Estiagem causa preocupações e prejuízos a produtores rurais do interior de Viamão

Estiagem causa preocupações e prejuízos a produtores rurais do interior de Viamão

Município decretou situação de emergência após perdas de R$ 60 milhões no campo

Felipe Faleiro

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A Grande Porto Alegre está sofrendo de maneira intensa com os efeitos da estiagem que prejudica também o restante do Rio Grande do Sul. Populosa e ao mesmo tempo ladeada por rios e matas, a região vê, dia após dia, o aumento do número de municípios em situação de emergência, dados os prejuízos na agricultura, que vêm superando continuamente cifras milionárias. Em Viamão, algumas lavouras ainda resistem bravamente ao sol a pino e às máximas que encostam nos 40ºC. No entanto, grande parte delas está perdida, de acordo com a Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento (Seagri).

Apenas no município, as perdas superam R$ 60 milhões, e podem aumentar com o prosseguimento da estiagem. As estradas do interior, muitas de terra e que conduzem às plantações, passam por variedades bastante desgastadas com a insolação. “Com a estiagem, os produtores de milho aceleraram para colhê-lo mesmo seco e aproveitá-lo para a silagem. Já a soja está no meio do ciclo, então grande parte dela está comprometida”, afirma o secretário de Agricultura de Viamão, Henrique Noronha, que acrescenta: “Moro aqui há 19 anos e nunca havia visto nada neste nível. Vamos ter pela frente alguns meses de enfrentamento destas dificuldades”.

Em Costa do Oveiro, a 38 quilômetros da sede, a família do produtor Paulo Sérgio Fraga Vieira tem uma propriedade de 15 hectares há quatro gerações. Para chegar até lá, é preciso andar por volta de 15 quilômetros em estrada de chão. Ele, seu pai Paulo Roberto da Silva Vieira e sua mãe, Jorcelei de Fraga, plantam milho e mantêm um açude de meio hectare, que está completamente seco. Agora, há apenas alguma umidade onde antes existia água em abundância. “Nunca tínhamos passado por isso. A gente pescava aqui. Estamos com 100% dos animais bebendo água de bebedouro”, comenta ele.

Poucos anos atrás, a área plantada aumentou dos antigos oito hectares para os atuais 12, em razão do aumento da criação de bovinos. Atualmente, são 25 vacas em confinamento, além de 14 novilhas e seis vacas secas. Vieira estima que, no mínimo, 50% do milho, variedade utilizada para alimentação dos animais, está perdida, bem como 40% da produtividade do leite. “Chegamos a atingir aqui 600 litros por dia, e agora estão 330, 340. Se continuar secando, vou perder bem mais”, lamenta. Viamão tem a maior área geográfica de todas as cidades metropolitanas, grande parte dela no meio rural, o que causa significativos efeitos locais.

“Cada dia, a situação está pior”, comenta o extensionista rural da Emater/RS - Ascar de Viamão, Gladimir Ramos de Souza. Ele afirma que há lugares no interior do município em que choveu 15 milímetros, enquanto em outros, a chuva foi de 70 milímetros. Na média municipal, porém, a precipitação é baixíssima. Conforme o decreto que baseou o pedido de situação de emergência, e assinado pelo prefeito Nilton Magalhães na última terça-feira, choveu apenas 58 mm desde agosto de 2022. Na manhã desta quinta-feira, Souza esteve na propriedade de Vieira para observar a área.

O milho está seco e baixo, a terra se solta na pisada e há exemplares do vegetal sem condições mínimas de desenvolvimento no solo. Há partes em que ele subiu a apenas um terço da altura natural para a época. “Falei com dois produtores de hortaliça, como alface e rúcula, e já perderam 100%. A pessoa está sem renda, não tem como plantar. Eles estão comprando de outras regiões que estão produzindo e revendendo, para poder ter uma renda. Nesse caso, o prejuízo supera R$ 50 mil”, conta o extensionista da Emater.

Ocorre que o grão cresce menos e perde qualidade em meio à estiagem, o que frustra também os clientes da produção. O quarto ano seguido de seca no Estado, com a atual sendo a pior de todas, traz reflexos mensuráveis no papel, mas ainda não plenamente calculados na vontade dos produtores de permanecer no campo. “O último inverno teve pouca chuva. Entramos no verão com pouca reserva de água. Os banhados e nascentes não se recuperaram. O verdureiro até consegue vender semanalmente para ter uma renda mínima, mas estes produtores de grãos, como milho, soja e arroz, estão abandonando a terra e isto é uma família a menos produzindo comida”, explica Souza.

Buscando reduzir os efeitos da seca, muitos produtores de Viamão têm recorrido ao crédito rural, prática que tem aumentado substancialmente nas últimas semanas, e solicitado esta intermediação junto à Emater. Outros buscam cavar novos poços artesianos e construído cisternas para, pelo menos, trazer um pouco de água fresca aos animais de sua criação. “Temos pessoas sem água até para beber. Assim, estamos fazendo contato com o município para que ele possa levá-la com caminhão pipa. A situação é muito complicada e esperamos que, com o decreto, haja políticas públicas federais e estaduais para amenizar esta situação”, comenta o extensionista rural.


Correio do Povo
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