Especial

Dia do médico: IA desenvolvida e aplicada no dia a dia dos profissionais gaúchos

De ferramentas para gestão até projetos em desenvolvimento para suporte em diagnósticos, a inteligência artificial começa a participar do dia a dia do médico

Hospital Mãe de Deus utiliza o sistema Munai para monitorar e identificar pacientes com risco de piora clínica; cores em monitores indicam quadros fora do normal
Hospital Mãe de Deus utiliza o sistema Munai para monitorar e identificar pacientes com risco de piora clínica; cores em monitores indicam quadros fora do normal Foto : Mauro Schaefer

A rotina de médicos em hospitais gaúchos já conta com a IA como “parte da equipe”, seja ainda como uma ferramenta a ser desenvolvida e testada, seja como uma solução implementada para facilitar os atendimentos e diagnósticos. O superintendente médico do Hospital Moinhos de Vento, Luiz Antônio Nasi, aponta que a inteligência artificial tem ajudado a acelerar a transformação digital da instituição. Entretanto, reforça o princípio de ter a tecnologia como uma ferramenta a serviço do cuidado humano.

Veja o especial sobre o Dia do Médico

“Atualmente, aplicamos IA em diagnóstico por imagem, hemodinâmica, endoscopia, pediatria e gestão de fluxo assistencial. Em parceria com a McMaster University, reduzimos em até 30% o tempo de aquisição de imagens de ressonância magnética, mantendo a qualidade diagnóstica. Na endoscopia, tecnologias com inteligência embarcada indicam em tempo real a probabilidade de malignidade de pólipos. Na emergência, sistemas de dados ajudam a prever tempos de espera e organizar o cuidado de forma mais eficiente”, explicou Nasi.

Apesar disso, o médico salienta que estas soluções se tratam de ferramentas de suporte à atividade médica. “A tecnologia amplia o olhar clínico, mas nunca o substitui. A IA está presente para gerar eficiência, apoiar decisões clínicas e aprimorar a experiência do paciente. Criamos um comitê dedicado ao tema, unindo especialistas da medicina e da tecnologia, garantindo uso ético, seguro e alinhado à prática assistencial. Nosso foco é liberar o médico de tarefas operacionais para que ele tenha mais tempo para o que é insubstituível: a relação com o paciente”, completou.

No Grupo Hospitalar Conceição (GHC), algumas ferramentas de IA estão em estágio de pesquisa e desenvolvimento enquanto outras já começam a ser aplicadas na prática. Entre eles, estão os projetos de navegação de pacientes oncológicos, que recebeu recursos do Ministério da Saúde e é desenvolvido em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), e o sistema de inteligência artificial na prescrição médica.

De acordo com o GHC, no primeiro projeto, a ferramenta permitirá a captura, análise e integração automatizada de grandes volumes de informações, apoiando a navegação oncológica, otimizando fluxos de atendimento e contribuindo para a coordenação do cuidado. A proposta espera ainda gerar melhorias no acesso de pacientes a especialistas e maior agilidade para o início do tratamento. O grupo hospitalar destaca que a iniciativa é um marco no uso da ciência de dados em saúde pública, com potencial para ser replicado em todo sistema SUS.

O outro projeto em desenvolvimento pelo GHC envolve a integração do prontuário eletrônico utilizado nos hospitais do grupo com uma solução chamada NoHarm, um sistema de IA para auxiliar e otimizar o trabalho da farmácia clínica nas casas de saúde. Ainda de acordo com o GHC, a ferramenta permitirá identificar pacientes a partir de um escore de priorização, prescrições e interações medicamentosas, permitindo a dispensação de medicações com maior segurança.

Para médico Fernando Anshau, assessor da diretoria de Inovação, Gestão do Trabalho e Educação do GHC, o apoio da IA na tomada de decisões, aliada à visão humana dos profissionais da saúde, qualifica os processos de trabalho. “Ela também otimiza o tempo e garante maior controle dos processos” afirmou. “Ainda temos muito a conhecer sobre a Inteligência Artificial e suas possibilidades, mas não podemos deixar de utilizar as ferramentas que já estão disponíveis”, completou o diretor de Atenção à Saúde, Luís Antônio Benvegnú.

Outra casa de saúde com projetos de ferramentas em desenvolvimento é o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Entre os estudos promovidos pela instituição, um envolve a aplicação da IA em exames de imagem, com financiamento do governo federal através da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). A proposta prevê a análise de exames de raio-x para identificar anomalias que podem contribuir com maior rapidez no diagnóstico.

“Ele olha o exame de raio-x, vê se tem pneumonia grave e avisa no sistema, ao radiologista, que esse raio-X precisa ter prioridade na frente dos outros para ser feito do laudo, e o programa já pode dar um laudo pré-estabelecido”, explicou Maurício Sauressig, chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do HCPA, durante evento promovido pelo hospital que discutiu os impactos da IA na rotina dos profissionais de saúde.

Veja Também

No HCPA, a ferramenta de IA já analisou cerca de 40 mil exames de raio-x de tórax e seus resultados foram comparadas com os da avaliação humana. A validação humana ainda está sendo testada, e o acerto de índice chega a 80%, conforme o hospital. Outro projeto em andamento pelo HPCA, em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), envolve a criação de uma calculadora que estima o risco de suicídio de pacientes que já passaram por alguma internação psiquiátrica.

De acordo com o hospital, a intenção é que o algoritmo de inteligência artificial consiga captar os padrões clínicos, comportamentais, sociodemográficos e de história de vida do paciente, associados ao comportamento suicida, e utilizar a ferramenta em novos pacientes em internação. Desta forma, pretende-se que a calculadora seja capaz de estimar de forma acurada o risco de uma tentativa de suicídio para este determinado paciente.

Outro hospital da Capital que aplica a IA em diversas frentes é o Mãe de Deus. Entre as iniciativas utilizadas diariamente pelos profissionais da casa de saúde está o uso de algoritmos de IA no processamento de exames de imagem e diagnósticos. Além disso, outra ferramenta consiste também no uso de algoritmo de inteligência artificial baseada em dados e probabilidades, chamada de Munai, para monitorar prontuários eletrônicos e identificar pacientes hospitalizados com risco de piora clínica, antecipando alertas para equipes assistenciais. Cores, como azul, amarelo e vermelho, são utilizadas para indicar situações fora do normal.

De acordo com o diretor médico do Hospital Mãe de Deus, Tiago Ramos, a entidade entende que incorporar tecnologia e inovação é parte integrante do compromisso com segurança, eficiência e humanização do cuidado. Apesar disso, ele reforça que a IA é utilizada como ferramenta de apoio, após passar por processos de validação local e implementação responsável, complementando fluxos de trabalho já existentes no dia a dia do hospital e gerando impactos positivos para o paciente.

“Investir em tecnologia é investir no futuro da instituição. Temos que equilibrar inovação com sustentabilidade financeira, governança de dados, segurança cibernética e compliance regulatório. Enxergamos a tecnologia como parceira indispensável da medicina de qualidade. Nossa missão é que o hospital continue sendo referência não apenas pela excelência clínica, mas também por estar à frente nas fronteiras da medicina do futuro, sempre com ética, segurança e foco no ser humano”, falou o diretor médico.

O Hospital Ernesto Dornelles também utiliza IA como instrumento de apoio à prática médica e à gestão hospitalar. Entre as aplicações, estão ferramentas de apoio à tomada de decisão médica com base em dados em tempo real e uso em farmácia clínica, para otimizar uso de medicamentos prescritos, resultando em práticas seguras, sustentáveis e focadas na qualidade assistencial. O Ernesto Dornelles também conduz projetos-piloto em pesquisa clínica e monitoramento epidemiológico com uso de algoritmos de IA.

De acordo com a gerente de Governança Clínica do hospital, Juliana Fernandes, o avanço tecnológico colocado em prática na instituição está alinhado ao conceito de valor em saúde, promovendo melhores desfechos clínicos, reduzindo desperdícios e fortalecendo a segurança e a experiência do paciente. “Ao automatizar análises complexas e fornecer alertas em tempo real, a IA contribui para reduzir erros de medicação, otimizar o tempo dos profissionais e fortalecer a cultura de segurança do paciente”, concluiu a médica.