Baixa no rio dos Sinos não afeta abastecimento, mas gera atenção em São Leopoldo

Baixa no rio dos Sinos não afeta abastecimento, mas gera atenção em São Leopoldo

Curso d'água sofre com a estiagem e moradores relatam alternativas para consumo

Felipe Faleiro

Aposentado Augusto Paulo de Oliveira construiu casa para o irmão em uma das margens do Sinos

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O aposentado Augusto Paulo de Oliveira, 69 anos, olha com afeto para o rio com o qual convive desde criança, seja pescando, passeando de caiaque ou simplesmente admirando. “Aqui é muito bom, só tinha que ser melhor cuidado”, afirma ele, que mora no bairro Scharlau, em São Leopoldo. O curso em questão é o rio dos Sinos, que serpenteia pelo vale que abrange uma das regiões mais populosas do Rio Grande do Sul, abastecendo cerca de 1,4 milhão de pessoas. 

Ainda que belo e tortuoso, o Sinos sofre desde há muito tempo com a poluição, e nos últimos meses, principalmente, com a seca. “Gosto daqui. Me criei aqui, e agora estou construindo para meu irmão”, conta Augusto, falante e simpático, e que, na realidade, não vive mais nas margens do rio. Já o irmão, o auxiliar de serviços gerais Pedro Paz de Oliveira, 65, mora em uma casa simples em um terreno no bairro São Miguel. O local fica em uma travessa, cuja chegada é precedida pela passagem por um muro alto de contenção, construído há décadas para evitar as tão temidas enchentes a partir do rio.

Cerca de 100 metros adiante, em uma das inúmeras voltas do Sinos na planície, homens jogam uma linha de pescar, esperando retirar das águas seu sustento. “Dá para consumir o peixe daqui. Se não pudesse, com certeza eu já estaria morto”, comenta Pedro, relativizando o fato que o Sinos já apareceu na indesejável lista dos dez mais poluídos do Brasil, e no pódio entre os cursos d’água gaúchos. Em um passado não muito distante, afirma ele, havia mais residências nas duas margens, mas a erosão fez com que os antigos moradores fossem obrigados a se mudar.

O curso d’água do rio dos Sinos está mais baixo que o habitual, e Augusto precisa erguer a mão no alto para mostrar onde ele normalmente alcança. “Dá uns três a quatro metros de diferença. Em alguns locais é possível atravessar a pé, enquanto em outros, ainda é fundo, como aqui”, pontua ele, caminhando em um barranco onde deveria haver curso. Às 9h desta segunda-feira, o nível do rio na Elevatória de Água Bruta (EAB), mantida pelo Serviço Municipal de Água e Esgotos de São Leopoldo (Semae), estava em 1,30 metro, considerado baixo.

Já na régua de medição da Agência Nacional de Águas (ANA), a altura estava em apenas 52 centímetros. Conforme o Semae, a captação na EAB pode ser mantida mesmo com os níveis críticos, abaixo de 1 metro, em razão da disponibilidade de seis motobombas operando em sistema anfíbio, ou seja, dentro e fora da água. Já na captação do Semae, as bombas funcionam submersas. Uma das estações de tratamento de água (ETA) da cidade passou por reformas em um floculador, e três reservatórios devem ser construídos na zona Norte leopoldense. 

No entanto, de qualquer forma, a atual situação faz com que o órgão municipal oriente a população a economizar água. A seca causa apreensão contínua, já que os agricultores locais têm a captação suspensa no momento em que o rio atinge uma cota mínima de 50 centímetros no município de Campo Bom ou 1,20 metro em São Leopoldo. “Há um acordo entre produtores rurais e operadoras. Estamos monitorando a situação desde 12 de dezembro”, afirma a presidente do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (Comitesinos), Viviane Machado.

Augusto afirma não consumir a água do Sinos, tampouco Pedro, atualmente doente e recebendo cuidados do irmão, que ainda ajudou a construir a casa com caixa d’água e captação por poço artesiano. Alguns vizinhos, pelo contrário, bebem diretamente do rio, segundo ele. No entanto, o aposentado relata esperança e certa nostalgia. “Daqui a algum tempo, vou voltar aqui e andar novamente de caiaque”, conta, acrescentando que o equipamento está bem guardado ali próximo, esperando cair nas águas turvas mais uma vez.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895