Pesquisa do Moinhos de Vento revela alta prevalência de casos de sífilis em Porto Alegre

Pesquisa do Moinhos de Vento revela alta prevalência de casos de sífilis em Porto Alegre

Para a realização da pesquisa foram realizados 10.878 testes de sífilis, HIV e hepatites entre agosto de 2021 a outubro de 2023.

Paula Maia

De acordo com a responsável técnica da pesquisa, Eliana Wendland, os resultados evidenciam a necessidade contínua de estratégias de prevenção e educação, especialmente entre a população jovem

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O Hospital Moinhos de Vento, em colaboração com o Ministério da Saúde, através do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde, divulgou nesta segunda-feira os resultados do projeto SIM, que coletou dados e monitorou estratégias de tratamento e combate à sífilis. 

Para a realização da pesquisa foram realizados 10.878 testes de sífilis, HIV e hepatites entre agosto de 2021 a outubro de 2023. Das pessoas testadas, 55,7% foram mulheres. O percentual de testes positivos para sífilis foi de 14,3%, para HIV, de 2,8%, para hepatite C, de 2,6%, e para hepatite B de 0,3%. Após a confirmação diagnóstica, a taxa de pessoas com sífilis ativa foi de 3,74% em dois anos ou 1.878,7/100.000 habitantes por ano – muito superior as taxas de notificação oficiais.

De acordo com a responsável técnica da pesquisa, Eliana Wendland,  os números revelados contrastam significativamente com os dados do boletim epidemiológico, mostrando uma discrepância entre os casos notificados e os casos diagnosticados diretamente na população. Essa diferença destaca a importância de avaliar não apenas os casos notificados, mas também os casos diagnosticados diretamente na comunidade.

“Nós encontramos taxas muito altas de sífilis na população de Porto Alegre, quando a gente compara com o boletim, são números astronômicos.  Enquanto a gente tem ao redor de 50 ou 100 por cada 100 mil habitantes, aqui nós temos 1.800 por 100 mil habitantes, então é um número muito grande, mostrando ainda o quanto nós não diagnosticamos as sífilis como nós deveríamos”, ressaltou a médica.

Os dados demográficos dos casos ativos indicam uma predominância de homens, principalmente na faixa etária mais jovem, com maior incidência entre aqueles com ensino médio e técnico. Além disso, a análise revela uma relevância da raça preta e parda e das classes sociais C, I, D e E nesses casos. Quanto à situação conjugal, observou-se que a maioria dos casos estava relacionada a pessoas em relacionamentos amorosos.

De acordo com Eliana, esses resultados evidenciam a necessidade contínua de estratégias de prevenção e educação, especialmente entre a população jovem, enfatizando a importância do monitoramento e tratamento adequado da sífilis ativa. 

Além dos dados numéricos revelados, a especialista compartilhou algumas percepções durante a análise dos resultados do projeto SIM. Destacou-se que cerca de 20% das pessoas não estão conscientes de que uma pessoa grávida com sífilis pode transmitir a doença para o filho, enquanto uma grande proporção, 88,4%, expressou disposição em mudar suas práticas sexuais se informadas por um profissional de saúde sobre a sífilis. Elaina enfatizou que essa disposição é uma notícia promissora, demonstrando que a informação fornecida pelos profissionais de saúde pode influenciar positivamente os comportamentos em relação à prevenção.

Outro ponto relevante destacado foi a constatação de que aproximadamente 35% das pessoas desconhecem ou acreditam erroneamente que a sífilis não pode ser contraída por meio de relações sexuais orais, evidenciando uma lacuna no conhecimento sobre a transmissão da doença. Além disso, aproximadamente 30% das pessoas acreditam erroneamente que, após contrair sífilis uma vez, não é possível contrair novamente ou desconhecem a possibilidade de uma reinfecção. A questão da transmissão da sífilis pela amamentação foi abordada, ressaltando o equívoco de algumas pessoas que acreditam ser possível essa transmissão, mesmo que seja considerada altamente improvável.

A médica também revelou que 25% das pessoas não sabem ou acreditam que a sífilis não é uma doença curável, ignorando o fato de que a sífilis pode ser tratada com antibióticos.

“O tratamento é simples e está disponível nas Unidades Básicas de Saúde. Em três semanas as pessoas estão curadas, então é importante fazer esse tratamento. E mais importante ainda é falar de prevenção. É com isso que a gente vai quebrar essa cadeia e diminuir as taxas”.

Na conclusão da apresentação dos resultados do projeto SIM, a epidemiologista enfatizou a gravidade do problema da sífilis e doenças relacionadas em Porto Alegre, destacando que os dados de registro representam apenas uma pequena parte do que realmente está ocorrendo. Ela comparou essa situação a "apenas a pontinha do iceberg", ressaltando que os números reportados representam menos de 10% do panorama real.

A médica ainda destacou uma epidemia generalizada do HIV na cidade. Quanto à Hepatite B, há um caminho para sua eliminação, mas a Hepatite C ainda apresenta números consideráveis, embora não ultrapassem 1%. Ela lembrou que a Hepatite C é tratável e curável se diagnosticada e tratada adequadamente.

Ao refletir sobre as estratégias atuais, Eliana expressou a ideia de que os resultados, mesmo quando aparentemente negativos, não devem ser interpretados como tal. Ela destacou a necessidade de explorar novas estratégias de acesso à população para enfrentar os desafios identificados na pesquisa, reconhecendo que as ações existentes podem não ser as mais adequadas para abordar essa situação específica.


 


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