Empresários querem agir em bloco contra decretos do governo do RS
Grupo pretende apresentar ao Piratini outras ações para compensar a economia ao invés de cortes de incentivos fiscais
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Durante quase duas horas, representantes de 13 entidades empresariais debateram, nesta quarta-feira, os próximos passos a serem tomados para barrar os decretos do governo do Estado que devem, a partir de 1 de abril, sustar benefícios fiscais de 64 setores. A tônica foi de completo descontentamento com o governo e a necessidade de mobilização, principalmente através da opinião pública, em bloco. Os decretos foram apresentados pelo governador Eduardo Leite (PSDB) após a fracassada tentativa de elevar a alíquota do ICMS de 17% para 19,5%, no final do ano passado.
Reunindo representantes dos mais diversos setores, do transporte ao varejo, a ideia é conversar com governo em conjunto, visando, se não derrubar todos os decretos por completo, ao menos aqueles que mais devem impactar no consumidor final, a exemplo dos itens da cesta básica. Medidas como a judicialização e a suspensão do pagamento de ICMS são consideradas, mas as atitudes de fato só devem ser decididas e tomadas a partir do dia 21 de fevereiro, quando deverá haver uma nova reunião e quando deve ser batido o martelo sobre o plano de ação. Até lá, o intuito é seguir conscientizando a população sobre o impacto direto que os decretos devem ter no bolso. Nenhum representante do governo compareceu.
Ao longo da reunião, sugestões de atuação – em resposta ao Executivo – e alternativas foram elencadas. O presidente da Federasul, Rodrigo Costa, entidade que encabeçou o encontro, foi enfático ao citar a necessidade de responder ao governo em conjunto. "É natural e saudável que os setores se sentem individualmente e negociem com o governo. Nós não temos nada contra isso, mas é importante que o governo enxergue atrás de cada setor um bloco forte. Porque, se o governo enxergar esse bloco, enxergar que o setor não está sozinho, a forma de negociação não será mais por ameaça, terá que ser de uma forma construtiva", argumentou.
Outras entidades também pontuaram a necessidade de oferecer opções ao Executivo, ante o discurso de que é preciso aumentar a arrecadação. Entre elas, o aprimoramento do programa de "cashback" já existente e a intensificação de uma comunicação mais próxima da sociedade. "Estamos dispostos a negociar. A questão dos hortifruti não dá pra abrir mão. Isso é absurdo. Agora, a gente abre mão das flores", exemplificou Antônio Longo, presidente da Agas, que representa o setor de supermercados. A proposta de taxação das apostas eletrônicas, projeto do deputado Marcus Vinicius (PP), também foi citada.
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Apesar disso, em grande parte dos discursos, as críticas aos decretos e o discurso do governador para justificar a retirada dos incentivos se sobressaíram. Mais de uma vez, foi relembrado o fato de que Leite prometeu, em campanha, não aumentar impostos. Mas, na prática, o corte de incentivos fiscais terá o mesmo resultado que a tentativa fracassada de elevar a alíquota modal do ICMS.
"O que me chamou atenção é a falta de memória de cálculo do Estado para demonstrar que os decretos adotados agora são equivalentes àquela proposta de aumento do ICMS. Olha, eu não sou economista, mas sou formado em administração com especialização em finanças e, para mim, essa conta não fecha", afirmou Gilberto Rodrigues, diretor executivo da Fetransul, ao elencar dúvidas quanto à transparência das contas públicas apresentadas pelo governo.
A mesma crítica foi apontada pelo presidente da Fecomércio, Luis Carlos Bohn, que ressaltou, ainda, um temor por parte do empresariado: o aumento da folha. "O Estado está equilibrado, mas o que temos que cuidar é: nada contra o funcionário público, nada contra o pessoal que trabalha no setor público porque são pessoas que, sim, têm que ter o seu reconhecimento. Mas, aumento novamente da folha, não dá. Nós temos que cuidar isso".
Marcos Oderich, vice-presidente da Fiergs, entidade que, segundo os presentes, será a mais "assediada pelo governo", também se manifestou nesse sentido. "Nós só somos chamados para conversar com o governo para aumentar alguma coisa. Quando nós vamos conversar sobre o mínimo regional ou qualquer outra demanda, nós somos bem recebidos como os ouvidos, mas não conseguimos nunca neutralizar esses aumentos. O estado do Rio Grande do Sul está na vanguarda". E complementou: "nós temos que fazer com que o governo entenda que a indústria gaúcha, se não houver uma mudança radical no mundo do tratamento que nós recebemos, ela será realmente inviabilizada".
A proposta do governo de aumentar os valores repassados no programa "Devolve ICMS", que beneficia pessoas de baixa renda foi questionada. A atitude dada é uma alternativa proposta pelo Executivo em função do futuro aumento da cesta básica. "Ótimo. Mas quantas pessoas vão receber? No máximo 400 mil. Então, de uma população de 11 milhões, 400 mil pessoas vão receber. É justo?", indagou Fábio Rodrigues, diretor da Farsul. A transparência adotada pelo governo quanto às contas públicas também foi pauta. "O governo está agora, em todas as redes sociais, na imprensa, na imprensa nacional inclusive, dizendo do superávit do Estado. E aí, neste momento, diz do superávit, se 'gaba', mas, por outro lado, vem com essa narrativa de que vamos perder arrecadação", afirmou Simone Leite, ex-presidente da Federasul, relembrando ainda que as estimativas apresentadas pelas entidades indicam, para este ano, um aumento no PIB gaúcho.
Cairolli questiona tamanho do Estado
Apesar das falas, em sua maioria, caminharem no mesmo sentido, a manifestação do ex-governador e ex-presidente da Fecomércio, José Paulo Cairoli destoou das demais. Para Cairoli, é 'evidente' que não haverá um aumento na cesta básica – como temido e apontado por muitos – e a medida é, na verdade, uma 'narrativa' vendida por Leite cujo objetivo final é alimentar um 'projeto de poder'. "O que ganha na política é narrativa. O Lula faz uma narrativa e o Eduardo Leite faz narrativa. E não adianta nós fazermos a nossa porque não temos o poder que a caneta tem", disse. Ele criticou, ainda, o "tamanho do Estado" e ausência de movimentos que visem diminuir as despesas da folha. Em especial sobre os altos salários. "O estado do Rio Grande do Sul não tinha dinheiro pra pagar o salário dos funcionários do Executivo, mas todos os funcionários da Secretaria da Fazenda, aposentado ou não, ganhavam por produtividade e eu não vejo nenhum movimento quanto a esses servidores. [...] Agora eu pergunto o que que nós fizemos no país, nessa pandemia, para reduzir o tamanho de Estado? Houve algum movimento da CNI, CNA, CNC? Vocês sabem quantos funcionários tem no Senado? Sabem quantos funcionários tem no Supremo? O Estado não é só o Executivo. O Estado é o todo. E só quem arrecada é o Executivo. Quanto está ganhando os desembargadores do nosso Estado? Então, aumentou a folha (de pagamentos) sim senhor".