Morre Jorge Garcia, líder espiritual do povo indígena Kaingáng
"Kujá" Garcia tinha 102 anos e deixa um legado cultural marcado pela preocupação com a identidade do seu povo
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O "Kujá" Garcia, que no idioma Kaingáng representa a liderança espiritual, faleceu na terça-feira, em Nonoai, no Rio Grande do Sul, aos 102 anos de idade. Ele deixa um legado cultural marcado pela preocupação com a identidade Kaingáng.
O ancião e Mestre da Cultura Kaingáng, era detentor de largo conhecimento das práticas ancestrais espirituais do seu povo, um exímio educador e contador de histórias, apegado à terra e aos valores relacionados a identidade Kaingáng.
A caminhada do ancião Jorge Garcia se encontrava fortemente voltada à educação Kaingáng e sua forma tradicional de ensino e aprendizagem, baseada na oralidade e transmitida na figura dos mais velhos, uma prática historicamente mantida na cultura Kaingáng.
Suas “aulas”, à sombra das araucárias, eram cercadas por questionamentos que traziam profundas reflexões sobre a vida, a identidade e as tradições Kaingáng, e que formam agora parte do seu legado cultural, registrado na mente e coração do seu povo e ouvintes, ainda em livros, fotos, audiovisuais e entrevistas concedidas pelo Mestre da Cultura Kaingáng.
Garcia tinha por nome indígena “Kagnãn”, e vivia na Terra Indígena Nonoai, onde nasceu em 10 de agosto de 1921, mesmo local de seu falecimento. O ancião recebeu o prêmio Trajetórias Culturais/Mestra Sirlei Amaro pelo Governo do Rio Grande do Sul, junto do filho e sucessor, Pedro Garcia, reconhecido na mesma edição do prêmio em 2021.
Ao lado da esposa Maria Constante e do filho Pedro, Garcia contribuiu para a pesquisa, registro e divulgação de sua cultura como colaborador importante do Instituto Kaingáng, organização indígena do povo Kaingáng que atua na valorização da educação e cultura Kaingáng. Era bastante ativo em trabalhos de caráter espiritual, educativo e cultural nas comunidades Kaingáng, em escolas, universidades e espaços museológicos.
Defensor do uso sustentável da terra, o Kujá Jorge Garcia era crítico ao plantio da monocultura nos territórios Kaingáng e deixa seu povo em um momento de acirramento de conflitos nas terras indígenas no Sul e Sudeste do Brasil, onde uma crise de valores tradicionais afeta as lideranças Kaingáng. O texto e a foto foram produzidos pela jornalista indígena Sônia Kaingáng.