Rede de alertas em xeque no RS: o que melhorar para evitar novas tragédias

Rede de alertas em xeque no RS: o que melhorar para evitar novas tragédias

Passagem do ciclone pelo Rio Grande do Sul, que deixou um saldo de destruição nas cidades e 16 óbitos, levanta questões sobre como aperfeiçoar os sistemas de monitoramento e de alertas à população

Caraá, o epicentro da tragédia

Por
Kyane Sutelo

Desde o dia 14 de junho, os leitores do Correio do Povo já estavam informados sobre a chuva torrencial que a passagem de um ciclone traria para Rio Grande do Sul e Santa Catarina e sobre um possível cenário de perigo a ser enfrentado entre aquela quinta e sexta-feira. A informação, publicada no site do jornal naquele dia e detalhada na edição impressa de quinta-feira, apontava o nordeste gaúcho como a região com maior projeção de chuvas.

“O risco de deslizamentos de encostas e enchimento de rios será muito alto e rápido. Inundações repentinas poderão ocorrer nessas áreas e com potencial de ser entre a noite e a madrugada”, alertava a meteorologista da MetSul, Estael Sias. No mesmo dia, horas mais tarde, o cenário apontado se cumpria: o excesso de chuvas acumulado em rios e arroios causava inundações e enxurradas. Era só o começo de uma madrugada de destruição.

De lá para cá, ao menos 57 municípios já decretaram situação de emergência e outros organizam a documentação para encaminhar o decreto, buscando receber recursos para reerguer o que foi destruído pela força das águas. Ao contrário do que a maioria da população imagina ver com a passagem de um ciclone – vendavais causando prejuízos –, foram as enxurradas as principais causas de mortes e desaparecimentos. Conforme as buscas foram evoluindo, o Estado zerou o número de desaparecidos, totalizando 16 óbitos. A Defesa Civil divulgou afogamento como causa em pelo menos cinco deles, além de vítimas levadas pelas águas. 

Cinco dias antes, em 11 de junho, o +Domingo do Correio do Povo, que abordava a capacidade do Estado de lidar com impactos de fenômenos naturais como o El Niño, perguntou em matéria de capa: “Estamos preparados?”. O saldo de mortes, a abrangência dos estragos e a sucessão de fatos tanto entre as horas de antecederam o evento trágico quanto durante podem indicar a resposta.

Naquela edição, a Defesa Civil gaúcha garantiu que o governo realiza uma “ação transversal e sinérgica” de preparação para esses eventos. Prefeitos, chefes municipais da Defesa Civil de cidades atingidas pelo ciclone e especialistas ouvidos uma semana após a tragédia garantem que é preciso aperfeiçoar o sistema de monitoramente e de alerta à população. 

Não é possível garantir que as vítimas fatais teriam sobrevivido se fossem avisadas para deixar suas residências, com a indicação concreta de um local seguro para irem, ao menos 24 horas antes do fenômeno atingir o Estado. Mas é preciso levantar a possibilidade de essas pessoas terem sido abrigadas a tempo e questionar: o que deu errado? O que pode melhorar?

 

Não é possível confirmar a passagem de um ciclone por uma região específica do continente muito antes da chegada do fenômeno. “Cada evento tem suas particularidades e nenhum será exatamente igual a outro, mas, em geral, o nível de certeza aumenta muito no curto prazo”, detalha Estael Sias. Segundo a profissional da Metsul, é possível ter alertas mais precisos em 48 a 72 horas antes. Os alertas mais específicos sobre a chegada do ciclone e a intensidade das chuvas, publicizados em redes sociais e sites oficiais de institutos e autoridades – nacionais e gaúchas (estaduais e municipais) –, foram na tarde da quarta-feira, dia 14, menos de 48 horas antes de o ciclone chegar ao solo gaúcho. 

Conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) informou por meio de sua assessoria de comunicação, foram emitidos avisos meteorológicos “tanto na quarta-feira (dia 14), como na quinta-feira (dia 15)”, além da realização de “reuniões de alinhamento e preparação” com o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), com as Defesas Civis de RS e Santa Catarina e com outros órgãos do Governo Federal.

Foto: NOAA / MetSul / CP

“A primeira reunião foi na manhã do dia 14 de junho. Nesse dia começaram a ser enviados os avisos meteorológicos do Inmet (portal, redes sociais, incluindo Youtube e pelo aplicativo do Inmet) e também por SMS pela Defesa Civil do RS”, diz o texto. Nas redes sociais, o Inmet, a Defesa Civil Nacional (Cenad) e o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional começaram a compartilhar, na véspera da tragédia, alertas de “chuvas intensas” e “grande risco de grandes alagamentos, inundações, enxurradas e deslizamentos de terra”.

O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) teria notificado o Rio Grande do Sul na quinta-feira em que o ciclone atingiria o RS, por meio da Cenad, conforme a assessoria de comunicação do órgão. Um segundo documento mais detalhado também teria sido encaminhado aos estados. “Atualmente, o Cemaden está enviando simultaneamente às Defesas Civis estaduais e municipais um documento explicando os riscos, nível e previsão de chuvas, mapas das áreas de risco, impactos sociológicos (na área de risco tem informações sobre a população), mapas e fotos de satélites. Informações mais amplas”, diz o Centro em nota. Segundo o Cemaden, nesses casos, também são feitas reuniões com os órgãos envolvidos. 

Foto: Guilherme Almeida

A cronologia dos alertas

Conforme a meteorologia, os impactos do ciclone em Santa Catarina foram menores, causando menos estragos devido à posição do ciclone. Porém, na segunda-feira, 12 de junho, o estado vizinho já iniciou seus alertas. Cerca de 72 horas antes da chegada do fenômeno, a Defesa Civil catarinense divulgou em seu site texto sobre “chuva persistente e volumosa”, com risco amarelo, considerado moderado, de impactos como enxurradas e deslizamentos em algumas regiões. Na terça, dia 13, o aviso evoluiu para a cor laranja e foi compartilhado nas redes sociais. Na quarta, dia 14, véspera da passagem do ciclone, o alerta se tornou vermelho. Na tarde da quinta, horas antes do fenômeno ocorrer, uma publicação citava nominalmente os municípios com risco de enxurrada.

Especialistas que monitoram a situação dos rios estavam atentos aos avisos do estado vizinho. Na terça-feira, o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Mampituba, que atua em municípios da fronteira com Santa Catarina, publicou em suas redes sociais os alertas catarinenses, marcando a Defesa Civil gaúcha. A primeira manifestação pública de alerta do órgão local, contudo, ocorreu na véspera do evento, com o compartilhamento de um vídeo da Sala de Situação da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), que falava em “fraca a moderada intensidade” de chuvas.

A Sala de Situação da Sema, que, segundo o site do governo gaúcho, é “referência no monitoramento e previsão das condições hidrometeorológicas do Estado”, publicou em seu portal, também em 14 de junho, o primeiro alerta sobre o ciclone. O texto mencionava “chuvas persistentes e com risco de transtornos associados aos elevados acumulados, que variam dos 50 aos 100 mm”. 

Em nota, o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos se manifestou também sobre a preparação para lidar com fenômenos como este. “Precisamos estar mais bem preparados para estes eventos e evitar as moradias nas áreas de risco.” diz o texto do Comitesinos. Já a Defesa Civil do RS avaliou que os sistemas de monitoramento e de alerta operaram, mas, segundo o órgão, “há de se levar em conta a intensidade desse evento, o maior em perdas humanas das últimas quatro décadas”. A Defesa Civil não respondeu aos questionamentos sobre o número de pessoas cadastradas no sistema de SMS e se o Estado avalia a complementação do método de aviso à população, como o sistema de sirenes em áreas de risco, por exemplo. 

As prefeituras dos municípios mais atingidos passaram a emitir alertas apenas na tarde de quinta-feira e os intensificaram no decorrer da noite e madrugada de sexta, quando a chuva torrencial já castigava a região.

Foto: Ricardo Giusti

Porto Alegre espera retomar rede de monitoramento

Na cobertura da passagem do ciclone, uma das afirmações mais ouvidas, tanto de autoridades municipais como de moradores das comunidades mais atingidas, foi: não houve tragédia semelhante nas últimas décadas. A constatação também foi feita pelo governo do Estado. Após gravar vídeo afirmando que os impactos do ciclone não seriam graves, o coordenador da Defesa Civil de Montenegro, Carlos Ferrão, se desculpou e pediu exoneração no dia 21 de junho. As notificações às comunidades foram emitidas somente nas 24 horas que antecederam a chegada do ciclone, mesmo em municípios com suporte meteorológico externo.

É o caso de Porto Alegre, que publicou aviso no site e redes sociais na tarde do dia 15, quando, conforme a assessoria de comunicação da Defesa Civil da Capital, o alerta foi recebido. Para a divulgação, se conta com a imprensa. “Hoje, os alertas chegam às comunidades que não possuem ou não utilizam redes sociais, através dos meios de comunicação tradicionais”, diz, em nota, o órgão. A Capital testa uma parceria com uma empresa privada para agregar aos dados de institutos oficiais de meteorologia. “Se o teste for positivo e alcançar as expectativas, será feito uma parceria”, detalha, em nota. 

A possível implementação oficial da parceria retomaria uma rede de monitoramento do município, que teve o contrato encerrado na gestão passada. O órgão considera que essa seria a melhoria prevista para o sistema de alerta e prevenção local, além de mensagens de texto via celular, conforme nota. O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, defende mudanças.

Em entrevista à Rádio Guaíba, ele reconheceu que a Capital tem pessoas em áreas de risco e defendeu uma atuação integrada de qualidade com os governos do Estado e federal. “O governo do Estado tem que ter um sistema compartilhado com as prefeituras, que a gente pague uma parte dele, para sabermos o seguinte: qual a velocidade dos ventos, que vem daqui a duas horas? Isso não tem no Rio Grande”, afirmou Melo. E complementou: “Se tudo o que aconteceu não servir para uma tomada de atitude, está tudo errado”. 

Foto: Guilherme Vargas / Estúdio Tanto / CP

Santo Antônio da Patrulha também teria suporte externo para acompanhar fenômenos naturais devido a uma parceria com a Universidade Federal de Rio Grande (Furg), segundo o prefeito Rodrigo Gomes Massulo. No entanto, a universidade informa que o projeto terminou após o verão e não foi renovado. O prefeito afirma que não sabia que viria um volume tão intenso de precipitação. “Acredito que todos os municípios imaginaram que as chuvas excessivas eram chuva de 100 mm, que ocasionariam alguns alagamentos, não o que aconteceu”, diz.

Os alertas publicados pela imprensa na quarta-feira, contudo, já indicavam a previsão de chuva intensa. Ele garante que as comunidades foram avisadas por grupos de aplicativos de mensagens e que uma região chegou a ter funcionários da prefeitura circulando para alertar moradores. Apesar de não estar descrito em redes sociais ou site, o Executivo do município afirma que a população foi orientada a se dirigir ao salão de uma igreja local. “A gente usa e vai ter que usar essas tragédias para aprender”, pontua Massulo.

Enquanto em muitos municípios gaúchos, a demora nos alertas e outros fatores contribuíram para que a população perdesse bens materiais, em outros as perdas foram mais graves: vidas. Em Maquiné, morreram três pessoas da mesma família, que teve a casa soterrada por um deslizamento, no bairro Mundo Novo. Na região das cachoeiras de Forqueta e Garapia, na Barra do Ouro, cerca de 300 famílias ficaram ilhadas.

“A gente emitiu o primeiro alerta um dia antes, depois emitimos durante a tarde”, afirma o prefeito, João Marcos Bassani dos Santos. A prefeitura está em grupos de WhatsApp de diversas regiões, segundo ele. Nas redes sociais, foi possível identificar publicações na tarde do dia 15. Além disso, na noite em que o ciclone chegou ao Estado, o prefeito fez um apelo, em vídeo, pedindo que as pessoas deixassem suas casas com urgência. O chefe do Executivo do município disse que uma das principais dificuldades é convencer a população a deixar suas residências. “A gente implorou, pediu, solicitou”, diz ele.

Em outro município que registrou mortes, São Leopoldo, o prefeito Ary Vanazzi também menciona imprudência de alguns habitantes. Segundo ele, a população foi avisada nos canais oficiais sobre previsão de fortes chuvas, mas que muitos não acreditaram. O alerta para que as pessoas deixassem suas casas veio à 1h, de acordo com o prefeito, principalmente para os bairros Feitoria e São Geraldo. “Qualquer enchente que der ali, as pessoas têm que sair, sabem que a água vai chegar dentro de casa, porque os loteamentos foram feitos na década de 80, no leito do rio”, afirma ele. O acompanhamento de eventos meteorológicos do município é feito com base em dados públicos e também da MetSul, conforme o prefeito. “A gente tem um sistema bastante eficiente nesse aspecto de monitoramento”, avalia Vanazzi.

Foto: Thales Ferreira / Prefeitura de São Leopoldo / Divulgação/ CP

Maior prevenção passa por uma legislação mais rígida

Caraá foi o município com o maior número de desaparecidos e também de mortos do Estado. Até o momento, cinco vítimas fatais foram identificadas na cidade e não há mais desaparecidos registrados, conforme a Defesa Civil de Caraá. O prefeito, Magdiel dos Santos Silva, diz que havia monitoramento da Defesa Civil municipal. “Nós tínhamos uma previsão de chover 140 milímetros”, afirma o prefeito. 

Ele garantiu que haviam se mobilizado para abrigar as pessoas no CTG Sentinela dos Sinos, caso houvesse desabrigados e que divulgaram o alerta pelas mídias sociais. Após o evento, além de pensar na reconstrução, Magdiel garante que o município se prepara para melhorias. Entre elas, estão reforçar sua Defesa Civil, implementar um posto do Corpo de Bombeiros em Caraá e o pedido para que a Sema faça o desassoreamento dos rios. “Estamos preparando um plano em vista desse desastre que ocorreu. Vamos fazer um zoneamento em todas as áreas que ficaram afetadas”, detalha o prefeito, que diz preparar, agora, uma “cidade inteligente”.

A preocupação com o leito dos rios e as moradias construídas no chamado leito maior é também compartilhada por especialistas. O biólogo Rafael Altenhofen afirma que esse é um problema tanto em municípios da bacia do Caí, do qual preside o comitê, como em outros pontos do Estado. Segundo ele, mudanças na legislação modificaram as faixas de Área de Preservação Permanente (APP), facilitando construções em locais que deveriam ser considerados de risco, devido a inundações, que ocorrem quando o rio enche e ocupa seu leito maior. Rafael explica que alguns municípios acabam não contemplando algumas legislações para construir nessas áreas devido à quantidade de leis que precisam ser observadas. “É bom, para garantir o interesse da coletividade, o ambiente equilibrado a todos e principalmente também ver os riscos a vidas humanas e atividades”, avalia o biólogo.

Além da mudança na exploração imobiliária próximo aos rios, o especialista defende que precisa ser modificado o processo de alerta. Ele afirma que para inundações, os avisos foram em tempo hábil, pois demoram horas entre o início das chuvas e a cheia dos rios que causa a inundação. Porém, para enxurradas, em trechos altos, o biólogo aponta atraso, visto que elas acontecem em poucas horas. Rafael acredita que é preciso construir uma cultura semelhante à dos Estados Unidos, onde as populações estão habituadas a receberem os avisos e deixarem suas casas ou reforçarem a segurança delas, ainda que os fenômenos acabem não chegando ao local. “O risco de descrédito pode existir, de eles emitirem esse aviso e não acontecer, desviar esse Ciclone, mas é melhor o descrédito e todo mundo vivo do que deixar para ver na hora, quando não dá mais tempo de tomar ações”, argumenta o profissional.

Foto: Guilherme Almeida

A importância dos alertas preventivos*

O desastre do ciclone foi um dos maiores da história gaúcha, com mais vítimas fatais que o furacão Catarina de 2004 ou o ciclone bomba de 2020. Embora não se possa de momento se estabelecer uma conexão do ciclone de dias atrás com as mudanças climáticas, a tendência no Brasil e no mundo é de aumento de eventos extremos. Como os desastres naturais não vão deixar de ocorrer, a comunidade científica na Meteorologia se concentra cada vez mais em mitigação de riscos e em como comunicar ao público e aos tomadores de decisão nos setores público e privado de forma eficiente os riscos meteorológicos e climáticos.

Os Estados Unidos possuem atualmente o que se considera o mais complexo e abrangente sistema de alerta, embora não seja perfeito. Afinal, o país tem dimensões continentais e o clima mais extremo do planeta.

Isso levou ao longo de muitas décadas à formação de cultura meteorológica e de prevenção, da base da sociedade aos mais altos escalões de governo. O “ver pra crer” normal no Brasil é raro e tanto público como governantes levam a sério e se mobilizam já antes dos eventos extremos, e não apenas após como ocorre aqui no país.

A legislação norte-americana permite decretar emergência ainda com sol, antes mesmo de o fenômeno severo chegar, como, por exemplo, um furacão, a fim de mobilizar recursos com base nos alertas da Meteorologia. 

A Meteorologia pública está muito mais estruturada que no Brasil pela NOAA, a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera, com seu Serviço Nacional de Meteorologia (NWS). Os aportes bilionários em investimentos sequer podem ser comparados.

Há, por exemplo, um centro especializado em tempestade severas e tornados (SPC) e outro dedicado apenas a ciclones tropicais, o conhecido Centro Nacional de Furacões (NHC na sigla, em inglês). Estes dois centros reúnem meteorologistas especializados e que se dedicam a estudar ou prever só o tipo de fenômeno que estão trabalhando diariamente. Não bastasse tudo isso, o National Weather Service possui 122 escritórios locais de previsão e seis centros regionais. Só o estado da Flórida, por exemplo, possui seis escritórios de previsão. Estes escritórios locais operam 24 horas por dia e trabalham com equipes reforçadas em momentos de crise. O sul do Brasil, por exemplo, tem apenas um centro local (distrito) do Instituto Nacional de Meteorologia, que funciona em horário comercial.

A multiplicidade de centros lá permite ainda que os meteorologistas sejam especialistas e grandes conhecedores das particularidades do clima local onde atuam, acumulando uma experiência que faz muita diferença ao prognosticar toda a sorte de situações extremas porque muitas vezes já passaram por quadros extremos semelhantes antes.

Os textos dos alertas são exaustivamente detalhados e específicos para cada situação, jamais padronizados como ocorre muitas vezes aqui e com linguagem não raro dura como “condições de difícil sobrevivência”. A Meteorologia, pelos centros nacionais e locais, ainda faz uso sistemático de redes sociais antes, durante e depois dos episódio de tempestades para orientar a população, 24 horas por dia, sobre como prevenir riscos. 

As diferenças não param por aí. O público tem um nível de atenção com a Meteorologia muito maior. Há uma cultura meteorológica mais enraizada na sociedade, o que se reflete na mídia, que leva para as capas dos jornais e telejornais os alertas da Meteorologia antes dos desastres, com base nas previsões, e não apenas depois como é a regra aqui.

As emissoras locais de televisão possuem equipes de meteorologistas que apresentam em generosos espaços nos telejornais a previsão, ao contrário do Brasil. Como são profissionais da previsão e elaboraram o prognóstico, possuem a compreensão da gravidade em situação de risco e melhor comunicam o perigo.

É o que permite que canais locais deixem de exibir programação nacional para levar ao ar coberturas especiais ininterruptas de horas sob tempo severo, orientando a população em tempo real sobre o que está ocorrendo e está por vir.

A forma como os avisos graves são massificados também é muito diferente. Aqui no Brasil, alertas da Defesa Civil são transmitidos por celular via SMS, mas apenas para quem se cadastrou. E os textos são simplórios, pouco informativos, via de regra padronizados, seja a previsão de chuva de 100 mm (baixo impacto) ou 500 mm (catastrófica).

Nos Estados Unidos, ao contrário, com décadas de investimento e aprimoramento com testes rotineiros, há o Sistema de Alerta de Emergências (EAS) em que avisos são disparados para todos os celulares que estão na área indicada como de risco, esteja ou não a pessoa cadastrada. Trata-se do WEA (Wireless Emergency Alerts).

No Brasil, a cidade do Rio de Janeiro tem exemplos de prevenção eficiente. Montou uma rede de sirenes e treinou as comunidades sobre como reagir ao aviso das sirenes em chuva intensa. De alto risco de inundações repentinas e deslizamentos, os municípios de encostas da Serra e entre os morros do Litoral Norte deveriam ter sistema semelhante e que poderia ter evitado mortes no desastre de dias atrás.

*: Por Estael Sias

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895