Cara leitora,
Ando reflexiva sobre o cansaço. Sobre o autocuidado emocional. Talvez seja pelo fato de o final do ano estar batendo à porta, um daqueles anos que quando piscamos passou, nos atropelou. Outro dia, presa no trânsito, ouvi a música de Ana Carolina que dizia: “Ninguém é de ferro, ninguém é de aço, e se o corpo pede pausa, o coração pede espaço.”
Fiquei pensando no tipo de cansaço que não vem do corpo, mas do excesso de entrega.
Aquele cansaço de quem passou a vida “fazendo o tudo”, “sendo forte”, e um dia percebe que o preço da paz dos outros foi a própria exaustão emocional.
Sabe aquele perfil de pessoas que aprenderam a ser amadas por não dar trabalho, que confundem amor com doação e que acreditam que só merecem descanso quando tudo está resolvido? Uma coisa é fato, o “acordar”: quando vem a exaustão, a tristeza sem causa aparente, o vazio que nem férias preenche. Talvez essa crônica seja sobre isso, um grito silencioso das pessoas que cuidam de todo mundo, mas nunca são cuidadas, e que precisam redescobrir o próprio cuidado emocional.
Pessoas que aprenderam desde cedo que ser amadas estava condicionado a não dar trabalho. Elas internalizaram que o afeto vinha quando eram boas, prestativas, maduras, responsáveis, caladas e controladas, em vez de quando eram simplesmente elas mesmas. Então, cresceram acreditando que o amor é algo que se conquista pelo comportamento, não algo que se recebe por merecimento natural.
Esse tema é um dos mais ricos da psicologia contemporânea, especialmente quando se fala sobre “crianças boas demais” (good child syndrome). Quando crianças, elas aprendem, inconscientemente, que se fizerem tudo certo, talvez o outro fique bem e, por tabela, o ambiente se torne seguro.
Na vida adulta se tornam as pessoas que resolvem tudo, que cuidam de todos, que raramente pedem ajuda e que se culpam por sentir cansaço ou tristeza. São empáticos, generosos, mas vivem em alerta. Sentem culpa ao dizer “não”, têm dificuldade de descansar sem sentir que estão devendo algo a alguém, e sofrem por se sentirem invisíveis quando o cuidado que dão não volta.
A psicologia chama isso de “adaptação excessiva”, quando o sujeito se molda tanto às necessidades alheias que perde contato com as próprias. E o processo de se libertar disso é, muitas vezes, dolorido. Porque exige revisitar feridas antigas, reconhecer o quanto do que chamamos de amor era, na verdade, medo de perder afeto.
É um processo que mistura mágoa e libertação, raiva e alívio. Aprender a cuidar de si, depois de uma vida cuidando dos outros, dói, mas é o tipo de dor que cura. É o início de um autocuidado emocional profundo e verdadeiro.
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O antídoto, claro, não é virar alguém frio, mas reaprender o amor-próprio real, aquele que inclui vulnerabilidade, descanso, erro, limites e o direito de ser cuidado. Não se trata de endurecer, mas de reconhecer o próprio limite e a própria carência, de se permitir precisar também. É o contraponto perfeito ao discurso da autossuficiência tóxica que romantiza “dar conta de tudo”.
Você dá conta de tudo? Lembre-se que autocuidado emocional não é egoísmo, é sobrevivência, um ato de coragem.
Elisa Fernandez é mãe, empresária e acumula experiências como executiva em entidades empresariais e nas áreas de comunicação, gestão, marketing e publicidade.