Dermorexia: busca pela pele perfeita pode se tornar uma obsessão
Distúrbio psicológico que leva à obsessão por cuidados com a pele pode impactar a saúde mental e física

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Você já parou para pensar até que ponto o cuidado com a pele pode deixar de ser saudável e passa a se transformar em um problema? A dermorexia, um distúrbio psicológico ainda pouco conhecido, tem chamado a atenção de especialistas.
Trata-se de uma preocupação excessiva com imperfeições da pele, como acne, manchas ou poros dilatados, que leva à adoção de rotinas obsessivas de skincare e ao uso indiscriminado de produtos. Embora o autocuidado seja importante, o excesso pode trazer consequências negativas para a saúde mental e física.
O dermatologista Bones Jr. explica que a dermorexia vai além de um simples desejo por uma pele bonita. “No consultório, identifico sinais como o uso exagerado de produtos e a busca incessante pela ‘pele perfeita’, que muitas vezes resulta em insatisfação crônica”, afirma.
Ele compara o distúrbio à dismorfia corporal, transtorno em que a atenção excessiva a supostas imperfeições pode distorcer a percepção da própria aparência. Muitas vezes, essas “falhas” nem são notadas por outras pessoas, mas geram uma insatisfação pessoal constante.
“O desafio é que esses comportamentos nem sempre são claros para os pacientes, mas podem causar danos à autoestima”, alerta.
📲 Influência das redes
O problema tem sido amplificado pelas redes sociais, especialmente em plataformas como Instagram e TikTok, onde influenciadores promovem padrões de beleza irreais.
“A pele dessas influenciadoras já é bonita e é por isso que elas são contratadas para fazer publicidades. Mas precisamos desenvolver um senso crítico sobre o que vemos nesse mercado da beleza”, ressalta o médico.
Adolescentes e até crianças estão cada vez mais expostos a essas tendências, antecipando o uso de cremes antienvelhecimento e recorrendo a tratamentos inadequados para sua faixa etária.
A popularização de rotinas intensivas de cuidados com a pele, como as inspiradas no K-beauty (beleza coreana), também contribui para essa obsessão. No Brasil, um país marcado pela diversidade étnica e cultural, esses padrões podem ser especialmente prejudiciais.
“Nossa pele não segue necessariamente os padrões apresentados por modelos coreanas. Em muitas situações, a adolescência é marcada por espinhas e manchas, algo completamente normal”, explica o dermatologista.
No entanto, a pressão para alcançar uma pele impecável pode gerar sentimentos de inadequação e culpa em quem não consegue ou não deseja seguir essas tendências.
A busca pela perfeição cria um ciclo vicioso: quanto mais produtos são usados sem orientação adequada, maior é o risco de irritações e outros problemas dermatológicos, como acne induzida por cosméticos. Como consequência, a frustração aumenta, reforçando a insatisfação com a própria aparência.
“Muitos pacientes chegam ao consultório relatando experiências negativas com produtos que prometeram milagres, mas acabaram agravando suas condições.”
A pandemia de Covid-19 também compõe esse cenário. O aumento do tempo gasto em frente às telas trouxe mais visibilidade às inseguranças relacionadas à aparência.
“O ambiente virtual gerou um foco exagerado na pele e na estética. O consumo desenfreado de conteúdos sobre skincare intensificou essa pressão”, observa o especialista.
Outro ponto é o impacto psicológico desse comportamento obsessivo. Muitos jovens dedicam horas às rotinas de cuidados com a pele, deixando de lado atividades saudáveis e momentos importantes de socialização.
Além disso, há uma questão econômica envolvida: o mercado da beleza movimenta bilhões anualmente e se aproveita da insegurança das pessoas para vender soluções rápidas e muitas vezes ineficazes.
Influenciadores lançam suas próprias marcas ou promovem produtos sem embasamento científico adequado, contribuindo para a disseminação de falsas crenças sobre skincare. “Um dos maiores mitos é acreditar que mais produtos significam melhores resultados ou que itens caros são sempre os melhores”, diz o médico Bones.
🤝 Construindo uma relação saudável com a própria pele
Para o especialista, o caminho para lidar com essa questão está na educação e na conscientização: “Nós, dermatologistas, temos a responsabilidade de promover uma relação mais saudável com a beleza”.
Ele reforça a importância de orientar os pacientes sobre cuidados adequados à realidade individual de cada tipo de pele e combater os padrões inalcançáveis impostos pela sociedade.
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A aceitação da própria aparência também deve ser incentivada desde cedo. É fundamental ensinar crianças e adolescentes que ter espinhas ou manchas faz parte do processo natural do corpo humano e não deve ser motivo para vergonha ou insegurança.
Cabe também aos consumidores desenvolver um senso crítico em relação ao conteúdo consumido online e às promessas feitas pelo mercado da beleza. A busca pela saúde da pele deve estar alinhada ao bem-estar emocional e não ser guiada por pressões externas ou ideais irreais.
A dermorexia relembra que até mesmo práticas consideradas positivas podem se tornar prejudiciais quando levadas ao extremo. Cuidar da pele é importante, mas aceitar as imperfeições também faz parte do processo de construir uma autoestima saudável em um mundo repleto de filtros digitais e padrões irreais.