Entenda o que falhou no sistema de contenção do Guaíba em Porto Alegre

Entenda o que falhou no sistema de contenção do Guaíba em Porto Alegre

Além do muro da Mauá, diques e casas de bomba ajudam a conter as águas do Lago; mas falhas permitem vasão gradual

Flávia Simões

Falhas no sistema permitiram que as ruas do Centro Histórico fossem tomadas

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Construído ao longo dos anos 70, após uma enchente que tomou as ruas de Porto Alegre e devastou o Centro Histórico em 1941, o sistema de contenção das águas do Guaíba sofre, pela primeira vez desde a sua construção, o primeiro grande revés. Além do famoso muro da Mauá, que conta com 3 metros de altura e 2,6 km de extensão; esse sistema de proteção também é composto por por diques que margeiam a FreeWay até a av. Castelo Branco e seguem, depois, pela av. Beira Rio.

Para complementar esse sistema, Porto Alegre conta também com mais de 20 'casas de bomba' espalhadas pela cidade. Elas servem para drenar grandes volumes de água, em tempestades, por exemplo, nas áreas mais baixas e planas da cidade, como a Cidade Baixa e a região do aeroporto. Mas também atuam quando o nível do Guaíba está muito alto, o que temos visto agora, trabalhando para drenar a água nas áreas por onde o Lago avança.

Apesar disso, as águas do Guaíba invadiram, gradativamente, as ruas do Centro Histórico e da região do 4º Distrito. Ao longo do dia, os níveis foram escalonando e no início da tarde a entrada e saída de um dos bairros mais importantes da Capital já estava bloqueada pela água.

Previsto para conter uma cota de inundação de até 3 metros, o sistema de proteção deveria impedir que Porto Alegre fosse inundada pelas águas, mas encontra uma série de falhas – que permitem o avanço do lago, ainda que lentamente. A culpa, portanto, recai sobre a vazão das comportas e falhas nas estruturas das casas de bomba.

Elaboradas para permitir o acesso a região portuária, as comportas são estruturas de metal móveis, atualmente com defeitos que estão permitindo a vazão, ainda que de gradual, da água. Além disso, as casas de bomba também estão com problemas.

A causa, resume Fernando Dornelles, professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, é uma falta de manutenção e preocupação por parte do Poder Público. "A gente tá jogando tudo fora. Todo tempo que a gente teve que conviver com esse sistema de proteção e agora ele está sendo desqualificado no momento em que não teve essa manutenção. Uma manutenção que é mínima. Fazer uma comporta ser hermética; ter uma patente de borracha; ter parafusos resistentes numa estrutura de concreto a fim de parafusar que aquilo de uma forma que a água não passasse. A engenharia tem essa soluções", afirmou.

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A preocupação, agora, é que as falhas seguem – sem maneira imediata para consertá-las – enquanto o nível do Guaíba sobe. Soma-se a isso o fato de, após chegar no seu pico máximo, o lago tende a permanecer cheio por um tempo, sem previsão de recuo próximo ou imediato.

Muro móvel é uma alternativa viável?

Em meio a discussão da eficácia do muro do Mauá, bem como de todo o sistema de contenção do Guaíba, propostas alternativas vinham sendo discutidas. Uma delas é um suporte móvel, que atingiria de 1,25m com possibilidade de elevação, caso necessário, para até 6m.

O professor, no entanto, não enxerga a ideia com bons olhos. Isso porque além de necessitar de um grande número de pessoal capacitado envolvido, a estrutura atual – e menos complexa – já não detém a atenção necessária.

"O IDH realizou um laudo ano passado e a gente não pode dizer que o sistema móvel não funcionava. Ele funciona. Mas ele tem uma grande vulnerabilidade. É um sistema de encaixar. Tem que ter um número de pessoas suficientemente capacitadas. Não se pode aprender a montar aquele tipo de estrutura na hora, tem que ter um treinamento anual. Além disso, quanto tempo eles conseguiriam levar para montar toda essa estrutura? Imagina a chance de alguma dessas partes, se não for bem montada, de falhar? Nesse caso, entra água direto e a gente tem uma inundação brusca, é o pior dos desastres. Nas circunstâncias de gestão que a gente tem, se a gente está falhando na manutenção das comportas (atuais), o que seria de um sistema muito mais complexo?", questionou o pesquisador.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895