"Cheguei aqui e foi um choque”: os relatos de moradores afetados pelos efeitos do temporal
Inúmeros bairros seguem sem luz e água um dia após a passagem da tempestade
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Porto Alegre ainda vive nesta quinta-feira o fantasma da destruição, com centenas de árvores e postes caídos e muito trabalho para sua remoção. Equipes das companhias e da Prefeitura, mas principalmente moradores, procediam com a retirada, cada um a seu modo. Eles lamentavam terem suas casas destruídas, destelhadas ou isoladas, ainda devido ao temporal da noite de terça-feira e madrugada de quarta.
Com exceção do Extremo Sul, a cidade inteira seguia afetada de alguma forma, seja pelo desabastecimento de água, falta de luz, problemas no trânsito ou todos estes. Na rua Pedro Boticário, bairro Glória, na zona Leste, três vegetais de grande porte caíram um após o outro, no mesmo sentido. Um deles caiu sobre o muro e a área externa de uma residência, outro na calçada e um terceiro sobre o portão de uma oficina de automóveis.
O mecânico Armando Abreu, também proprietário do local, observava na manhã de hoje a situação. Ele contou que não estava em Porto Alegre no momento da queda, e não havia o que fazer. “Cancelamos todos os serviços que tínhamos agendado. Felizmente, não atingiu nenhum carro que estava no conserto”, comentou ele. Ali perto, moradores utilizavam uma motosserra, assim como havia sido recomendado pelo prefeito Sebastião Melo, para remover alguns galhos maiores.
Uma professora de uma creche particular da área contou ainda que reabriu o local na quinta, após um dia sem aulas. Apenas três alunos compareceram. “Estou indo no mercado buscar água para os pequenos, e nem sei se vai ter”, afirmou ela, que não quis se identificar. Na rua 8 de Julho, bairro Jardim Botânico, o aposentado Francisco Waldomiro Constant, 70 anos, lamentou o destelhamento de sua residência simples.
No terreno, ele vive com a mulher e dois filhos. “Tudo o que eu quero é conseguir falar com a Defesa Civil, para obter algum tipo de ajuda. Não estou conseguindo falar pelo telefone”, disse ele. “Se não conseguir, vou acabar indo a pé mesmo.” Ele conta que não teve dinheiro para terminar a casa, e viu praticamente o sonho de uma vida literalmente voar pelos ares. “Cheguei aqui e foi um choque. Agora não sei o que fazer”.
No bairro Cristal, o casal Dario e Anete Soares, ambos aposentados, observavam parte de uma grande árvore que fica em uma residência e bloqueou a esquina das ruas Inhanduí e Upamaroti. Quando caiu, o vegetal também destruiu parte da grade do local. “Não sou contra árvores, mas é preciso ter uma poda responsável. O restante que permaneceu, se cair, pode matar alguém”, alertou Dario.
Ainda conforme ele, a região estava sem luz havia dois dias hoje pela manhã, e outro problema surgido foi o furto de fios, que também começou a preocupar os moradores. “Estamos vendo inclusive pessoas que não têm o aspecto de humildes fazendo isto”. Na rua Ursa Maior, ainda no Cristal, o casal Ricardo e Cristina Barreto, que mantêm um comércio há 30 anos, afirmaram que até haviam deixado de contatar a CEEE Grupo Equatorial, devido à falta de expectativas para atendimento.
“Estamos produzindo somente pão, e na padaria de um amigo que nos cedeu. Não temos muitas esperanças, e agora é esperar pela vontade de Deus”, comentou Ricardo. De acordo com ele, alguns alimentos perecíveis, como frios, estavam sendo acondicionados em caixas de isopor, solução paliativa para o problema. Ali próximo, outras árvores caíram, inclusive sobre muros. A Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) informou no começo da tarde desta quinta 132 ocorrências de bloqueios de via devido ao temporal.
Destes, 52 haviam sido totais pela queda de árvores, outros 12 por postes ou fios caídos e um por acúmulo de água. Ainda havia 67 bloqueios parciais. A EPTC também afirmou que trabalha com “força total”, mobilizando cerca de 400 servidores em quatro turnos, entre agentes de fiscalização de trânsito e transporte, equipes de manutenção elétrica, atendimento ao cidadão e na central de controle. Outros 120 semáforos seguiam fora de operação. A trincheira da Ceará, um dos principais pontos de acesso da Capital, e que estava bloqueada pelo acúmulo de água, foi liberada.