Verão

Projeto Terra: iniciativa do TJRS busca transformar a vida de famílias sem moradia regular no RS

Metade dos imóveis do Estado não possui matrícula ou apresenta irregularidades; Judiciário aposta na união com municípios para garantir dignidade e resiliência ambiental em meio a urgência por moradia segura intensificada pela crise climática

Juiz-corregedor Felipe Lumertz apresentou iniciativa do TJRS
Juiz-corregedor Felipe Lumertz apresentou iniciativa do TJRS Foto : Pedro Piegas / CP Memória

A falta de moradia regular é uma das maiores feridas sociais do Rio Grande do Sul. Segundo levantamento do Tribunal de Justiça gaúcho (TJRS), cerca de 50% dos imóveis do Estado não possuem matrícula ou apresentam divergência entre quem mora e quem aparece no registro oficial. Isso significa que milhares de famílias vivem sob a incerteza de não serem, de fato, donas de onde constroem sua vida.

Essa insegurança ganha contornos ainda mais dramáticos diante das catástrofes climáticas — em 2023 e especialmente em 2024, o RS enfrentou enchentes históricas que afetaram mais de 60% do território estadual, causando prejuízos bilionários e deixando mais de 100 mil casas danificadas ou destruídas. E a resiliência nascida das tragédias demandou e seguirá demandando por longo período a reconstrução e até mesmo transferências de comunidades inteiras para novas áreas em centenas de municípios, fazendo da moradia segura e oficializada muito mais que uma questão jurídica: uma resposta humanitária e ambiental.

Para enfrentar tais desafios, em outubro de 2024, o TJRS lançou o “Projeto Terra: Você é dono do seu imóvel?”. A proposta é mobilizar os municípios gaúchos para, em parceria com o Judiciário, acelerar processos de regularização fundiária e assegurar o direito fundamental à moradia.

Os primeiros resultados foram apresentados a prefeitos durante a Assembleia de Verão da Famurs, em Xangri-Lá, nesta quinta-feira, 19. O TJRS aposta que, com uma adesão maciça das prefeituras, o projeto possa romper o que considera um ciclo de exclusão que afeta milhares de gaúchos.

O juiz-corregedor Felipe Lumertz destacou a importância da união de esforços para dar segurança jurídica às famílias:

"Juntos nós podemos colaborar para que as pessoas sejam efetivamente donas do seu imóvel, regularizando essa situação jurídica, que corresponda à situação fática e com isso, promovendo maior segurança jurídica no trato dos imóveis do estado do Rio Grande do Sul.”

“Imóvel regularizado é sinônimo de imóvel valorizado e, com isso, se começa um ciclo de riqueza no município”, completou.

Já a juíza e coordenadora do projeto, Laura Ullmann López, reforçou o protagonismo dos gestores locais nessa transformação:

“Os municípios têm papel fundamental nessa missão, e os prefeitos podem contar com o Judiciário para apoiá-los na tarefa da regularização fundiária.”

O painel contou também com a presença do 1º vice-presidente do TJRS, desembargador Ícaro Carvalho de Bem Osório, além dos coordenadores de correição Daniélle Dornelles e Sander Cassepp Fonseca, e dos registradores João Pedro Lamana Paiva e Juliana Follmer Bartolin Lisboa.

Como funciona

De acordo com o TJRS, a iniciativa é uma extensão prática do Programa Permanente de Regularização Fundiária Plena de Núcleos Urbanos Informais e Favelas – “Solo Seguro – Favela”, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O objetivo é transformar áreas irregulares em espaços legalizados, garantindo documentação oficial para famílias que vivem em loteamentos informais, vilas e favelas.

Uma cartilha elaborada pelo TJRS explica o passo a passo para que os municípios possam aderir, orientando sobre medidas jurídicas e administrativas que simplificam o processo de titulação.

Aprovação institucional

O lançamento oficial ocorreu em 14 de outubro de 2024, com assinatura do termo de cooperação em 12 de dezembro, no Tribunal de Justiça, com presença de autoridades do Judiciário, Anoreg/RS e diversos prefeitos, como Balneário Pinhal, Cachoeira do Sul, Capão da Canoa, Tramandaí, Santa Cruz do Sul, entre outros

Números

Desde sua criação, em outubro de 2024, o Projeto Terra já reúne números expressivos:

  • Em Tramandaí, onde a iniciativa foi testada, 1.053 lotes urbanos foram regularizados, beneficiando cerca de 3 mil moradores.
  • Em Capão da Canoa, a ação deve alcançar 4.220 lotes nos balneários Posto 5 e Posto 6, no distrito de Capão Novo.
  • Em Cachoeira do Sul, o Judiciário e a prefeitura planejam a regularização de cerca de 2 mil lotes. A Secretaria Estadual de Habitação detalha que a primeira etapa vai atingir 1.058 lotes em nove núcleos urbanos e a segunda outros 1.120 lotes no Bairro Marina.
  • Até dezembro de 2024, 18 municípios gaúchos já haviam firmado termo de cooperação com o TJRS e a Associação dos Notários e Registradores (Anoreg/RS) para implementar o programa.

Esses números dão dimensão do impacto social esperado: milhares de famílias com a segurança de ter um endereço formal, um título registrado e o direito real à moradia.

Por que tudo isso importa?

A regularização fundiária consolida mais do que papéis em cartório. Ela representa dignidade, segurança e esperança para famílias que há gerações aguardam o reconhecimento legítimo de sua moradia. Em uma era marcada por mudanças climáticas severas, garantir que essas moradias estejam legalmente regularizadas e, quando possível, longe de áreas de risco, é essencial para proteger vidas, integrar bairros à infraestrutura urbana, e fortalecer a resiliência dos municípios gaúchos.

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