo deverá retornar ao Castelo de Pedras Altas, assim que o mesmo tiver condições de recebê-lo. 

Documentos podem trazer informações sobre a Justiça Eleitoral

O possível conteúdo que consta nos arquivos tem chamado a atenção da Justiça Eleitoral gaúcha. Tanto que o presidente do TRE-RS, desembargador Francisco José Moesch, apresentou na semana passada uma proposta para auxiliar no serviço de preservação do acervo. A ideia é que a Justiça Eleitoral colabore com profissionais e que tenha acesso aos documentos relacionados às discussões sobre as mudanças do processo eleitoral à época. 

Associação busca apoiadores para obras

Após o processo de recuperação e catalogação, a documentação retornará ao Castelo de Pedras Altas, que também passará por obras de restauração. A propriedade foi tombada pelo governo do Estado em 1999 e, dez anos depois, foram tombados os bens móveis do Castelo no estilo medieval, que são formados por inúmeras peças, além da biblioteca particular, que é formada por itens raríssimos, somando cerca de 21 mil livros, sendo considerada uma das maiores bibliotecas da América Latina. No ano passado, a propriedade, que tem 300 hectares, foi comprada pela família Segat, de Santa Maria, que busca tornar o espaço um museu. 

Atualmente, a Associação Castelo de Pedras Altas está na fase de captação de recursos para a realização da primeira de quatro etapas de restauro. No final do ano passado, foi aprovado pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC) a liberação de de R$ 1,9 milhão. Desse valor, ele adianta que R$ 900 mil já foram captados, o que permitirá dar início aos trabalho, enquanto segue a busca do restante do valor. Com o apoio da LIC, as empresas que pagam ICMS ao governo do Estado podem destinar os recursos para o projeto. Nessa primeira etapa, que tem previsão de iniciar já no próximo mês, serão feitas melhorias para combater as infiltrações, recuperação do reboco interno e troca da fiação elétrica e da hidráulica. 

“Esse legado é da sociedade. Essa é a nossa história”, comenta o presidente da Associação, advogado e pecuarista Luiz Carlos Segat, de 56 anos. Ele recorda que ao fazer a aquisição da propriedade não tinha conhecido da bagagem histórica do espaço e que isso mudou completamente os planos para o terreno, que seria destinado à agricultura. Segat ressalta a importância da preservação da história, mas também considera a recuperação uma homenagem à contribuição de Assis Brasil. Além de político e liderança, ele é patrono da Agricultura no Estado e esteve à frente da discussão do código eleitoral de 1932. 

Apesar de aguardar o início das obras, a propriedade está aberta apenas para visitas guiadas (informações Instagram @castelopedrasaltas). 


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