Dólar salta a R$ 5,32 com riscos fiscais da PEC dos benefícios

Dólar salta a R$ 5,32 com riscos fiscais da PEC dos benefícios

Moeda norte-americana avançou 1,73%, com cotação mais alta para um encerramento desde 4 de fevereiro

AE

Moeda norte-americana alcança menor patamar desde agosto

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A busca global pela moeda norte-americana diante de sinais de perda de fôlego da atividade na Europa e nos Estados Unidos, aliada ao aumento da percepção de risco fiscal com a tramitação da PEC dos Combustíveis no Congresso, pautou os negócios no mercado de câmbio local na sessão desta sexta-feira, 1º de julho. Após encerrar junho com alta de 10,15%, o maior avanço mensal desde março de 2020, o dólar emendou nesta sexta-feira o terceiro pregão seguido de valorização e fechou acima da linha de R$ 5,30 pela primeira vez desde 4 de fevereiro (R$ 5,3220).

O mercado já abriu sob impacto de dados ruins de atividade e inflação na Europa. O PMI industrial da zona do euro caiu a 52,1 em junho, menor patamar em 22 meses, embora acima da prévia. O CPI na zona do euro atingiu alta anual de 8,6% em junho, máxima história. Ainda pela manhã, veio a leitura fraca do PMI dos EUA medido pelo ISM de Chicago: queda de 56,1 em maio para 53 em junho, abaixo do previsto (54,3). O indicador se aproxima cada vez mais da linha de 50, que separa expansão de retração.

Não bastassem os ventos externos negativos, pesava sobre os negócios a ampliação dos gastos previstos na PEC dos Combustíveis, aprovada na quinta-feira de forma relâmpago em dois turnos no Senado com decretação do estado de emergência.

Já estavam na conta do mercado o aumento do Auxílio Brasil (de R$ 400 para R$ 600), a ampliação do vale gás e o voucher a caminhoneiros de R$ 1 mil mensais. No apagar das luzes, contudo, foram incluídos no texto o "auxílio-taxista", com custo de R$ 2 bilhões, e a adição de R$ 500 milhões para o programa Alimenta Brasil - o que elevou a fatura extrateto de R$ 38,75 bilhões para R$ 41,25 bilhões.

Chamado de "pacote de desespero" nos bastidores, por representar a principal cartada do presidente Jair Bolsonaro para tentar subir nas pesquisas de intenção de voto, a PEC dos Combustíveis pode também passar de forma expressa pela Câmara, ao ser acoplada a chamada PEC dos Biocombustíveis em tramitação na Casa.

"Esse aumento de gastos em ano eleitoral, com medidas para tentar angariar votos, piora muito a percepção dos investidores sobre a questão institucional. Isso tem aumentado a volatilidade da taxa de câmbio e levado a uma tendência de depreciação", afirma economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernando Consorte.

Foi em meio a esse painel adverso que o mercado abriu chutando o dólar rapidamente para cima de R$ 5,30. A máxima da sessão, a R$ 5,3382, veio ainda pela manhã. Ao longo da tarde, em meio a ajustes intraday, a moeda chegou a tocar o patamar de R$ 5,29, mas voltou a ganhar fôlego na última hora de negócios e fechou em alta de 1,65%, a R$ 5,2312. Com isso, encerra a semana com valorização de 1,30%. As perdas no ano, que já chegaram a superar 17%, estão agora abaixo de 5%.

No exterior, o índice DXY - que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes - trabalhou em alta ao longo de toda a sessão e chegou ao fim da tarde acima da casa dos 105,000 pontos, sobretudo em razão dos ganhos frente ao euro. Mesmo com a probabilidade de alta de 75 pontos-base da taxa básica americana neste mês caindo da faixa de 80% para 60% (segundo monitoramento do CME Group), a perspectiva ainda é de que o Federal Reserve será mais rápido que o Banco Central Europeu (BCE) no ajuste da política monetária.

"Vários dados ao longo desta semana aumentaram o temor de recessão nos Estados Unidos. Teoricamente, com a economia americana mais fraca, o dólar deveria perder valor. Mas o que estamos vendo é um movimento de 'risk off', o que potencializa o dólar e aumenta a busca por ativos mais seguros como as Treasuries", afirma a economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico.

A onda global de busca pelo dólar castiga todas as divisas emergentes, ressalta Damico. Na média, contudo, o real apresenta desempenho inferior a de seus pares em razão da percepção de risco fiscal com o decreto de estado de emergência. Há dúvidas se o aumento de gastos "ficará circunscrito" ao que está previsto na PEC. "A insegurança com a política fiscal no médio prazo tem atrapalhado bastante o real", diz a economista-chefe da Armor.

Taxas de juros

Os juros futuros encerraram a sessão regular em queda. O temor de recessão global traduzido no recuo expressivo dos rendimentos dos Treasuries trouxe alívio às taxas locais em geral, prevalecendo à pressão contrária da alta do dólar e do petróleo, num dia em que também matérias primas agrícolas tiveram queda generalizada.

Os indicadores de gerentes de compra (PMI, em inglês) industriais fracos nos Estados Unidos e na zona do euro reduziram as apostas de política monetária mais agressivas pelos bancos centrais. Por aqui, o cenário fiscal continua preocupante, mas a expectativa de aceleração no trâmite da PEC dos Benefícios para ser aprovada na semana que vem na Câmara sem alterações quanto ao texto que veio do Senado também ajudou a curva a fechar.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2023 fechou com taxa de 13,695%, de 13,79% no ajuste de quinta-feira, e a do DI para janeiro de 2024 caiu de 13,381% para 13,325%. O DI para janeiro de 2025 terminou com taxa de 12,63%, de 12,71%, e a do DI para janeiro de 2027, em 12,61%, de 12,65%. Na semana, porém, houve ganho de inclinação, com o diferencial negativo entre os DIs para janeiro de 2027 e janeiro de 2024 passando de -78 pontos na última sexta-feira para -71 pontos neste dia 1º de julho.

As taxas começaram o dia em queda, chegaram a virar para alta no meio da manhã quando o dólar ganhava mais fôlego mas o movimento não se sustentou, dado que os juros dos Treasuries foram ainda mais para baixo dos 2,90% no caso das T-Notes de 2 e 10 anos. "Se tivermos crescimento global menor, a demanda por commodities deve cair e os BCs não deverão precisar ser tão duros", explica o operador de renda fixa da Mirae Asset Paulo Nepomuceno.

O quadro para as contas públicas segue incômodo, com a PEC dos Benefícios aprovada na quinta-feira pelo Senado elevando o gasto extra teto a R$ 41,25 bilhões após inserção de benesses de última hora. Ao menos, teve a boa notícia de que ajuste no texto limitou o potencial de gastos a ser permitido pela decretação do estado de emergência.

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), disse que intenção é unir a proposta com a PEC dos biocombustíveis, que já tramita na Câmara, e votar sem alterações. "Se a proposta passar na Câmara da forma como foi aprovada no Senado, vai direto para promulgação pelo Congresso", disse Barros.

Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust, disse que as negociações que estão sendo feitas na Câmara para acelerar a aprovação do texto na Casa trazem algum alento. "Caem as chances de "novas manobras fiscais", disse.

Bolsa

O Ibovespa acompanhou a melhora ao longo da tarde em Nova York e oscilou para o positivo nesta primeira sessão de julho, vindo de perdas nas três sessões anteriores. Encerrado o pior junho desde 2002 (agora -11,50%), que foi também a maior perda mensal desde março de 2020 (-29,90%), a entrada com pé direito no segundo semestre foi uma cortesia do desempenho de Petrobras (ON +1,87%, PN +2,15%), em dia negativo para Vale (ON -1,91%), mais uma vez contida por ajuste no preço do minério de ferro. Por outro lado, com condições de oferta mais restritivas, os petróleos Brent e WTI subiram mais de 2% na sessão. O dia foi também positivo para as ações de grandes bancos, à exceção de BB (ON -0,69%).

Assim, a referência da B3 fechou esta sexta-feira em alta de 0,42%, a 98.953,90 pontos, entre mínima de 97.231,18, ainda o menor nível intradia desde 4 de novembro de 2020 (95.987,42), e máxima de 99.339,57 (+0,81%), com abertura a 98.542,10.

O giro financeiro foi de R$ 29,1 bilhões na sessão. Na semana, o Ibovespa acumulou ganho de 0,29%, após quatro perdas semanais consecutivas, duas das quais na casa de 5%. No ano, cede agora 5,60%.

Na ponta do Ibovespa nesta sexta-feira, destaque para IRB (+6,40%), MRV (+6,02%) e BRF (+5,08%). No lado oposto, Magazine Luiza (-5,98%), Americanas ON (-5,21%) e Cogna (-3,74%).

"É um mercado com muita indefinição ainda, o que favorece a volatilidade. Hoje, o Ibovespa subiu contrariando a correlação habitual com o câmbio, muito pressionado na sessão, com o dólar negociado acima de R$ 5,30 (R$ 5,3212, em alta de 1,65% no fechamento). As leituras finais para os PMIs industriais nos Estados Unidos e na Europa vieram mais fracas, em desaceleração, enquanto o da China surpreendeu de forma positiva. O quadro para a atividade americana e na zona do euro é mais fraco, o que reforça a cautela quanto aos aumentos de juros, com relação especialmente ao que o Federal Reserve ainda fará", diz Dennis Esteves, especialista em Renda Variável da Blue3, destacando, no cenário doméstico, a aprovação de PEC com ampliação de transferências sociais, que volta agora à Câmara dos Deputados.

Enquanto, no Brasil, a perspectiva fiscal continua a ser acompanhada com apreensão, sentida de perto no câmbio e na curva de juros, no exterior os temores de desaceleração econômica global, puxada pelo ciclo de alta de juros nos Estados Unidos, vão se transformando em medo de recessão.

O modelo do Federal Reserve de Atlanta que tenta prever o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos apontava, nesta sexta-feira, queda de 2,1% para o segundo trimestre. Na quinta, a previsão para o mesmo período era de 1,0%. Caso o recuo no PIB se comprove entre abril e junho, seguindo a retração anualizada de 1,6% nos primeiros três meses do ano, a economia americana entraria em recessão técnica.

Por outro lado, o Credit Suisse acredita que o crescimento econômico nos Estados Unidos será de 2,1% neste ano e de 1,2% no próximo. Em relatório trimestral, o banco prevê também que a economia global crescerá 2,9% em 2022 e 2,1% no ano seguinte. Para o Credit Suisse, componentes cíclicos do PIB dos EUA devem exibir contração, mas o setor de serviços manterá o crescimento positivo. Recessão no país "é uma clara possibilidade", mas o banco acredita haver colchões para impedir deterioração da perspectiva, "pelo menos ao longo do ano que vem".

Na zona do euro, apesar do desempenho moderadamente positivo das bolsas do velho continente nesta sexta-feira, os dados sobre a inflação no bloco, divulgados pela manhã, vieram fortes. "A inflação na zona do euro voltou a superar estimativas e a bater recordes, acumulando alta de 8,6% em 12 meses. O núcleo, que exclui componentes mais voláteis (de energia e alimentos), também surpreendeu, com avanço de 4,6% em 12 meses, ilustrando uma inflação bem disseminada e, consequentemente, não trazendo qualquer sinal de alívio para o Banco Central Europeu", aponta em nota a Guide Investimentos.


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