O aumento de casos de intoxicação por metanol no Brasil e a recente confirmação de um caso em Porto Alegre, além de outros suspeitos sob investigação, têm mudado a rotina de estabelecimentos que vendem destilados na Capital. Enquanto alguns relatam mudança nas vendas, outros estão atentos a preços baixos e duvidosos. A maioria dos proprietários e gerentes de bares e botecos localizados no bairro Cidade Baixa, ouvidos pela reportagem, não registraram quedas bruscas de vendas, mas perceberam a preocupação dos consumidores. No entanto, exigem sempre documentação fiscal para saber a origem das bebidas compradas pelos fornecedores, o que, garantem, traz segurança para a venda.
Até a manhã desta quarta-feira, a Polícia Civil havia recolhido mais de 350 garrafas de bebidas alcoólicas durante a Operação Dose Letal, que visa retirar de circulação produtos etílicos que não tenham procedência definida e que estejam sob suspeita de falsificação no Rio Grande do Sul. Todos os itens foram retirados de estabelecimentos em Porto Alegre.
Sandro de Oliveira, gerente de um bar e restaurante localizado na rua Joaquim Nabuco, foi um dos que chegou a contabilizar uma queda de 40% nas vendas de bebidas no último final de semana, e percebeu o aumento do fluxo de consumo de cerveja e chopp por parte da clientela. Oliveira também diz confiar nos fornecedores e permanecer com os mesmos, para evitar riscos. Por segurança, o estabelecimento também decidiu interromper as vendas de alguns destilados, como o whisky. "Agora só estamos com a caipirinha, o restante demos um tempo. Não se sabe o que pode acontecer", disse.
O gerente de um boteco na rua General Lima e Silva, Adilar Pires, ainda não está preocupado com os casos de intoxicação. Isso porque ele diz confiar nos parceiros de fornecimento, principalmente por conta da nota fiscal de compra, que mostra a origem do produto. No estabelecimento, são vendidos whisky, vodka, cachaça, gin, caipirinha e outros destilados. "A gente acredita que nossos parceiros de fornecimento são confiáveis, até porque todos eles vendem com nota. Quando você tem uma nota de um produto, teoricamente tem uma base para confiar que tenha a qualidade e procedência original de onde foi fabricado realmente", diz Pires.
Elton Dellazari, gerente de um bar e restaurante na rua da República, tem evitado, principalmente, comprar bebidas por preços mais baixos do que o normal. O estabelecimento vende whisky, vodka, cachaça e licores. "Um whisky, eu pago R$ 150, vem o pessoal e oferece por R$ 100. Mas tu não tens uma procedência. Tu não sabes se a pessoa foi para o Uruguai ou não. Vai saber de onde veio", exemplifica. Ele pretende continuar com os mesmos fornecedores. "Até descobrirem que esse fornecedor está dando problema. Aí tu já vai ficar meio [desconfiado], ou vai tirar do cardápio", diz.
Associações orientam compras e descartes seguros
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Rio Grande do Sul (Abrasel) tem promovido treinamentos a associados, proprietários de estabelecimentos que vendem destilados e a interessados no assunto com orientações sobre compras e descartes de bebidas. Leonardo Vogel Dorneles, presidente da Associação no Rio Grande do Sul, lembra que, apesar de existir um caso confirmado no estado, a bebida não foi comercializada aqui. Ainda, que, até o momento, na maioria dos casos não se trata de bebida consumida em bar e restaurantes, mas sim, por compras em pequenas distribuidoras.
O presidente lembrou da importância de haver cuidados com compras em marketplaces, onde há mais risco de vendas de produtos adulterados. “Existe uma possibilidade de adulteração, e às vezes, nessas plataformas, a gente não tem o controle, diferentemente de um outro com mercado nosso tradicional que, normalmente, só trabalha com fornecedores homologados e certificados”, explica.
Em relação ao descarte, Leonardo afirma que garrafas aparentemente reaproveitadas podem trazer riscos. Ele explica que garrafas de destilados são personalizadas de acordo com a marca e o tipo de bebida, portanto, são originais. “É uma garrafa difícil de ser falsificada. No vinho é mais fácil utilizar, na cerveja ela é reutilizada e reaproveitada várias vezes. A garrafa do destilado não, é um uso único”, diz. Para identificar se uma garrafa é original ou não, ela precisa estar em bom estado, sem ranhuras.
“A garrafa tem valor de mercado muito maior para ser reaproveitada no mercado paralelo do que como vidro reciclado. Então as pessoas costumam utilizar essas garrafas para fazer vender essas garrafas inteiras para eventuais falsificadores”, explicou o residente. Para evitar que as garrafas sejam falsificadas, ele sugere quebrar os vidros ou a tampa, arranhar ou tirar o rótulo após o uso. "Se quebrar a tampa ou colocar em um lixo diferente, isso já vai fazer com que diminua a chance que essa garrafa seja utilizada no mercado paralelo", diz.
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A Associação Brasileira de Eventos (Abrafesta) informou, em nota, que acompanha com “extrema preocupação” os casos suspeitos de intoxicação por metanol, e reforçou a importância de haver rigor absoluto na fiscalização da cadeia de produção, distribuição e comercialização de bebidas no Brasil.
A associação ainda garantiu que empresas associadas operam com padrões “elevados de segurança e conformidade”, adquirindo bebidas exclusivamente de fornecedores legalizados e com documentação fiscal. “Reforçamos a importância de exigir nota fiscal e verificar a rastreabilidade dos produtos, incluindo histórico de procedência, composição, e preços compatíveis com o mercado, como medidas essenciais para prevenção de fraudes”, informa a nota. O alerta também vai para o risco da reutilização irregular de garrafas e embalagens, sendo recomendado o descarte responsável com a destruição prévia dos recipientes antes da destinação à reciclagem.
EFEITO DO METANOL NO COMÉRCIO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS EM ESTABELECIMENTOS