Movimentos ambientalistas comemoram suspensão de obras no Parque Harmonia

Movimentos ambientalistas comemoram suspensão de obras no Parque Harmonia

Prefeitura anunciou que recorreria da decisão por meio da Procuradoria-Geral do Município (PGM)

Felipe Faleiro

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Após o 10ª Vara da Fazenda Pública determinar a suspensão total e imediata das obras no Parque Harmonia, em Porto Alegre, os movimentos ambientalistas comemoram a decisão da juíza Gabriela Dantas Bobsin. O tribunal também determinou multa, sem valor definido, à GAM3 Parks, concessionária administradora do parque, em caso de descumprimento da medida. A Prefeitura, por sua vez, anunciou que recorreria da decisão por meio da Procuradoria-Geral do Município (PGM).

Para Paulo Brack, coordenador-geral do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) e professor do Departamento de Botânica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), a decisão da 10ª Vara da Fazenda Pública “já era esperada”. “A juíza deve ter ficado sensibilizada com a situação. É importante que as obras sejam suspensas, porque os danos ao parque são muito grandes. Já houve uma devastação muito grande ali, e uma falta de cuidado com relação às árvores. Há uma série de situações que precisam ser esclarecidas”, comentou ele.

Brack também classifica como “grande equívoco” o “ataque contra ambientalistas”, especialmente após o episódio do último domingo, em que tradicionalistas e inclusive o vice-prefeito Ricardo Gomes estiveram em um protesto na Rótula das Cuias, ao lado do parque, pela manutenção do Acampamento Farroupilha em Porto Alegre. Os piqueteiros criticam as ações dos movimentos ambientais e os acusam de travar a obra, o que deixaria o Harmonia, em tese, sem condições de recebê-los a partir do próximo dia 12, quando ocorre a entrada dos piquetes. “Nossa luta é comum, estamos defendendo a natureza”, argumenta o professor.

Um dos autores da ação, o vereador Marcelo Sgarbossa, disse que as obras no parque “devem ser uma preocupação de todos os gaúchos”. “[A suspensão] é uma ótima notícia, e deve agradar a toda a cidade. Hoje é um dia de alívio. O que está ocorrendo ali é uma verdadeira devastação, e está na contramão do mundo. Todos caminham para deixar as cidades ambientalmente sustentáveis. Portanto a obra, como está, não faz sentido algum. Este não é um tema ideológico”, observou ele, para quem “os tradicionalistas também querem um parque arborizado, não uma ilha de calor”.

Em nota assinada por sua presidente, Ilva Maria Borba Goulart, e pelo vice-presidente da Fundação Cultural Gaúcha (FCG/MTG), o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) disse que não manifestaria opinião, mas ressaltou entender que o Acampamento e as pessoas que realizaram a festividade desde 1987 “não merecem passar por tal situação”. “Como membro da Comissão Municipal, lamentamos profundamente todos os acontecimentos que envolvem um dos maiores eventos do nosso estado”, e afirmou ter “plena certeza de que tudo vai se resolver da melhor forma”, com “respeito e diálogo”.

Decisão judicial

A juíza se baseou nas declarações da arquiteta Eliana Castilhos, autora do Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) do projeto de revitalização do parque, que disse, no último dia 11 de julho, em reunião da Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara Municipal, que o projeto em questão “não é o que foi aprovado” pelo Conselho do Plano Diretor, e que as mudanças feitas posteriormente “não foram autorizadas”.

Outra alegação aceita pela magistrada foi a do também arquiteto Alan Cristian Furlan, ex-diretor da GAM3 Parks, que fez uma denúncia ao Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RS (CAU-RS) e ao Ministério Público gaúcho (MPRS), relatando que, entre outras medidas, o projeto original faria intervenções em pouco mais de cem árvores, enquanto o posterior indicava 432. Em resposta, a concessionária afirma que busca não atingir este mínimo. Na semana passada, antes desta suspensão, o Ministério Público de Contas (MPC-RS) havia encaminhado representação ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) pedindo “auditoria urgente” nas obras, pelos mesmos motivos aceitos pela juíza da 10ª Vara da Fazenda Pública para deferir a liminar.

“Verifica-se que as intervenções que deveriam ser mínimas conduzirão praticamente à extinção de 1/3 das árvores do Parque da Harmonia, já que previsto sejam extirpadas mais de 400 árvores do local, além de obras de arte e do acervo histórico e cultural portoalegrense, patrimônio imaterial irrecuperável, sem contar que desalojada a fauna ali presente e que se valia da vegetação para a sobrevivência, no rigoroso inverno”, escreveu ela. Na manhã de ontem, apesar da determinação, as obras seguiam normalmente, e a Prefeitura justificou que era em razão de ainda não haver sido notificada.

Outro lado

Ontem pela manhã, em nota, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) disse que “reitera sua confiança na integridade e legalidade das obras executadas pela GAM3 Parks”, e que “já forneceu os esclarecimentos necessários sobre a obra durante visita ao parque e também ao entregar documentação solicitada” pelo MPRS e Cosmam. Ainda ressaltou que “reconhece a importância dos órgãos de controle no desempenho de suas atividades de fiscalização e reforça sua convicção na transparência e legalidade do processo”.

De acordo com o titular da Smamus, Germano Bremm, não houve qualquer irregularidade constatada pelos órgãos fiscalizatórios em relação ao projeto da obra e sua realização, e há acompanhamento técnico adequado. “Atuaremos para responder a decisão ao Judiciário, e ela é em caráter liminar, ou seja, não houve ainda intimação ou oportunidade do município apresentar sua defesa. A ação se pauta basicamente em matérias de jornais”, observou ele, acrescentando que a paralisação “trará prejuízos à obra e à montagem do Acampamento Farroupilha”.

Sobre a ação dos movimentos ambientalistas, o secretário afirma respeitar todas as visões. “Vivemos em um estado democrático de direito, e todas as manifestações são legítimas. O que temos de evoluir, é que neste caso específico, seguimos estritamente o que rege a legislação”, apontou Bremm. A presidente da Comissão Municipal dos Festejos Farroupilhas, Liliana Cardoso, reforça que a suspensão afeta a realização do acampamento, porém diz que “não iremos recuar” e que o evento vai sair. 

Hoje, às 19h, ocorre a entrega dos alvarás aos 233 piqueteiros inscritos na Casa do Gaúcho, dentro da estrutura do parque. “Recebemos com muita tristeza esta notícia. Não estão vendo os impactos que pode causar no Acampamento Farroupilha. Mas seguiremos na luta”, afirmou ela. O presidente da Cosmam, o vereador José Freitas, disse que o grupo recebeu as mesmas manifestações do grupo ambientalista e da GAM3 Parks que foram encaminhadas ao MPRS. 

“Acreditamos que havia uma denúncia grave de mudança do projeto original e enviamos ao órgão competente”, comentou Freitas. “Dentro do que a Smamus e a empresa me passaram, acredito que está tudo dentro do esperado, e as alterações que houveram não precisariam passar por nova aprovação por parte da comissão. Acredito que a Prefeitura e a GAM3 Parks não fariam nada fora do contexto”, acrescentou.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895