Eleições 2024: PL lança estratégia para abafar racha que derruba lideranças no RS

Eleições 2024: PL lança estratégia para abafar racha que derruba lideranças no RS

Após repercussão negativa das mudanças, sigla ajusta rota e vai tentar emplacar outro vice para Sebastião Melo, mas disputas continuam

Flavia Bemfica

Melo e Zucco se reuniram na segunda

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Começou entre lideranças do PL a operação para tentar estancar a crise instalada no partido no RS. Ela foi ocasionada por uma disputa interna que se desdobrou em uma sucessão de fatos na qual o último capítulo é o sacrifício do atual vice-prefeito, Ricardo Gomes. Ele se desfiliou do partido. Após a derrubada da executiva em Porto Alegre, a nomeação do deputado federal Luciano Zucco como presidente da sigla na Capital, a desfiliação de Gomes, as incertezas sobre se o PL vai seguir na aliança encabeçada pelo prefeito Sebastião Melo (MDB) para disputar a reeleição, e a desistência do vice de concorrer, há uma narrativa em curso daqui para a frente. A de que Gomes pretendia mesmo deixar a vida pública, e que toda a confusão da semana passada foi um “ruído de comunicação.”

Após um final de semana de muita tensão (a substituição da executiva aconteceu na sexta), na manhã de segunda-feira ocorreu a primeira sinalização pública de que o grupo que assumiu a legenda em Porto Alegre pode rever sua estratégia inicial de abandonar Melo e lançar candidatura própria. Zucco fez uma visita ao prefeito para tratar do processo eleitoral. Melo prontamente registrou o encontro em suas redes sociais. Zucco, que na sexta-feira, de público, não negava a possibilidade de o partido ter candidatura própria na Capital, amenizou o discurso. “Não estamos tratando de candidatura própria. O importante é a direita ficar unida”, resumiu, na noite de segunda-feira, antes de retornar a Brasília.

O novo presidente passou a segunda entre reuniões e entrevistas nas quais o tom foi o de que o partido está em harmonia. “Estou em contato com o André Flores, que é o antigo presidente, ele me ajudou no processo. Está tudo tranquilo, tudo ótimo. Estamos todos alinhados, eu, o Rodrigo (Lorenzoni), o Ricardo (Gomes), todo mundo alinhado.”

Zucco repete que não será candidato nas eleições municipais deste ano. E diz que as prioridades agora em Porto Alegre são fortalecer a nominata para a Câmara de Vereadores, procurar nomes que possam compor na condição de vice, no caso de a parceria com Melo ser mantida, e, ao mesmo tempo, avaliar os cenários local e nacional para tomar um posicionamento. “Estamos estudando todas as possibilidades, e temos um grande respeito pelo prefeito e pelo Ricardo, que é um quadro que gostaríamos que permanecesse e continuasse a ser nosso vice-prefeito, que disputasse a reeleição junto com o Melo. Mas tanto o prefeito Melo, interlocutores do Ricardo, nós já sabíamos que ele tinha a intenção de retornar para a iniciativa privada. É mais do que natural que, com a saída dele, a gente tenha que reorganizar o partido.”

A mudança de rota aconteceu após as ações da sexta-feira terem repercutido mal entre correligionários e aliados. Também depois de o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL/SP), em visita a Porto Alegre para um evento no final de semana, ir embora dizendo que iria trabalhar para tentar que o partido se reaproximasse de Melo. E de o MDB fazer chegar ao PL informações sobre outras opções em avaliação na mesa do prefeito. As sondagens incluem o PP, que também fechou com Melo ainda em dezembro, e onde lideranças da sigla com poder de decisão na Capital avaliaram que o “cavalo de pau” do PL gerou “insegurança.” E o Cidadania da deputada federal Any Ortiz, aliada antiga do prefeito. O Cidadania está federado com o PSDB.

Nos bastidores do PL, a temperatura ainda não baixou, e há incerteza sobre o futuro. “O que gerou a situação atual, absolutamente desnecessária, foi a forma como tudo foi feito. Ninguém foi consultado aqui no RS ou em Porto Alegre. E o que se depreende dessa decisão? Que vai haver uma mudança de rumo. Porque, se não fosse assim, não precisava mudar. Se fosse para apenas trocar a cabeça para dar protagonismo ao Zucco, e ele tem total legitimidade, então era só chamar todo mundo e conversar”, resume o líder da bancada da legenda na Assembleia Legislativa, deputado Rodrigo Lorenzoni.

Para além da Capital, são aguardados outros desdobramentos, mas a orientação é a de que ocorram com discrição, para evitar novos desgastes. Além de Porto Alegre, estão sendo destituídas, por decisão do comando nacional, as comissões provisórias da sigla em outras nove cidades do RS, entre elas alguns dos maiores colégios, como Canoas e Santa Maria. Em meio a todo o embate, o presidente estadual, deputado federal Giovani Cherini, até agora vem optando pelo silêncio. Sua situação, contudo, admitem aliados e opositores, é delicada.

“O grupo que estava no comando do partido em Porto Alegre era todo do antigo DEM. Eu sou bem objetivo. Faltava distribuição e reconhecimento. Agora tem que mesclar. Várias cidades vão mudar. A direção estadual, em 2025 vamos mudar também. O Cherini já deu sua contribuição. Tem uma questão de lógica aí, já que ele começou o ano de presidente, termina. Mas, se for necessário, trocamos ele neste ano mesmo”, garante o deputado federal Bibo Nunes.

A CRONOLOGIA DA CRISE

Assim como em outros estados, o PL no RS é composto por vários políticos que antes integravam ou as fileiras do DEM ou as do PSL. E que, com a fusão das duas siglas em 2022 que resultou na criação do União Brasil, preferiram outro caminho, o mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro (ele se filiou ao PL em 2021). O partido tem ainda políticos que já o integravam quando ainda se chamava PR (a mudança de nome foi aprovada em 2019). É o caso, por exemplo, do presidente estadual, o deputado federal Giovani Cherini. Expulso do PDT em 2016, ainda naquele ano ele ingressou no PR e assumiu a presidência do diretório gaúcho.

Entre os ex-integrantes do DEM com protagonismo dentro do PL gaúcho, hoje, estão o ex-ministro Onyx Lorenzoni e o deputado estadual Rodrigo Lorenzoni. Até a sexta-feira, também o vice-prefeito da Capital, Ricardo Melo. Do antigo PSL vieram os deputados federais Luciano Zucco, Bibo Nunes e Ubiratan Sanderson.

Partidários oriundos do PSL já davam sinais de insatisfação com o que denominavam ‘domínio’ do DEM no ano passado. No centro das divergências entre os dois grupos, a ocupação de espaços e os preparativos para o pleito de 2026. No final do ano, ganharam corpo também posições opostas sobre a disputa para a prefeitura da Capital. Para acalmar os ânimos e tentar encerrar o assunto, a então direção municipal, vinculada ao grupo dos Lorenzoni e de Gomes, respaldada pela estadual, firmou, em 4 de dezembro, em um evento no CTG 35, um compromisso público de apoiar a reeleição do prefeito e reeditar a chapa Melo/Gomes.

Poucos dias depois, em 12 de dezembro, Zucco, que então estava no Republicanos, voltou ao PL. Eleito pelo PSL em 2018, ele havia migrado para o PL em 2022, assim como outros integrantes da legenda. Mas, menos de um mês depois, e após divergências com o deputado Bibo Nunes, agora um entusiasta de sua ascensão ao comando da legenda, saiu e foi para o Republicanos.

Imediatamente após a nova filiação, o deputado federal passou a ser citado de forma recorrente como cotado para disputar o governo do RS em 2026. De lá para cá, seus partidários só viram crescer as articulações para que ele começasse a se preparar para a disputa, na mesma medida em que ganhou força a divulgação de sua proximidade crescente com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Antes, o líder tido como mais próximo de Bolsonaro era Onyx Lorenzoni.

As movimentações aumentaram entre apoiadores do deputado e ex-integrantes do PSL o entendimento de que, para fortalecer o nome de Zucco para 2026, o melhor seria ele ter alguma experiência anterior no poder Executivo ou, pelo menos, aproveitar a superexposição garantida por uma corrida eleitoral em uma capital. Internamente, os ânimos se acirraram. Apoiadores de Zucco e Bibo, já insatisfeitos, passaram a reivindicar mais espaço em postos de decisão partidários tanto em Porto Alegre como em outras cidades.

Na outra ponta, partidários ligados aos Lorenzoni e a Gomes reconheciam a força de Zucco, mas apontavam que a construção da candidatura ao governo em 2026 seria prematura neste momento, e defendiam que não seria necessário concorrer à prefeitura para alavancar a disputa daqui a dois anos. Seu argumento era o de que o partido tiraria votos de Melo e não teria base suficiente para ganhar a eleição, o que o enfraqueceria ao invés de fortalecer. De quebra, a separação poderia beneficiar a candidatura petista, da deputada Maria do Rosário.

Na semana passada, os fatos se precipitaram. Avisados de que a direção nacional iria destituir o comando partidário na Capital e nomear Zucco, Rodrigo Lorenzoni e Ricardo Gomes foram a Brasília. Junto com Cherini, se reuniram com o presidente nacional da sigla, Valdemar Costa Neto, na quarta.

Eles lembraram a Costa Neto o acordo com Melo. O dirigente orientou que conversassem com Zucco. A partir daí, a história tem duas versões. Em uma, Gomes reafirmou a Costa Neto, e depois a Zucco, sua disposição de continuar ao lado de Melo, desde que não ocorressem “fraturas” que o deixassem exposto. Deixou claro que sua posição era pela continuidade da aliança com o MDB, ou seja, que se o PL optasse por ter candidatura própria, sairia do partido. E, por consequência, não disputaria a reeleição. Também teria concordado em que Zucco assumisse o comando partidário, mas salientou que isso deveria ser feito a partir de uma composição. Todas os posicionamentos estão explicados na nota pública divulgada pelo vice-prefeito ainda na sexta-feira.

No final de semana, contudo, passou a ser divulgada uma outra versão das conversas e dos acontecimentos que teriam resultado na mudança do comando partidário na Capital. Ela atribui a Gomes a responsabilidade pelos ajustes e foi detalhada em uma nota oficial divulgada por Costa Neto. No documento, o dirigente informa que o vice-prefeito vinha sinalizando a interlocutores que deixaria a vida pública ao final do atual mandato. O texto também reforça que a estratégia do PL é contar com candidaturas próprias nas principais cidades, incluindo Porto Alegre na estratégia. Esta última parte, porém, começou a ser revisada na segunda.

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