Moradores da região das Ilhas em Porto Alegre enfrentam inundações após ciclone

Moradores da região das Ilhas em Porto Alegre enfrentam inundações após ciclone

Após passagem do ciclone, a preocupação é com a cheia dos rios e do Guaíba, que pode invadir casas e causar mais transtornos

Kyane Sutelo

Mesmo em meio à inundação, moradores da Ilha das Flores aproveitam o sol para secar roupas.

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A região das Ilhas, em Porto Alegre, vive impactos do ciclone extratropical que atingiu o Rio Grande do Sul. São as inundações que tradicionalmente afetam as comunidades ribeirinhas. As casas de madeira, comumente construídas metros acima do nível do rio, evitam que as águas danifiquem os móveis e itens pessoais, mas não evitam outros transtornos diários.

Nesta sexta-feira, moradores se deslocavam por dentro da água, em pontos na altura da canela, outros acima do joelho tanto na Ilha das Flores como na Ilha da Pintada. A pescadora Cica Bittencourt mora na rua Nossa Senhora da Boa Viagem, na Ilha da Pintada, às margens do Jacuí, onde a água já invadiu a rua. “A gente está com muito medo, porque essa cheia está grande. Ali no rio Caí está tudo cheio. Então aqui pode subir um pouco mais”, conta ela.

A comunidade é habituada a monitorar fatores que impactam diretamente na realidade deles, como os demais rios e os ventos. “Estamos rezando para que não dê vento sul. Aí entra a água na casa”, detalha. O trabalho de pescaria dela e do marido está suspenso por enquanto, devido à correnteza. A pausa afeta o orçamento da família. “Somos nós e tem dois rapazes que trabalham com a gente, que tem que pagar, então é prejuízo”, explica.

Além disso, em momentos de eventos climáticos como este, a tensão é constante. “Se um dorme o outro fica atento”, conta ela, que disse já ter colocado o carro na garagem de um familiar antes da inundação e ficar atenta para erguer os móveis.

Realidade semelhante vive Luiza Andressa Benitez Machado, da Ilha das Flores. Nesta sexta-feira, ela estendia roupas no varal, em meio às águas, para aproveitar o sol que surgiu após dias nublados e de chuva devido ao ciclone. "É todo ano, aí não tem o que fazer. A gente tem que continuar fazendo as coisas", disse a dona de casa, conformada. Ela, que mora na Ilha das Flores junto com os três filhos, conhece bem essa realidade, pois foi criada na região. 

Enquanto a filha mais velha, de 13 anos, ajudava Luiza, a mais nova, de 8, brincava com uma amiga da vizinhança, usando botas de borracha. As crianças são a maior preocupação dos pais com a inundação, pois contam que é comum aparecer diversos tipos de animais nas casas. “Aparece de tudo. Já teve lacraia, aranha, formiga, a gente fica com medo pelas crianças”, contou a vizinha Carina dos Santos, que também vive com três filhos no local. “Os bichos tentam fugir da água e sobem”, observou Luiza.

O aposentado Luis Isaías Pires Bettervide, que se apresenta como líder comunitário da região, afirmou que os problemas são constantes e não há ações efetivas do poder público. Ele contou que, no local, a falta de saneamento é um dos fatores que prejudica a comunidade e o meio ambiente.

Segundo o morador, desde 2014, se desenrola um processo que envolve realocação das famílias, devido às obras da ponte do Guaíba. Porém ele salientou que é preciso mais do que retirar as pessoas dali e colocar em novas casas. “Como as pessoas não têm escolaridade, nem profissão, seria primeiro um processo de inserir essas pessoas na sociedade e dentro de um plano de habitação”, avalia o Bettervide.

A Defesa Civil de Porto Alegre garantiu que realiza vistorias no local desde o início da semana, em função de ser região de risco para inundações. O órgão solicita que, se alguém tiver problemas, deve entrar em contato pelo 199, que será atendido.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895